— Eu sei que vai. Mas lembra: não precisa ficar bem sozinha, tá?

Lissie deu um leve sorriso, sincero dessa vez.

— Eu sei.

As horas seguintes passaram rápido. O turno estava cheio, e o movimento na emergência não dava trégua. Um menino com asma, um senhor com taquicardia, uma jovem vítima de acidente de bicicleta. A rotina exigia dela concentração — e isso era bom.

Cada diagnóstico, cada conversa, cada passo pelos corredores ajudava a ocupar a mente. Ainda assim, entre um atendimento e outro, flashes voltavam: o rosto do irmão, o olhar vazio no túmulo, a mão de Jay segurando a dela.

Foi nesse estado entre distração e foco que ela ouviu uma voz familiar atrás de si:

— Eu devia ter apostado com a Maggie que você ia aparecer hoje.

Lissie se virou e deu de cara com Will Halstead, o sorriso de sempre, o jaleco meio desalinhado e duas canecas de café nas mãos.

— Bom dia pra você também. — disse ela, arqueando uma sobrancelha.

— Trouxe reforço. — Will ergueu uma das canecas. — Eu ouvi que você teve uma noite difícil.

Lissie piscou, surpresa.
— Deixa eu adivinhar... Maggie?

— Maggie, sim. — Ele riu. — Mas também um certo detetive que parece se preocupar mais do que devia.

Ela parou.

— Halstead. — disse em tom de aviso, mas o canto da boca traía um leve sorriso.

Will entregou a caneca pra ela, tentando disfarçar a curiosidade.

— Ele me mandou trazer isso. Disse que se eu não conseguisse, teria que lidar com ele.

Lissie arqueou uma sobrancelha.

— Ele te mandou?

— Mais ou menos. — Will deu de ombros. — Me mandou uma mensagem hoje cedo. Disse pra eu "garantir que você tomasse café e lembrasse que não está sozinha".

A caneca quase escapou das mãos dela.

— Ele... disse isso?

Will assentiu, simples.

— Disse. E, por sinal, ele tem razão.

Lissie ficou em silêncio, olhando pro café. A mensagem vibrava no bolso do jaleco, e por um segundo ela pensou em não olhar. Mas a curiosidade venceu. Pegou o celular e desbloqueou a tela.

Jay Halstead:
"Eu deixei você dormindo ontem. Parecia finalmente em paz, então não quis acordar.
Pedi pro Will te levar café hoje (espero que ele tenha acertado).
Só queria lembrar que você não tá sozinha, mesmo quando tenta ficar.
Cuida de você, Lissie."

Ela leu a mensagem duas vezes, os olhos marejando de leve. Will percebeu, mas fingiu não ver.

— Ele é bom em dizer as coisas certas. — murmurou ela, meio sem querer.

Will deu um sorriso.

— É o que dizem. — fez uma pausa curta. — E você devia ouvir.

Ela respirou fundo, guardando o celular. — Eu ouço... às vezes.

— Às vezes é um bom começo. — Will respondeu, antes de ser chamado por uma enfermeira. — E, Lissie... ele se importa de verdade. Dá pra ver.

Ela apenas assentiu, sem saber o que dizer.

Mais tarde, já no meio da tarde, Lissie estava organizando alguns prontuários na sala de descanso quando Natalie Manning entrou, equilibrando uma pilha de papéis.

— Hey. — disse Natalie, sorrindo. — Não sabia que você tava de volta hoje.

— Eu precisava. — Lissie respondeu, tentando manter o foco nas fichas.

— Foi o que o Will disse. — Natalie apoiou os papéis e se encostou na bancada. — Ele também comentou que você teve um dia difícil ontem.

Lissie revirou os olhos de leve.

— Vocês dois precisam conversar menos sobre mim.

— Impossível. — respondeu Natalie, rindo. — Você anda chamando atenção ultimamente.

— Ah, ótimo. Exatamente o que eu queria. — ironizou a loira.

— Relaxa, ninguém tá comentando nada ruim. — Natalie sorriu, depois suavizou o tom. — Mas falando sério... se quiser conversar, ou sair pra tomar um café depois do turno, eu topo.

Lissie parou por um instante, surpresa com o convite. Não era o tipo de gesto que ela esperava.

— Obrigada, Natalie. Eu... talvez aceite, sim.

— Boa. — disse Natalie, sorrindo antes de sair. — E por favor, tenta não viver só de café e teimosia, ok?

Lissie soltou um riso curto.

— Prometo tentar.

O restante do turno passou num ritmo quase leve. A sensação de peso ainda existia, mas havia algo diferente agora — algo que ela não sabia nomear.

No final da tarde, quando a movimentação começou a diminuir, ela foi até a varanda lateral do hospital, onde costumava respirar entre um caso e outro. O ar frio de Chicago cortava, mas também trazia uma estranha sensação de clareza.

Tirou o celular do bolso e abriu a conversa com Jay. Por um momento, só ficou olhando para o texto dele, lendo as mesmas palavras outra vez.

"Você não tá sozinha."

Ela digitou, hesitou, apagou. Tornou a digitar.

Lissie:
"Obrigada por ontem. E por hoje também.
Você tinha razão... eu realmente precisava dormir."

A resposta veio minutos depois.

Jay:

"Eu sabia. Dormir ajuda a ver as coisas com menos peso.

E, bom... se o café te salvou, o mérito é todo do Will (mas eu aceito parte dos créditos)."

Ela riu baixinho.

Lissie:
"Tá bom, divido os créditos.
E talvez eu devesse agradecer direito algum dia."

Jay:
"Aceito café como forma de agradecimento."

Ela digitou rápido.

Lissie:
"Detetive teimoso."

Jay:
"Médica cabeça-dura."

Lissie sorriu, e o riso foi genuíno dessa vez. Olhou o horizonte, o céu que começava a mudar de cor. Pela primeira vez em dias, sentiu algo diferente pulsar no peito — não era só tristeza. Era vontade de recomeçar.

Ela guardou o celular, respirou fundo e voltou pra dentro. O hospital a esperava, a vida seguia — e, de alguma forma, havia alguém lá fora lembrando que ela não estava mais sozinha.

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⏰ Last updated: Nov 26 ⏰

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