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O segundo dia de Lissie no Gaffney Chicago Medical Center começou cedo, antes do sol atravessar os prédios de Chicago. Ainda estava escuro quando Lissie estacionou o carro diante do Med. O céu dessa cidade tinha aquele tom azulado de pré-amanhecer, o vento cortava pelas ruas quase desertas, mas ela já sentia a conhecida energia que antecede o início de um plantão.

Respirou fundo antes de atravessar as portas automáticas, preparada para mergulhar de novo naquele ritmo que, em outras cidades, já tinha aprendido a dominar. Ela havia decidido que, apesar da proximidade com o mundo policial — algo que jurara evitar —, não deixaria isso interferir no seu foco ou na forma como se relacionava com o hospital. Porém, havia um detalhe incômodo: Chicago não era apenas mais um lugar qualquer. Era onde as memórias insistiam em espreitar pelos cantos, prontas para atravessar o seu caminho sem aviso.

Maggie estava próxima à triagem, conferindo pranchetas e supervisionando a equipe. Ao vê-la, acenou com um sorriso de boas-vindas, e Lissie correspondeu com um breve sorriso de retorno, mais caloroso do que no dia anterior.

— Bom dia, doutora Carter. Pronta para mais um dia intenso? — perguntou Maggie, sem rodeios.

— Sempre — respondeu Lissie, devolvendo o sorriso. — Ou pelo menos pronta o suficiente para sobreviver às primeiras horas.

Maggie riu baixinho. Havia em Lissie um humor contido, que surgia em frases secas, quase sempre no meio da seriedade. Nada espalhafatoso, apenas o bastante para aliviar a tensão. E aquele equilíbrio, Maggie sabia, era mais raro do que parecia.

Enquanto caminhava, Lissie percebeu uma coisa: o Med não era apenas um prédio cheio de pacientes; era um organismo vivo, com ritmos próprios, cheiros e sons que só quem passava horas naquele ambiente podia compreender. Ela não demorou a vestir o jaleco e se integrar à rotina. Will cruzou com ela nos corredores, acenando rápido, já sobrecarregado com exames e prontuários. April a cumprimentou com a cabeça enquanto passava com uma bandeja de medicamentos. A vida do hospital não parava, e Lissie absorvia cada detalhe como se fosse parte de um tabuleiro que precisava manter em ordem.

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O primeiro caso grave chegou pouco depois do amanhecer. Um rapaz de vinte anos, vítima de arma branca no abdômen, trazido às pressas pelos paramédicos. Sangue escorria pelo uniforme rasgado, a pressão caindo rápido. Assim que a maca atravessou as portas, Lissie assumiu a dianteira.

— Dois acessos grandes, banco de sangue agora, laparotomia de urgência — ordenou, a voz firme, sem elevar o tom.

Will já estava ao lado, ajudando a estabilizar. April correu para reunir materiais. A sala se encheu de movimento, mas a calma de Lissie manteve todos alinhados.

— Monitor tá oscilando — disse a enfermeira.

— Pois então avisa ele que não tem licença pra falhar hoje — respondeu Lissie, sem sequer erguer os olhos do paciente.

O comentário seco arrancou um riso breve de Will, mas a concentração dela não vacilou. Mãos rápidas, instruções claras, nada de desperdício. E em poucos minutos, o rapaz já estava preparado para o centro cirúrgico.

Do lado de fora, Jay Halstead observava. Voltou ao hospital para verificar o estado do homem baleado no beco, agora estável e na UTI, mas acabou testemunhando a cena. Não conseguiu evitar notar como Carter se movia: não era espalhafatosa, não buscava destaque, apenas trabalhava com uma naturalidade impressionante. Os fios dourados, presos de forma simples, caíam emoldurando aqueles olhos verdes atentos. E havia algo naquela postura — profissional até o último detalhe, mas sem perder humanidade — que chamou sua atenção.

Invisible StringWhere stories live. Discover now