April, por sua vez, olhou discretamente para Maggie, erguendo as sobrancelhas como quem dizia sem palavras: "Está acontecendo”.

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A lanchonete do hospital estava mais calma do que de costume naquela hora da noite, com poucas mesas ocupadas por enfermeiros, residentes e alguns visitantes cansados. O som distante das máquinas da Emergência ainda podia ser ouvido, mas ali havia um respiro mais tranquilo — luzes mais suaves, aroma de café e pão aquecido.

Lissie sentou-se em uma das mesas no canto, ainda com o jaleco aberto sobre o uniforme azul-escuro do Med. O cabelo preso de forma prática já estava com alguns fios soltos, e ela apoiou o café que Jay havia trazido sobre a mesa, cruzando as pernas com um gesto quase automático.

Jay se sentou à frente dela, pousando a sacola de papel entre os dois com um leve sorriso no rosto.

— Vai em frente, abre — disse, inclinando um pouco o queixo na direção da sacola.

Lissie ergueu uma sobrancelha, desconfiada, mas cedeu. Abriu a sacola devagar e, ao olhar dentro dela, soltou um riso curto, quase como se não quisesse admitir a surpresa.

— Você tá de brincadeira. — Puxou o pequeno pacote de dentro e o colocou sobre a mesa, revelando um cupcake de chocolate com cobertura generosa e algumas raspas de chocolate por cima. — Como é que… você escutou o que eu disse pra Maggie de alguma forma ou… tem alguma habilidade de adivinhação que eu deveria saber?

Jay riu baixinho, apoiando um cotovelo na mesa e inclinando-se um pouco mais para a frente.

— Nada disso. Só pensei que você ia gostar de ter alguma coisa doce durante os turnos. — Deu de ombros com um leve sorriso. — E, mesmo sendo meio clichê, achei que um cupcake era uma boa aposta. Um clássico.

Lissie olhou para o doce, depois para ele, e balançou a cabeça, incrédula.

— Clássico e certeiro, pelo visto.

Havia algo leve na voz dela, um tom quase divertido, mas que não chegava a ser piadista. Ela pegou a embalagem do cupcake e a girou entre os dedos, como se estivesse decidindo se o provaria ali ou esperaria.

— Vou fingir que você não leu meus pensamentos — completou, com um meio sorriso, antes de tirar o guardanapo de dentro do pacote. — Mas tenho que admitir que… acertou em cheio.

Jay observou-a com aquela paciência tranquila que parecia tão dele, apoiando as mãos juntas sobre a mesa.

— Bom, fico aliviado. Seria meio embaraçoso se eu aparecesse com, sei lá… um muffin de mirtilo.

Lissie deixou escapar uma risadinha baixa, divertida, enquanto dava a primeira mordida no cupcake. O gesto foi simples, natural, mas havia um leve brilho nos olhos dela, que não passou despercebido por Jay.

— Confesso que você tá se saindo melhor do que eu esperava — disse ela, depois de engolir a primeira mordida. — Café e doce na medida certa… isso é perigoso.

— Perigoso de um jeito bom, espero. — O sorriso de Jay ficou um pouco mais aberto, mas ainda contido.

Ela apoiou o cotovelo na mesa, descansando o queixo na mão livre, e o olhou com um ar levemente provocativo.

— Bom o bastante pra ganhar pontos. — Mordeu mais um pedacinho do cupcake e, sem desviar o olhar, completou: — Na Escala Halstead… você acabou de virar o jogo. Tá dois a um pra você agora.

Jay soltou uma risada baixa, balançando a cabeça.

— A famosa Escala Halstead… acho que estou começando a gostar desse placar.

— Não se empolga muito — respondeu Lissie, erguendo levemente a sobrancelha, mas com o mesmo meio sorriso divertido. — Ainda é cedo para garantir a vitória.

Ele apenas sorriu de volta, um pouco mais suave, e a observou enquanto ela voltava a se concentrar no cupcake. Aquele momento simples — café, doce e um placar improvisado — carregava uma leveza rara no meio da rotina dos dois.

Jay apoiou o cotovelo na mesa, girando devagar o copo de café entre os dedos, como quem procura um jeito natural de puxar assunto. O silêncio entre eles era confortável, mas ele parecia querer ir além da conversa leve.

— O dia no Distrito foi… longo — começou, com aquele tom que misturava cansaço e um toque de ironia. — Estamos atrás de um caso que vem tirando o sono de todo mundo. Parece que cada pista abre mais três portas.

Lissie, que ainda segurava o cupcake pela base do papel, levantou um pouco o olhar na direção dele. A expressão não era hostil, mas havia um leve endurecimento no maxilar, como quem escuta algo que prefere manter à distância.

— Halstead… — interrompeu antes que ele pudesse continuar. A voz saiu calma, mas firme. — Eu não quero saber.

Jay ergueu uma sobrancelha, sem disfarçar a surpresa com a interrupção.

— Não quer saber…?

— Nada que envolva polícia. — Ela apoiou o cupcake de volta no pratinho, os dedos entrelaçados na borda da mesa. — Voltar pra Chicago já foi o suficiente. Eu tentei ficar o mais longe possível desse mundo, e só de estar aqui, sentada com você, já é mais do que eu planejava.

Houve uma pausa. O barulho do movimento do hospital filtrava-se pelo vidro da lanchonete — passos, vozes, o apito distante de algum monitor cardíaco —, mas entre eles, o silêncio pesou só por um instante.

Jay a observou com atenção, os olhos ligeiramente mais suaves, como se tentasse medir o peso do que ela havia dito.

— Não é que eu queira te puxar pra isso — respondeu, num tom baixo, quase defensivo, mas sem irritação. — É só… meu dia a dia. Às vezes escapa.

— Eu sei. Não queria te repreender por isso. — Lissie ajeitou uma mecha de cabelo que escapara do coque, respirando fundo. — Mas, se você pretende continuar… o que quer que seja isso que a gente tá começando a ter, prefiro que as coisas fiquem separadas. Não quero detalhes do que acontece no Distrito.

Ela não soou fria nem distante, apenas decidida. Era como alguém que já tinha traçado uma linha e sabia que não queria cruzá-la de novo.

Jay ficou em silêncio por alguns segundos, absorvendo as palavras dela. Depois assentiu, devagar.

— Tá bem. — A voz dele tinha um peso sincero. — Eu respeito isso. Não vou trazer o Distrito pra mesa.

Lissie assentiu de volta, com um pequeno movimento de cabeça, e a tensão diminuiu. O semblante dela suavizou, deixando que um traço de leveza surgisse ali.

— É melhor assim. — Ela apoiou os cotovelos na mesa, envolvendo a xícara entre as mãos. — Não é nada contra você. Só… eu já estive perto demais disso antes. Não foi algo que quero revisitar.

A última frase ficou suspensa no ar, deixando implícito que havia uma história ali — algo que Jay percebeu, mas não tentou forçar. Ele passou o polegar pela borda do copo e desviou os olhos por um instante, num gesto silencioso de respeito.

— Entendido. — Ele voltou a olhá-la, esboçando um pequeno sorriso de canto, tentando aliviar o clima. — Então a gente fala de outra coisa.

Lissie arqueou uma sobrancelha, inclinando um pouco a cabeça, avaliando-o.

— Tipo o quê?

Jay deu de ombros, um sorriso breve surgindo.

— Tipo qualquer coisa que te faça relaxar. Não parece que você faz isso com frequência.

Ela soltou um riso curto, sem desviar muito o olhar.

— Não é o meu talento mais desenvolvido.

— Sempre dá pra aprender. — Jay disse com um tom leve, sem pressioná-la.

Lissie apenas balançou a cabeça, um quase sorriso nos lábios, e voltou a beber o café, deixando a conversa descansar naqueles poucos segundos de pausa confortável. Por um momento, os dois ficaram em silêncio, sem pressa de preencher o espaço — e isso, de alguma forma, parecia já ser um avanço para ambos.

Invisible StringWhere stories live. Discover now