CAPÍTULO 2: O Respirador

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O rosto dele estava da cor de um pano de prato:

— Vim o mais rápido que pude. Onde está?

— Vamos, entre. Não vai poder vê-lo se ficar parado aí fora.

O homem esfregou as mãos enluvadas uma na outra. Ele passou para dentro, soltando um gemido descansado quando sentiu o calor da sala contra as faces. O ar-condicionado ainda estava funcionando.

— Quando foi que você o encontrou? — Don Paolo sacudiu os ombros, tentando se aquecer mais rapidamente.

— Foi há três dias e vou logo avisando, aquela criança não era cinza e escorregadia quando a peguei nos braços pela primeira vez. Pensei que fosse uma lenda, um mito. Venha comigo, ele está na banheira. O banheiro fica ao final do corredor.

— Na banheira? Sozinho?

Betty dispensou o questionamento com um gesto vago de mão.

— Foi o único jeito que encontrei para fazê-lo se acalmar — disse. — Trouxe a mamadeira?

Don Paolo olhou para ela em dúvida e concordou lentamente, pousando a mãozorra em cima de um calombo que tinha no quadril. Se Elizabeth G. só agora tinha enlouquecido de vez, era a mulher enlouquecida mais atraente que os olhos do argentino conheciam.

***

O pequenino estava deitado nos fundos da banheira, de olhos abertos e indagadores, emprestando-lhe aquele ar perdido dos bebês que acabavam de nascer.

— Bem, é como eu disse — falou Betty, cruzando os braços e encostando-se na parede entre a pia e a privada. Ela indicou a banheira com um movimento de cabeça. — Acredita em mim agora?

Don Paolo abriu a boca, mas não disse nada, não de imediato. Precisou de alguns segundos para refletir.
Por fim, o bigode grisalho tremeu um pouco quando ele sorriu.

— Pensei que nunca mais fosse ver um deles, ainda mais um tão jovem — admirou ele, segurando-se nas bordas da banheira para poder olhar mais de perto. Don Paolo empurrou os óculos para a ponte do nariz. — Quer dizer que ele reage muito bem quando está na água, não é? Reage tão bem ao ponto de mudar de cor.

Betty havia enchido a banheira pela metade. 

Embaixo d’água, a pele daquela meiga criatura exibia um aspecto emborrachado e liso, cor cinza chumbo, perfeitamente visível graças a claridade do banheiro limpo. O semblante abobalhado e tranquilo em seu rosto fitava-os através da água cristalina.

Quando Don Paolo curvou-se para olhá-lo melhor, o bebê bocejou demoradamente, encolhendo as perninhas, fazendo com que bolhas subissem até a superfície.
O velho balançou a cabeça, admirado.

— É um bebê Quimera. — Don Paolo tornou a se erguer, tirou os óculos e apertou os olhos com as pontas dos dedos, de repente sentindo-se atordoado.  — Quanto quer por ele? Vejamos, diga-me o seu preço.

Sem perder a serenidade e o contato visual, Betty arregaçou as mangas da camisa xadrez que usava, desencostando-se com um leve sorriso nos lábios.

— Não estou vendendo ele. Pode me dar licença? — pediu, querendo espaço diante da banheira.

Don Paolo deu um passo para o lado, não queria perder nada.

Delfin: A História de um Menino Golfinho no Fim do Mundo Where stories live. Discover now