Saí em busca de um banheiro. Andei, andei, andei e nada.

Então passei por uma abertura que dava acesso à área exterior. Foi quando vi uma silhueta familiar, de costas para mim e de frente para um lago luminoso, cheio de peixinhos dourados.

Aproximei-me, e percebi que era o Sr. Edan.

Havia outras pessoas lá, mas de repente, tudo pareceu perder o foco e sentido quando o vi com seus olhos cheios de lágrimas.

Eu não iria chamá-lo, seria uma falta de educação da minha parte não respeitar aquele momento.

Mas vê-lo segurando um choro, me doeu também.

Doeu de uma forma que eu nem sabia como expressar em palavras, ou em gestos.

Com toda sua forma, com toda sua postura, e com todo seu ar natural de superioridade.

Mas eu o entendi.

Nem sempre conseguíamos engolir tudo. Nem sempre conseguíamos esconder do mundo as nossas inquietudes e aflições.

Ele não me viu, então voltei para dentro do palácio, com o coração estranhamente pesado.

Depois de ter andado o lugar quase inteiro, encontrei o banheiro.

Uma mulher muito bonita passou ao meu lado, e me parou.

— Toilet? — Perguntou.

— Ar... arrevuê? — Falei e forcei um sorriso no rosto, desengonçado.

A mulher, ruiva de cabelos bem curtinhos, me olhou assustada. Será que eu falei alguma besteira?

— Er... Eu quis dizer arrevuá. — Sorri ainda mais desengonçada e dessa vez, envergonhada. — Ou seria rovoir?

— Last runner on the left — A voz de Edan ressou atrás de mim.

A bela mulher sorriu, e sua feição mudou de confusão para encantamento.

— Thank you. — Ela respondeu, e saiu na outra direção.

Virei-me, e me deparei com Edan; lindo, como o vi perto do lago. Mas desta vez, nada de lágrimas.

Como alguém conseguia disfarçar tão bem o sofrimento?

Como alguém conseguia levar tão bem essa vida de esconder e enterrar tantas perturbações?

E quais seriam, exatamente?

— Bom revê-la novamente, Srta. Sarah. — Ele sorriu — Ou devo chamá-la, Bela Adormecida?

— Er... Bom revê-lo, Sr. Edan. — Sorri de volta.

Ele sorriu.

— Estava treinando seu francês?

— Tentei.

Encarei-o.

Se eu falasse para ele que poderia se abrir comigo? Que eu estaria aqui para ouvi- lo?

Senti-me tentada.

— Sr. Edan... Eu...

De repente, todo o lugar ficou escuro. E uma ave passou voando por cima da minha cabeça.

— É o nosso projeto.— falou.

Ele segurou em minha mão.

— Venha comigo.

Edan me levou até perto de uma das passarelas da exposição, perto dos demais funcionários que assistiam toda apresentação, fascinados.

Todas as pessoas pararam para assistir o que estava acontecendo, e depois que a ave passou, começaram a aplaudir.

Então um desfile de cores começou na passarela. Os traços iam se desfazendo e se refazendo à medida que os animais caminhavam.

O mais fofinho foi um filhote de gato-maracajá.

A onça olhou para os dois lados e rugiu. As pessoas aplaudiam com tanta força, que era quase impossível não ser contagiada.

— Isso não é emocionante? — Falei, com os olhos brilhantes.

Todos os desenhos continham traços peculiares, era como se os animais tivessem saído de dentro dos HQ's.

— Sim. — Edan pôs as mãos no bolso e ficou apreciando a exposição do nosso trabalho.

De repente todas as luzes se apagaram, um silêncio invadiu o cenário, e um som de águas do mar aumentou com a agitação de ondas que surgiram do chão.

Uma luz vermelha lá no fundo se acendeu quando um boto-vermelho pulou sobre a cabeça dos visitantes e fez uma manobra no ar.

Todos aplaudiram fascinados.

— A K.C.L. também trabalhou muito bem, sem ela seria quase impossível tirar o projeto do papel e colocá-lo assim... no ar. — Edan falou.

— Isso é impressionante Sr. Edan! — Virei-me para ele, aplaudindo, com um sorrisão no rosto, totalmente empolgada — Está tudo muito lindo!

Ele apenas ficou parado, e observou-me.

— Sim... Muito lindo. — Ele repetiu.

As aves voaram para todos os lados do salão conforme a melodia da música ia ficando cada vez mais longe e o som cada vez mais baixo.

Então o som ficou apenas em uma melodia melancólica de piano, e todos os animais apareceram de uma única vez, e caminharam para uma lista vermelha. À medida que iam passando por aquela lista, olhavam para trás, fixamente, com um olhar penetrante, e deixavam de existir.

E a listra vermelha explodiu em cores que formaram em três línguas diferentes a frase "respeitem-nos, e deixem-nos existir".

E as luzes reacenderam.

Todos que estavam presentes ficaram aplaudindo o espetáculo. Do outro lado dava para ver a reação de jornalistas que transmitiam o evento ao vivo.

Alguns correspondentes brasileiros se aproximaram do Sr. Edan, e da Lana Garcia, que estava de pé do outro lado.

Os repórteres se aproximaram de alguns dos meus colegas, e antes que pudessem chegar em mim, fugi; indo para o meio do salão e me camuflando entre as pessoas.

Fiquei assistindo outras apresentações, que foram quase igualmente belas e surpreendentes, até perceber que já era a hora de voltar. Eu tinha marcado um horário fixo para a taxista vir me buscar.

Passei para o outro lado do salão, para ir em direção à saída, e então encontrei Edan.

Ele estava conversando com a Lana, e quando me notou, estendeu o braço.

Eu parei.

Sr. Edan se despediu dos demais, e veio em minha direção.

— Srta. Sarah. Eu já falei com quase todos, só estava faltando sua pessoa —

Ele sorriu. — Obrigado.

— Eu quem agradeço pela oportunidade de ter participado deste evento, Sr. Edan.

OLHOS DO DIA [LIVRO 1]Where stories live. Discover now