- Ai minha nossa! - Abaixei-me para ajudá-lo a pegar os doces que caíram no chão - Me perdoa moço, eu não vi que o senhor ia passar para o outro lado - falei, com a boca cheia.

- Tudo bem senhora, deixe que eu pego.

- De maneira nenhuma, eu que topei no senhor e derrubei os doces, então eu pego. Seria injusto com o senhor.

- Muito obrigado, senhora.

Comecei a ajudá-lo recolhendo os doces.

- Querida, por que está abaixada aí? - Uma mulher já idosa e com os cabelos grisalhos presos num coque, me analisou de cima. Ela usava muitas joias nos dedos e vestia uma echarpe de pelo sintético branco por cima de um longo vestido bordô.

Levantei minha cabeça para vê-la melhor.

- Desculpa parecer indiscreta, mas, quem deixou você entrar? - Ela olhou para a porta principal - Agora me pergunto como, porque nossa segurança está em peso na entrada.

- Não senhora, eu sou convidada. Só estou ajudando o moço aqui porque eu...

De repente, senti alguém próximo de mim, abaixou-se ao meu lado e ajudou o garçom a colocar os últimos doces do chão de volta na bandeja.

Sr. Edan?!

Ele sorriu gentilmente, e de instantâneo, meu coração acelerou.

Absurdamente lindo e sereno, em um terno que realçava perfeitamente a cor dos seus olhos.

Sra. Flora, essa é minha funcionária e foi convidada por mim. - Ele lhe lançou um olhar sem muita emoção.

Sr. Edan se levantou, e o garçom se levantou em seguida, agradeceu, e saiu apressado.

Ar... Sr. Edan Hoffmann - A senhora ficou pálida - Eu não quis dizer que...

Edan me estendeu a mão, e me ajudou a levantar.

- Essa é a Srta. Sarah. Srta. Sarah, esta é a Sra. Flora, minha sócia e dona dessa galeria.

Ela levantou a mão para mim, aparentemente constrangida e envergonhada, e eu a apertei amigavelmente.

- É um prazer conhecê-la, Srta. Sarah. - Ela respirou profundamente e se recompôs - Me perdoe pelo ocorrido.

- Ah, tudo bem. - Soltei um sorriso sincero, mesmo que ainda desconcertado.

- Se nos der licença - Edan pegou em meus ombros e me guiou para a outra direção.

- Sr. Edan, eu queria justamente falar... - Flora tentou se aproximar.

- Minha secretária conversará com a senhora mais tarde. Eu não poderei ficar, tenho outras coisas a tratar, desculpe-me.

Fui caminhando com ele até a direção da saída, e quando finalmente já estávamos do lado de fora, pude respirar de alívio.

- Obrigada, sr. Edan.

Tentei não parecer tão desconcertada diante dele.

- E me perdoe... - Respirei fundo. - pelo transtorno.

- Eu que sou grato por me fazer enxergar com quem eu verdadeiramente estava lidando, Srta. Sarah. - Ele virou-se para mim - Ah, e aquela forma de

conversar com o doce de maracujá com ganache de chocolate - Edan sorriu de modo sereno - Foi um tanto peculiar.

Ele me ouviu falando aquelas coisas embaraçosas antes de comer o docinho? Minha bochecha automaticamente ruborizou.

Mas, antes daquele incidente, não me parecia estar gostando muito da festa, não é mesmo? - Ele me encarou, sério.

- Na verdade, não tanto. - Olhei para o final das luzes brilhantes do gramado.

- Não gosta de festas? - Sua voz parecia curiosa e um tanto surpresa.

- Oh não. Eu vim para não fazer desfeita. Eu estava me sentindo um pouco incomodada com tanta sofisticação. - Observei-o ligeiramente - Oh! Não que isso seja ruim! - Gesticulei com as mãos e sorri - É só que não estou acostumada.

Ele colocou uma das mãos no bolso e sorriu, um sorriso encantador.

- Eu entendo perfeitamente. - Disse.

- Entende? - Finalmente tomei coragem e olhei em seu rosto.

Observei-o, atenta.

- Para ser sincero, estou aqui pelo mesmo motivo que o seu. Não queria fazer desfeita. Até porque esse tema foi em homenagem a... - Dessa vez, ele quem virou o rosto, e olhou para o final das luzes do gramado antes de completar sua fala - a alguém especial.

Ele pareceu ficar triste com alguma coisa muito profunda e pessoal, então tentei mudar de assunto.

- Garanto que até o senhor falar, eu nem sabia que isso era uma festa. Fizeram-me acreditar que era uma inauguração de negócios, para criarmos conexões, mas a única conexão que consegui criar foi com o doce de maracujá.

Edan sorriu.

- Se me permite. - Ele pausou suas palavras e por fim completou. - Há outra coisa que gostaria de perguntar.

- Pois pergunte.

- Conseguiu recuperar sua bolsa aquele dia?

- Não. Mas não tinha nada de muito importante. Só alguns papéis de bombons e meu dinheiro.

- Sinto muito.

Um silêncio vagamente nos tomou.

- Se me lembro bem, disse que não era daqui.

Que memória fascinante.

- Olhei para meus pés, tomada pela timidez que me invadia.

- Sim. Sou de uma cidadezinha, que na verdade mais parece uma vila campestre de pequenos agricultores. Ela se chama Lago do sul.

Sério? - Ele pareceu surpreso - E logo nos seus primeiros dias se deparou com uma realidade bem dura, não é mesmo? A forma como foi tratada mostra a realidade de muitos, Sarah.

- Sim. Os problemas sociais também me entristeceram. É como se na mesma cidade, houvesse mundos diferentes. Entende? De onde eu vim, quase todo mundo se ajudava no que podia, mesmo com tão pouco.

- Eu entendo. Isso também me entristece. Muito.

Então virei-me, e percebi que seus profundos olhos avelã estavam sobre meu rosto. E agora, sobre os meus olhos, que foram pegos e capturados como uma frágil gazela fugitiva na floresta.

Não me deixei escapar, agora que estava ali, presa, senti a profundidade e intensidade do seu olhar, que eram inebriantes, ao mesmo tempo que eram o puro fascínio.

E indo cada vez mais além do profundo, na medida que ia sendo sugada para dentro de seu olhar, olhei-me diante de um abismo. Um abismo frio, solitário e triste. Um abismo escuro e tomado de aflição.

Ali, no reentrante de sua íris, um instigante sofrimento e pedido de socorro me jogou para fora da interpretação de como ele verdadeiramente se sentia;

Edan era uma pessoa triste.

OLHOS DO DIA [LIVRO 1]Where stories live. Discover now