Capítulo 21: O retorno ao pesadelo

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Sexta-feira, 23h15.

Janete não conseguia abrir os olhos, mas já ouvia muito bem tudo o que acontecia ao seu redor. Percebeu estar em uma enfermaria e reconheceu a voz de Rosana, sua melhor amiga, que estava sendo acalmada por um médico. Dizia ele que os exames feitos não constataram nada, mas que não sabia o motivo que causou tamanha dor e nem o que era o pequeno corte nas suas costas e se ele seria suficiente para levá-la ao desmaio. Que o caso dela era o segundo extraordinário da noite. Que mais cedo um rapaz tinha dado entrada na emergência por levar uma facada, mas que milagrosamente estava muito bem.

Tudo que ela lembrava era de ter sentido uma dor enorme nas costas, e de repente tudo escurecer. E agora estava ali, numa cama, enferma, sem conseguir mexer um único músculo. Como isso tudo aconteceu?

Conseguiu entender quando o médico disse que ela precisava repousar, e que pela manhã iriam fazer novos exames. Nesse momento, sentiu seu corpo ficar dormente e percebeu que iria perder novamente a consciência. Conforme ia perdendo, foi lembrando do pesadelo que viveu no seu sonho, no cinema. Precisava saber se seu amigo Robertinho estava bem. Não queria dormir, não podia. O medo tomou conta, mas foi suprimido pelo sono, que a fez apagar.

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Janete enfim acorda. Estava muito confusa, mas se sentia bem. Sentou-se na cama, com as pernas penduradas. Então lembrou onde estava: numa enfermaria.

Mas algo não estava certo, só havia ela na enfermaria, situação muito difícil de acontecer no caso em que o Brasil vive na saúde nos dias de hoje.

Gritou por uma enfermeira e tudo que obteve foi um eco estranho. Como isso era possível? Ela que estava sozinha na ala inteira! Foi então que percebeu que a iluminação também não era das melhores e que não conseguia enxergar direito.

Seu leito era logo o primeiro, com a porta à sua direita. Desceu da cama e saiu.

O corredor se encontrava na penumbra e um cheiro forte de podre foi percebido por ela. Onde diabos estava Rosana?

Viu que a sua esquerda, cerca de 5 metros, tinha um pouco de luz vindo de outro corredor. Foi na direção da luz, e no caminho percebeu estar praticamente nua, vestida apenas com o roupão do hospital e precisava arrumar algumas peças de roupas.

A enfermaria que ela estava era a segunda do corredor, e ao passar pela primeira ouviu um gemido vindo de dentro dela. O susto foi grande, mas entrou para ver o que era. O ambiente também estava na penumbra, e ela não pôde ver muita coisa. Foi então que ouviu uma voz baixinha pedindo ajuda, e uma mão fria segurou o seu braço. Sua reação foi instantânea: puxou o seu membro e virou para ver quem havia segurado ela.

O grito que Janete deu poderia ter acordado metade dos mortos do cemitério de Nova Iguaçu, à quilômetros dali, de tão alto que foi. Mas não era para menos, deitada numa cama imunda estava uma velha magricela com a pele roxa e cheia de feridas. Mas o pior estava no seu rosto, que além de desfigurado, tinha apenas dois buracos onde deveriam estar os seus olhos.

"Shiiii", fez a velha para ela antes de dizer — não faça barulho, se não ele te acha rápido.

Ouvir isso deixou a jovem paralisada. Quem poderia achar ela? Que tipo de hospital era esse?

Um rosnado veio do corredor, e mesmo parecendo estar longe, mostrava que algo não estava certo. Então ouviu a velha balbuciar — corra!

Ela não saiu correndo, suas pernas ainda tremiam, mas caminhou até a porta. Ao sair ouviu mais uma vez o rosnado, e dessa vez estava mais perto. Olhando para sua direita, de onde tinha vindo, pôde ver uma criatura parecida com um cachorro em frente à enfermaria em que ela acordou. Ela olhou melhor a criatura, era sim um cachorro, só que estava muito machucado, sem praticamente todo o seu lado esquerdo, inclusive uma das patas. O cachorro não tinha metade da cabeça e nem sua pata dianteira esquerda, mas estava ali parado olhando para ela com o olho que sobrou!

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