Capítulo 11: A fúria de Sabrina

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Sexta-feira, 22h58.

Sabrina teve que correr um pouquinho para alcançar Mateus, já no hospital, na ladeira que levava a emergência. Num determinado momento tiveram que sair do meio da rua para darem passagem a ambulância que havia socorrido Marquinhos. Mateus até tentou fazer um sinal para os socorristas, mostrando querer falar com eles, mas não perceberam. Então ele apertou o passo e subiu rápido a ladeira, pois queria saber do amigo quanto antes.

Chegando onde haviam deixado às duas mulheres, elas não estavam. Olharam em volta e viram elas na porta de entrada da emergência conversando com um homem vestido de azul, que indicava ser um médico do setor. Ele quis correr até lá, mas Sabrina o segurou pelo braço.

- Não, Mateus, deixe-a conversar tranquilamente com ele. Daqui a pouco saberemos o teor da conversa.

Não era o que ele queria, mas seguiu o pedido de Sabrina. Após alguns minutos, Regina os viu e foi até onde eles estavam. Mateus nem bem deixou ela se aproximar muito e já foi perguntando:

- Como ele está, mãe?

Ela abriu um sorriso e olhou para os dois.

- Não entendo muito bem o que o médico disse, mas ele garantiu que ele está totalmente fora de perigo, que vai se recuperar muito rápido. Prestaram um atendimento tão rápido que até esqueceram dos rapazes do SAMU, que aproveitaram e jantaram com os enfermeiros. Por isso demoraram a sair.

Era visível a emoção nos olhos de Mateus.

- Como eu quero pôr as mãos no miserável que fez isso.

- Me desculpa por não contar antes, mas a preocupação era grande. Estávamos saindo de casa quando um rapaz de moto nos abordou no portão e disse que não precisávamos nos preocupar com o responsável pelo ocorrido, que já tinham dado "cabo" dele. Como ouvi um tiro alguns minutos antes, presumi que foi o que pôs fim a mais uma vida nessa Terra.

Mateus não acreditava no que estava ouvindo. Por mais que quisesse encher de porrada o sujeito, nunca passou pela sua cabeça ver ele morto, ainda mais sabendo que a culpa era do demônio com feições de bode.

- Tem certeza, mãe? A senhora sabe que os "meninos" da boca não resolvem suas coisas apenas com um tiro. Estão com contenção de despesas?

Regina sorriu e deu um tapinha no peito do filho.

- É sério, mãe. Você tem certeza disso?

Agora Regina demonstrava um pouco de irritação.

- Não, apenas deu vontade de inventar isso para tirar um sarro com a sua cara de babaca.

Sabrina soltou uma risada alta, chamando atenção até do médico e da Márcia, que continuavam conversando.

- Poxa, mãe! Não precisava pegar tão pesado.

- Então você pare de me fazer perguntas idiotas, pombas!

Mateus fez menção de continuar falando, mas Márcia já estava chegando por perto e todos queriam saber sobre Marquinhos.

- Vejo que todos estão felizes, que bom - disse Márcia abraçando a todos.

Sabrina sentiu, mais uma vez, um peso enorme sair dos seus ombros, e se perguntou até quando pessoas boas poderiam estar em perigo por causa dela e de Mateus. Por causa de dois encarnados.

- O que mais disse o médico, Márcia? - perguntou Regina.

- Ficamos conversando sobre o milagre que salvou o Marquinhos. Ele não consegue entender como um ferimento desse não arrebentou com nenhum órgão interno da região, tais como: fígado, baço, pâncreas, estômago e principalmente o intestino. Ele me relatou estarem com um leito disponível e o levaram rapidamente para a cirurgia, e que logo no início viu algo muito estranho, como se ele tivesse tido perfurações em mais de um órgão, mas como num milagre, ele parece ter sido "soldado".

"Soldado"? Disseram os três automaticamente.

- Sim. Foi essa a palavra usada por ele.

Sabrina e Mateus se entreolharam, pois, sabiam quem havia feito isso, e agradeceram por ele estar por perto no momento do ocorrido.

- Se foi um milagre ou não, o que me importa é ele estar fora de risco. Mesmo se tivessem usado solda metálica nele, eu não me importaria se fosse para salvá-lo - continuou Márcia.

Todos estavam eufóricos e felizes agora.

- Então você pode ir para casa tomar banho, Mateus. Você está fedendo - disse Regina.

Agora todos estavam olhando para o rapaz e rindo, a tensão sumiu e todos estavam relaxados.

- Eu vou, tomo um banho, e volto.

- Negativo. Você vai tomar banho, comer algo e dormir - afirmou sua mãe.

Ouvindo isso, Sabrina foi se despedindo das mulheres e puxando Mateus para acompanhá-la.

Rapidamente desceram a ladeira e chegaram na rua, e para a surpresa da moça, um jovem esbravejava na barraca da senhora que minutos antes eles haviam feito um lanche. Fingiram não terem visto a cena e Sabrina já estava com o celular nas mãos para pedir um Uber, pois sem camisa seria difícil para Mateus conseguir embarcar em algum ônibus.

Porém, como um pára raio de problemas que os encarnados parecem ser, o jovem que estava nervoso com a senhora da barraca, se voltou contra eles.

- Ei! Foram vocês que colocaram besteiras na cabeça da minha avó?

Sabrina ainda demorou a entender que o rapaz estava falando com eles.

- Perdão, mas não entendi.

A senhora da barraca tentou falar com o neto.

- Se acalme, Kelvin. Por favor! Vá para casa e me deixe trabalhar.

Nesse momento ela tentou segurar o braço do rapaz, que por sua vez, se voltou contra a idosa e a empurrou contra a barraca, que só não caiu por pura sorte.

- Pega leve aí, cara. Ela é uma idosa - agora era Mateus quem dirigia a palavra para o jovem agressor.

- Porra nenhuma, seus merdas! Vocês deveriam levar uma surra por ficarem espalhando essas merdas de comunismo para famílias de bem como a minha. Minha avó é uma pessoa boa, mas inocente, e as bostas que vocês falaram mexeram com ela.

Sabrina então começou a entender o que estava acontecendo.

- Então ela te questionou em ter que ficar trabalhando aqui até tarde para sustentar seus caprichos. Acertei?

O ódio do rapaz agora estava no limite, e ele estava por um triz de agredir a Sabrina.

- Sua vaca imunda feminista, não se meta em assuntos da minha família. Ou...

- Ou o quê? - se meteu Mateus, colocando-se entre Sabrina e Kevin.

Nesse momento, Sabrina colocou a mão direita no ombro de Mateus.

- Deixa, eu faço questão de resolver com esse otário.

Kevin não gostou de ser chamado assim e explodiu, partindo para cima da dupla. Mas Sabrina foi rápida e jogou Mateus para o lado e aplicou um tapa forte no rosto do rapaz, que caiu com as mãos no rosto tampando a vermelhidão e inchaço que já crescia.

- Poucas coisas são tão desmoralizantes que um tapa na cara, não? Vindo de uma mulher é pior ainda, certo? Se você for homem de verdade, levante-se para eu poder te encher a cara com mais tapas, seu cretino!

Mas a valentia de Kevin já havia terminado. A ardência no seu rosto era tão grande que ele sentia que poderia desmaiar a qualquer momento de dor e com o lado esquerdo do rosto incrivelmente inchado.

- Você aprenda a dar valor a sua avó, porque voltaremos aqui outras vezes, e se eu vir você destratando ela novamente ou ficar sabendo que fez isso, irei te caçar e te encher de porrada. Seu covarde.

A dupla ainda ajudou a senhora a arrumar as coisas que haviam caído quando o neto dela a empurrou contra a barraca, e pelo canto dos olhos viram o Kevin atravessar a rua e sumir na esquina do outro lado. Aguardaram ainda alguns minutos o Uber chegar, e após terem permissão para Mateus embarcar sem camisa, caíram na gargalhada no carro.

O EncarnadoWhere stories live. Discover now