42. o monstro debaixo das nossas camas.

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Imaginar-me fazendo isso como eu fazia com meus amigos, com Gwen, com Alyssa? Dava uma sensação de pavor, porque eu sabia que nada estaria seguro com ela.

Eu sabia porque em minha insanidade acometida por razões fora do meu controle, praticamente confiei meus irmãos, e o resultado não foi bom.
Eu não sei por que meu pai “traiu” minha mãe com ela, mas no fundo, acho que entendo. Ela ainda conseguiu me prender a ela da maneira que pôde até então, portanto...

─ Oh, Ethan ─ ela soprou, erguendo as sobrancelhas. ─ Você chegou ao ponto de expulsar sua própria mãe de casa?

Havia algo sobre ouvir as palavras de Malorie e finalmente encarar a admissão ao lado dela, olhando em seu rosto tão familiar e desconhecido ao mesmo tempo. Essa era aquela mulher que vinha a nossa casa de vez em quando, que deixava minha mãe nervosa e triste ao mesmo tempo; que deixava meu pai de mau humor e bravo e que, às vezes, ocasionava algumas brigas entre eles. Essa era aquela mulher que nunca foi próxima e que era da família, mas se precisássemos comparecer ao enterro dela, sequer conseguiríamos provocar uma lágrima.

Essa era aquela mulher que sempre me procurava para perguntar se eu estava bem ou o que eu estava fazendo naquelas raras vezes que aparecia em nossa casa. Essa era aquela mulher que não lembrávamos mais do que cinco vezes no ano, e isso porque era a quantia de vezes que ela surgia em nossos dias.

Essa era aquela mulher com quem meu pai cometeu o erro que mais se arrependeu em toda a vida.

Essa era aquela mulher; a mulher que minha irmã mais odiava no mundo.

Essa era a mulher que disseminou uma praga nova entre nós a cada chance que teve, até mesmo antes de nascermos.

Esse ser humano incrível que Malorie Young era... corria nas minhas veias também.

Minha mãe.

Nunca vou entender porque, realmente, mereço esse castigo.

─ Malorie, ─ eu soprei, espalmando sua bochecha em uma falsa fé de afeto antes de despejar as palavras mais cruéis que essa admissão trouxe à tona: ─ minha mamãe está morta. Você não tem sido nada mais do que o monstro debaixo das nossas camas. Tão assustador quando estamos à sua mercê e tão patético quando vemos do que você realmente é feita.

Malorie se desvencilhou do meu toque e empurrou meus ombros, destravando o cinto e pulando para fora do carro. Eu a acompanhei com os olhos, assistindo quando ela parou em frente ao carro e levou as mãos à cabeça em um gesto de partir o coração. Se tivesse algo aqui que ela pudesse partir. Meus pais cometeram outro erro quando esconderam a verdade por toda a minha vida e decidiram que era uma boa hora como qualquer outra para contar quando a pessoa que acreditei ter me posto no mundo estava morta – só que ela não estava, quem estava era a mulher que me deu tudo o que precisei por anos.
Meu pai não teve tempo para me explicar como tudo aconteceu da forma que foi. Porque eu fui criado por eles desde que me lembrava. Porque ele dormiu com Malorie e foi tão estúpido a ponto de engravidá-la. Ele apenas me prendeu nesse castigo e me deixou aqui para viver com ele.

Não sou completamente irmão de Alyssa e Calum, e encarar esse fato doía mais do que qualquer coisa. Eu sou aquele outro, filho da mulher que ninguém conseguia gostar. Filho da mulher que só atormentou minha irmã e Calum, que era só uma criança.

Essa frieza, essa indiferença. Minha estabilidade emocional, beirando a inacessibilidade. Eu não adquiri isso completamente com os traumas da vida. Sempre esteve aqui.

Destravando meu cinto, saí do carro. Malorie olhou na minha direção por cima do ombro e deixou suas mãos caírem, mas tudo o que eu fiz fora me recostar no capô do carro e cruzar os braços, porque não havia nada que eu pudesse fazer para deixar mais claro que ela não tinha mais chances. Que encarar que ela era minha mãe era o fim da linha. Acabou entre nós dois. A única maneira de tirar o controle que ela tinha sobre mim ─ sobre os meus valores, minha generosidade e culpa em nome da nossa família ─ era mostrar a ela que a verdade não me assustava mais.

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