42. o monstro debaixo das nossas camas.

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Mas há algo antes disso, antes de eu ter a dádiva de conhecê-los, que estava manchando a história. Riscando por cima das palavras que formavam as memórias e contaminando tudo com egoísmo, inveja e maldade. Tirando de nós a única promessa que fizemos aos nossos pais que poderíamos realmente manter se lutássemos: permanecer juntos.

É errado, é tão errado e precisa terminar.

Foi por isso que quando entrei na casa e encontrei Malorie na sala, não tinha hesitação em meu corpo. Não tinha dúvida, não tinha sequer empatia, e eu odiava isso. Ninguém deveria me fazer sentir esse vazio de sentimentos porque simplesmente não havia mais nada para tentar oferecer a ela aqui. Eu arrisquei minha irmã para poder descobrir se havia a menor das chances de conseguir que ela se redimisse mas simplesmente não há.

Era triste, honestamente. Mas eu não podia mais fazer isso.

─ Cadê a minha irmã?

Malorie, que estava com as pernas dobradas sobre o sofá, as desceu e calçou suas sapatilhas enquanto me observava com grandes olhos castanhos cautelosos.

─ Com Calum no quarto ─ encolhendo um ombro, ela acrescentou: ─ Acho que dormiram esperando por você.

Assenti, ponderando as minhas opções. Eles esperariam por mim até que eu aparecesse, e fazer o que eu precisava fazer não poderia ser tão perto deles e nem tão demorado.

─ Vista-se ─ eu exigi. ─ Vamos dar uma volta.

Malorie entrou no carro me observando de canto agora, com movimentos calmos e curtos, encolhendo-se como uma senhora vulnerável. Em vinte e quatro anos nunca fui descrito como um cara violento e com certeza não perderia meu réu primário com ela, então suas atitudes estavam um pouco exageradas. Bater nela seria como bater na minha irmã ou em Gwen, e eu nem gosto de brigar com homens.

Ela não disse uma palavra enquanto eu dirigia, e eu imaginava se ela já teria despejado todo o veneno em Alyssa enquanto saí para poder assumir o papel de pobre coitada na minha frente, um que eu nunca realmente caí, mas quis mentir e dizer que sim. Eu precisava me lembrar, portanto, do que era real. Do que esperava por nós em casa, não aqui.

─ Eu pesquisei, sabe? ─ comecei, minha voz baixa e distante preenchendo o silêncio no carro. ─ Sobre como a cidade ia ficando depois que fui embora, principalmente por causa da Alyssa e do Calum. Sempre achei pequena demais para os planos que eu tinha.

─ Uma cidade pequena para uma pequena família feliz ─ ela comentou, soando blasé.

─ Mas ela cresceu com o tempo. Melhores escolas, melhores bolsas. Maior segurança, mais reconhecimento. Mais opções de vida sustentável para uma pessoa que planeja começar sua própria vida com sua própria independência.

Malorie olhou fixamente à frente, e eu quase podia visualizar as engrenagens trabalhando em sua cabeça.

─ Mas há esses conjuntos residenciais que me chamaram a atenção ─ eu parei em frente ao local, estacionando sem apagar o carro. ─ Você vê? Parece bacana, certo?

Ela observou atentamente a construção, mas sem realmente revelar em sua expressão o que achava da minha revelação. Ela era boa em mascarar suas emoções para que pudesse ter tempo o suficiente para escolher qual garantiria que ela se sairia melhor no final do dia. Malorie sempre fez isso: fazia com a minha mãe e fez com o meu pai, e até comigo ao longo dos anos mesmo antes da partida dos nossos pais.

Desviando meu olhar do prédio para ela, eu contemplei o perfil de seu rosto. Ela parecia mais velha do que a idade que realmente tinha, e seus olhos não tinham um brilho que era comum até mesmo na pessoa mais minimamente satisfeita com a vida, não havia nada de tranquilizante nela. Talvez eu quisesse que existisse. Talvez eu quisesse acreditar que poderia ter. Não havia um cenário em minha cabeça onde eu pudesse confiar nela.

Our Way HomeWhere stories live. Discover now