01. SARAH

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MOCHILA NOS OMBROS, parada diante do portão principal, Sarah Duran avaliou criticamente o local que seria seu lar durante o próximo semestre: a Escola Superior de Entre Rios.

Droga.

O maldito lugar era mesmo enorme. Dentro do maldito lugar enorme, cerca de dez mil pessoas estudavam, ensinavam ou trabalhavam. Desses dez mil, cinco mil eram homens. E, desses cinco mil, apenas um a interessava.

Sua tarefa: encontrá-lo.

– Só isso – reclamou a garota, em surdina. – Fácil!

Uma grande turma de alunos chegou, rindo e conversando. Passaram pelos lados da figurinha imóvel como se ela nem existisse e entraram, cheios de animação.

O portão principal tinha oito metros e quarenta de largura, três metros em sua parte mais alta, dois metros em sua parte mais baixa. Era feito de ferro trabalhado e estava completamente aberto, recepcionando os alunos.

Se Sarah estivesse de bom humor, poderia considerá-lo um símbolo de boas-vindas e um belo trabalho de artesanato. Mas seu humor estava péssimo e só o achou ridículo. Era um portão que não servia para nada. Não podia ser aberto e fechado com rapidez, todos aqueles ornamentos o deixavam muito frágil e, para completar, ele era um portão de três metros que guarnecia um murinho idiota de meio metro de altura.

Outro grupo de alunos entrou, com a mesma disposição alegre e barulhenta do grupo anterior. Sarah deixou-os tomar uns metros de dianteira e, com um bufo contrariado, entrou afinal. Não tinha escolha.

Avançou com passos firmes, decididos. Seus olhos muito azuis checavam discretamente jardins, prédios, acessos, conferindo-os com o mapa que memorizara. Seu humor piorou ao verificar que o mapa que a própria Escola de Entre Rios fornecia era falho quanto a direções e miseravelmente inexato em relação a distâncias. Tarefa número um, encontrar um mapa decente. Não ficaria num lugar no qual não pudesse se orientar até de olhos fechados.

Sem alterar as passadas, Sarah examinou o caminho largo e reto onde estava. Ele iniciava no portão principal e ia até o prédio mais antigo da Escola de Entre Rios: o Museu de História Natural. Com exatos 553 anos, construído com blocos de granito perfeitamente encaixados, o Museu mais parecia um castelo, graças a suas torres e ameias. O caminho também era de granito encaixado e estava gasto pela passagem de gerações e gerações de alunos.

Gasto, avaliou Sarah. Escorregadio! Seria um péssimo lugar para correr, se estivesse molhado. Anotou: em caso de emergência, evitar aquelas estúpidas pedras lisas. Qualquer relvado seria melhor para correr do que o caminho. E isso, claro, fez a mocinha transferir a avaliação para os extensos jardins. Eram planos, feitos de relva aparada com eventuais canteiros floridos. Estendiam-se até onde Sarah podia ver, perdendo-se entre os prédios. Não havia rochas, apenas muitas árvores centenárias. Hm. Considerando a espessura de seus troncos, seriam uma proteção tão eficiente quanto rochas. Mas os espaços abertos eram amplos, não poderia...

– Deixe de ser idiota – resmungou Sarah para si mesma, em voz quase inaudível. – Pare de planejar estratégias de batalha. Essa gente vive em paz. O máximo de encrenca aqui é o que aquelas imbecilzinhas estão provocando.

As referidas imbecilzinhas eram um trio de garotas pouco à frente, perfeitas exemplares da última moda: louras de cabelos alisados, estavam cuidadosamente maquiadas, usavam sandálias douradas e vestidos floridos, bem curtos. Olhavam tudo com grandes olhos maravilhados, conferiam informações no mapa todo errado que tinham nas mãos, riam, falavam e apontavam. Para completar, puxavam malas cor de rosa com rodinhas. Só faltava um cartaz luminoso anunciando CALOURAS DESLUMBRADAS.

Sarah observou um grupo se aproximando delas e estava justamente ao lado quando os veteranos cercaram as calouras, iniciando uma sessão de risos (dos veteranos) e gritinhos (das calouras). Elas foram devidamente encharcadas de tinta e farinha, e tiveram suas malas confiscadas.

Olho do FeiticeiroWhere stories live. Discover now