28.1. a liberdade do meu verdadeiro eu.

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Se mamãe não fosse bater na cabeça dele com a primeira coisa que enxergasse, ele provavelmente decretaria um toque de recolher em casa. Um detector de garotos na porta e uma inspeção detalhada das minhas atividades diárias. E considerando que mamãe estava agindo de forma estranha desde a nossa conversa no closet no dia anterior, eu não ousaria testar a paciência de nenhum dos dois.

Ethan tinha um seminário importante hoje, segundo Alyssa. Algo que definiria suas chances de conseguir um bom estágio para a graduação e, com sorte, ser efetivado mais tarde. Eu não sabia muito sobre os planos dele para depois da faculdade, percebi tardiamente depois que ela me contou. Não muito sobre qualquer plano futuro, também. Claro que ainda havia muito a ser descoberto, mas desde a visita de Malorie e todos aqueles pontos de interrogações pairando ao meu redor, tudo parecia mais sombrio.

Resisti ao impulso de roer as unhas enquanto subia as escadas e sentia um conforto inusitado ao ouvir o rangido dos degraus e o baque surdo dos meus pés no piso de madeira. Vasculhei minha bolsa atrás dos meus bombons de emergência e usei meu pé para abrir a porta do quarto de Ethan. Não precisei verificar meu caminho até tirar os sapatos e subir em sua cama. Não entrei aqui desde que ele me escondeu de sua tia e a merda bateu no ventilador, mas uma vez foi suficiente para que eu memorizasse tudo.

O quarto era pequeno, masculino e até mesmo meio sem graça. Paredes de cor neutra, uma cama com cabeceira de parede no centro e uma janela de tamanho médio sem cortinas ou persianas na lateral. A pequena cômoda do lado direito com um abajur, um livro, um relógio de pulseira de couro aparentemente parado e um copo de vidro com dois dedos de água. A escrivaninha estava organizada desta vez, papéis empilhados, livros ordenados alguns post-its grudados na parede. “Prova 15/10”, “Imagens do universo primitivo”, “teste do Calum” e “reunião c/ professora de matemática do C.” entre outras que meus olhos apenas vagaram.

Seus livros ainda estavam em pilhas pelo chão, no entanto. Ele deveria ter uma linda estante na parede para todos eles e mais, pensei comigo mesma conforme desembrulhava uma trufa de chocolate com recheio de geleia de morango. Inspirei profundamente, desfrutando do cheiro dele no quarto e o ar da tarde que adentrava pela janela aberta. Sem meias sujas hoje, apenas o cheiro característico de mofo e o dele, o qual eu estava tão familiarizada a essa altura.

Sentei no meio do colchão e cruzei as pernas, espalhei meus bombons sobre o cobertor meticulosamente dobrado e esperei. O colchão não era muito macio e não era grande, mesmo para uma cama de casal. Eu me perguntava o que ele iria pensar quando conhecesse o meu quarto e todo aquele espaço, todos os móveis e todas as cores e detalhes. Eu não me sentia mal por ter aquele espaço só meu que era digno de uma princesa, mas conhecendo a natureza humilde de Ethan, poderia ele me achar mesquinha?

Quero dizer, isso considerando que ele vá à minha casa.

Considerando que meu pai não coloque policiais no pé da escada.

Considerando que os dois passem mais de vinte minutos no mesmo espaço sem que ninguém se altere.

Mas eu não estava com medo (eu estava) porque não queria esconder Ethan. Diferente do que ele pensava, eu realmente queria tudo isso. Eu estava aceitando os riscos e finalmente entendi o que St. John havia dito sobre seu amigo. Tudo parecia certo de algum modo. Talvez porque nós dois estávamos dispostos a tentar pra valer.

A porta da frente bateu e eu me empertiguei, a consciência de sua chegada arrepiando minha nuca e despertando as borboletas furiosas que voavam em minha barriga e em torno do meu coração. Meu corpo tinha uma reação padrão para Ethan Young: entrar em colapso total, sem equilíbrio e sem lógica. Meu pulso iria de lento a uma montanha russa de emoções na mesma facilidade com que conseguia me prender com aquelas íris avelã caóticas. Mãos frias, joelhos trêmulos e lábios patetas.

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