APOLO
— Oi, meu dorminhoco lindo – escutei enquanto gradativamente ia despertando com uma sensação gostosa de beijinhos em minha nuca, à medida que uma mão descia pela minha barriga, rumo ao meu pau.
— Bom dia, amor. Adoro quando você me acorda assim – falei abrindo os olhos, já sorrindo, então me virei, deitando-me de costas para facilitar uma masturbação mútua entre nós dois.
Tínhamos dormido pelados, o que não era muito comum, mas ontem havia sido um dia especial, pois havíamos comemorado seis anos de casados, então sair fora da rotina estava liberado. Estava indo tudo bem naquela manhã. Nossas mãos em quase total sincronia, massageando-nos simultaneamente.
Carícias trocadas. E o nosso beijo, que a cada segundo nos incendiava mais e mais, porém fomos interrompidos pelo som de chamada de um dos celulares, que pelo toque, logo deduzi ser o do meu companheiro.
— Deixa tocar, Jacob – resmunguei, mas ele me deu um selinho e disse que precisava atender, antes de rolar para o lado dele na cama e pegar o telefone sobre a mesinha de cabeceira – Era do hospital? – indaguei segundos depois quando o mesmo desligou o celular.
— Sim, querido.
— Mas você não estava de folga hoje?
— Sim, Apolo, mas teve um acidente grave envolvendo um ônibus e uma van escolar e estão precisando de mim lá no hospital.
— Espero que as crianças estejam bem – comentei, já ficando preocupado e pensando no sofrimento dos pais daqueles anjinhos.
— Também queria pensar assim, mas provavelmente algumas estarão bem graves – ele disse me encarando.
— Vai lá, amor. E salva aqueles anjinhos – murmurei e nos beijamos antes dele se levantar da cama e ir para o banheiro.
O dia seguiu tranquilo para mim. De manhã, fui para o meu estúdio de fotografia e a tarde, eu tinha uma sessão de fotos para fazer como modelo. Quando voltei para casa, lá pelas cinco e meia, passei no mercado e fiz algumas compras, pois iria preparar um dos pratos preferidos do Jacob, para quando o mesmo chegasse do hospital comesse.
Entretanto, quando estacionei o meu carro na garagem, vi o dele ali.
— Amor? – o chamei à medida que ia para a cozinha, com as mãos cheia de sacolas e o encontrei sentado à mesa, mexendo em seu notebook, lindo, vestido apenas com a calça-moletom cinza que ele usava para dormir – Pensei que ficaria o dia todo lá no hospital.
— Cheguei umas duas da tarde. Vim descansar um pouco, porque vou ter que voltar às sete. E o porquê dessas compras todas? – ouvi ele perguntar enquanto eu começava a guardar as coisas.
— Se esqueceu que hoje é o meu dia de fazer o jantar, querido? E adivinha quem vai comer risoto de camarão com salsichas empanadas? – indaguei colocando os ingredientes sobre a bancada.
— Sério? Não acredito, Apolo. O que será que eu fiz para ganhar um mimo desse?
Sorri revirando os olhos, me aproximei dele, que ainda permanecia sentado à mesa, e o abracei por sobre os ombros.
— Eu poderia dizer que foi pela noite maravilhosa ontem, mas o motivo é por você ter dito "Sim" quando eu lhe pedi em casamento, naquela gôndola lá em Veneza – sussurrei em seu ouvido, então ele virou um pouco o rosto para nos beijarmos – Vou lá fazer o nosso jantar, e deixar você trabalhando sossegado – comentei, aprumando-me, já me desvencilhando de Jacob.
O mesmo me olhou confuso, porém fazendo um beicinho, então apontei para a tela do notebook dele, que se encontrava com várias guias abertas sobre uma doença infantil. Ficamos conversando sobre o nosso dia a dia, pois adorávamos saber o que cada um fazia quando estávamos longe um do outro, à medida que eu ia preparando a comida e ele fazia algumas anotações de sua pesquisa.
Já fazia um bom tempo que estávamos na cozinha, quando escutamos a campainha tocar, Jacob então disse que ia ver quem era e se levantou, indo primeiro até a área de serviço para pegar uma blusa, vestindo-a antes de ir atender a porta da frente.
— Quem é, amor!? – gritei segundos depois, mas ele não me respondeu então abaixei o fogo da panela e me dirigi até o hall da entrada.
Encontrei Jacob encarando um jovem de no máximo dezessete anos, de cabelos pretos, todo repicado, usando roupas bem maltrapilhas, além de estar de óculos escuros. O que era bem estranho, porque estava quase de noite e não tinha sol forte o suficiente para justificar o uso daqueles óculos.
— Pois não, rapaz? – inquiri, chamando a atenção do mesmo, que mirou seu olhar para mim, virando a cabeça em minha direção.
— É uma moça, querido. Ela disse que viu o nosso anúncio do jornal e veio nos fazer uma proposta.
Fiquei desconfiado, porque ela poderia ser uma ladra, uma drogada ou coisa parecida, pois não fazia nem dois dias que tínhamos mandado publicar o anúncio nos classificados do jornal local, onde expressávamos o desejo de adotar um bebê ou tentar uma barriga de aluguel para realizar o nosso sonho de sermos pais.
Eu sabia que em situações assim, poderia se demorar dias ou até semanas para recebermos algum retorno. Olhei então, meio receoso, para o meu companheiro, que me encarou de volta e deu de ombros.
— Olha, estou pouco me fudendo se vocês são gays ou não. Vocês estão querendo adotar, não é? Pois então... – a jovem disse chamando logo nossa atenção, então ela levantou o blusão que usava e ficou meio de lado, fazendo com que víssemos o pequeno volume em seu ventre – ...eu estou grávida. Não quero esse bebê e estou precisando de dinheiro. Vão querer ou não?
— Entra. Vamos conversar com mais calma – disse Jacob, recebendo um olhar reprovativo de mim.
— Bonita casa – a garota murmurou, olhando ao redor, admirada.
— E se ela for uma ladra? – cochichei enquanto fechava a porta.
— Sem paranoia, Apolo. Por favor – Jacob sussurrou de volta e se virou sorrindo para a moça – Obrigado... Como se chama, senhorita?
— Theodora, mas podem me chamar de Thea.
— Ok, Thea. Vamos nos sentar naquele sofá ali. E amor, acho que o seu risoto já deve estar pronto.
— Se ela te atacar, tu grita – pedi num sussurro e olhei, por cima do ombro dele, mais uma vez para a garota que nos observava então encarei Jacob de novo – Não se esqueça de gritar, amor – falei antes de sair rumo a cozinha para ver o andamento do jantar.
JACOB
— Então, Thea... Poderia contar mais sobre você, sobre a gravidez e o motivo de não querer o bebê? – indaguei, percebendo algo de estranho em seu rosto quando ela olhou para o lado, observando a sala.
"Um olho roxo. Será que é o pai do bebê que bate nela? Por isso que ela não quer a criança?" pensei intrigado e minha suspeita se confirmou quando a mesma disse que não gostava de falar sobre a sua vida.
— Não precisa usar os óculos para esconder esse olho roxo. Sou médico, então convivo com isso, às vezes, lá no hospital. Foi o pai do bebê que te bateu? Você tem pais?
— Desculpe, eu não deveria ter vindo.
Theodora se levantou e tentou correr para fora da sala, mas eu a segurei, notando que ela estava prestes a chorar.
— Fica calma. Eu não vou te machucar – pedi e a jovem abraçou minha cintura, meio desajeitada, afundando seu rosto em meu peito, já desabando em lágrimas.
— O que está acontecendo aqui? – escutei a voz do Apolo, então olhei para o lado, pedindo rapidamente que ele trouxesse um copo com água para a nossa visitante poder se acalmar e assim Apolo o fez, com uma cara meio desconfiada, mas fez.
— Me desculpe pelo que houve – ela disse, minutos depois, mais calma.
A mesma se encontrava sentada novamente no sofá, comigo ao seu lado e com Apolo sentado na mesinha de centro, à sua frente.
— Eu que peço desculpas, Thea. Não foi minha intenção te aborrecer, mas eu só queria saber se vamos ter que ficar preocupados com um possível agressor perto do bebê que desejamos adotar – falei e ela me encarou primeiro, depois olhou para o meu companheiro e em seguida abaixou o olhar para as mãos sobre seu colo.
— Não precisam se preocupar, porque o Jaime está preso.
— E quem é Jaime? – Apolo indagou e Theodora o olhou.
— Meu namorado, quer dizer, ex-namorado. O pai do bebê.
— Foi ele que te bateu, Thea? – inquiri.
— Sim, senhor. É por isso que preciso do dinheiro. Quero fugir para bem longe dele.
— Pode nos chamar pelos nossos nomes. Eu sou o Jacob e esse aqui é o meu companheiro Apolo.
Ela assentiu dando um meio sorriso para nós dois.
— Então você ia pegar o nosso dinheiro e sumir com ele e o bebê?
— Não... Apolo. Jaime vai ficar preso por um ano e alguns meses, então daria tempo para eu ter o bebê, entregá-lo a vocês, pegar o dinheiro e ir embora da cidade. Eu posso ser de onde eu sou, mas tenho palavra e não volto atrás, ao contrário daqueles que se diziam meus amigos, mas que são só amigos na hora da bandidagem.
Apolo me encarou com uma expressão que dizia: "Viu só? Eu tinha razão".