15 - O Jardim Morto

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ACORDO COM O SOL ENTRANDO aos poucos entrando pelo quarto, e fico pensando se vou ou não levantar até meu estômago gritar dando o voto decisivo. Hoje eu me sinto, leve, bem, como depois de tomar um banho em um dia quente.

Desci do mesmo modo que acordei e fui para a cozinha tomar café, hoje é sábado então vou poder fazer tudo com calma... Meu pai estava lá em um dos bancos altos da bancada, arrumado e terminando de comer. Daí eu me lembrei do emprego novo.

— Bom dia — digo indo em direção a geladeira.

— Bom dia, eu vou chegar tarde — falou, bebendo o resto do café. — Conseguiu ler aquele livro?

Ele falou em um tom debochado, por isso não entendi o que ele quis dizer. Peguei uma jarra de suco de laranja, fechei a geladeira e me virei.

— Qual livro?

— O pequeno, marrom e dourado.

— E por que não conseguiria? — perguntei colocando o suco em um copo.

— Porque está em outra língua, ora.

Eu quase derrubei tudo no chão.

Não, não está.

Ele piscou atônito com o tamanho da minha certeza e deu um sorriso sarcástico.

— Bom, se estamos falando do mesmo livro, está sim. Nunca consegui entender sequer uma palavra. — Ele dá de ombros, se levanta, e vem até mim me dando um. — Vou indo, qualquer coisa me liga, tá bom?

Ele me dá um beijo no topo da cabeça, e se vai. Eu fico perdida em pensamentos, e aquela sensação boa parece que vai se esvaindo...

Quando me viro para ir guardar a jarra, e começo a beber o suco do meu copo me deparo com Samael em pé num canto. Suas mãos estavam escondidas dentro dos bolsos da calça jeans, ele estava vestindo uma blusa de malha fina branca com mangas até os pulsos. Embaixo dos seus olhos marcas escuras de cansaço apareciam, e ele parecia até incomodado com a luz da manhã, com os olhos entre abertos.

Decido por fim ignorá-lo, abro a geladeira e guardo o bendito leite.

Samael se apoia na geladeira tentando entrar no meu campo de visão de novo.

— Não vai me falar o que aconteceu depois que eu saí? — a voz estava mais baixa que o normal.

É sério isso?

— Se estivesse preocupado, não teria me deixado sozinha naquela situação — falei ácida.

Eu realmente fiquei mal com isso, me senti abandonada em um navio sob ataque. Dou uma olhada rápida pelo balcão da cozinha e vejo alguns doces da padaria que tem aqui perto, dou um sorrisinho escondido quando vejo um sonho, pego um e começo a comer.

— Eu fiquei tão nervoso quanto você, só que eu não sou do tipo que fica gritando. — Ele tira as mãos dos bolsos e cruza os braços sobre o peito.

Isso foi uma indireta?

— Ah, é mesmo? Tudo bem, e o que quer saber? Se eu saí voando por aí? Se eu dei conta sozinha quando acordei e você não estava? — Apontei para mim mesma. — Eu estou ótima. É, eu dei conta, e muito bem por sinal. E você?

Certo, eu me exaltei um tantinho. Ele ficou espantado por um momento e depois fez uma careta que piorava conforme eu falava mais.

— Trabalhando, como sempre... E você não precisa gritar... — Ele franziu o cenho.

Eu estava falando alto, sim. Mas gritando não. Só que aí eu comecei a gritar.

— EU ESTOU GRITANDO? EU NEM PERCEBI, JÁ QUE EU SOU DO TIPO QUE GRITA QUANDO ASAS RASGAM AS MINHAS COSTAS!

De Cara Com A MorteWhere stories live. Discover now