O clima era quente e chamuscante, cinzas flutuavam e rodopiavam ao meu redor conforme eu me movia. As labaredas alcançavam o teto e eu era obrigado a franzir o cenho, sentindo a presença de quem eu procurava mas não enxergando.
Então ouvi as chamas crepitando e escutei resmungos. Alguns escombros começaram a se mover e eu fui até lá, tirando os pedaços de madeira que desceram das paredes e tetos.
Uma pessoa levantou.
Era um garoto de uns onze anos vestindo um casaco bege muito chamuscado, com o cabelo completamente bagunçado e alvoroçado.
Ele ergueu-se com alguma dificuldade, de costas para mim, até que tropeçou de onde se levantou.
Tropeçou no seu corpo morto.
Travei minha mandíbula, frustrado; havia cinco pessoas no prédio, todas saíram a tempo, menos ele, soterrado pelos escombros e abafado pelas chamas, ninguém o viu ou escutou.
Eu o segurei pelo ombro, o garoto se assustou, virando-o para mim e então erguendo a cabeça para me ver — ele era baixinho, batia abaixo do meu peito.
Ele não estava propriamente assustado e sim confuso.
— Matthew — o chamei, desviando sua atenção do seu cadáver. — Vou te tirar daqui, certo?
Ele concordou, segurei em seu braço e o mundo desvaneceu sob nós por um instante. Surgimos, então, do outro lado da rua, barulhos de sirenes e a luz forte do prédio que virou uma fogueira iluminava a cena; bombeiros tentavam apagar o fogo e os moradores que fugiram tossindo fumaça e eram acolhidos pelos paramédicos.
— Pera, não tô entendendo nada — ele murmurou e apontou para o prédio. — Estávamos lá e agora estamos aqui.
Era sempre difícil ter que explicar, adolescentes eram os piores. A maior parte das almas simplesmente iam sozinhas, mas algumas ficavam presas aqui, e eu tinha que recolhê-las.
Enfiei as mãos nos bolsos e suspirei, me preparando para escutar e responder. Antes eu simplesmente carregava correntes de um ferro que fora banhando nas águas prateadas do paraíso que prendiam as almas, as capturava a força e as levava embora.
Tinha me cansado de tudo, não me importava mais.
Depois dela, entretanto, eu agia diferente.
— Aquilo que eu tropecei era uma pessoa? — ele voltou a falar um tanto gago. — Como que eu tô inteiro? Lembro que caiu um monte de troço em mim e senti o fogo me queimar... — Matthew cerrou o cenho— E você não parece bombeiro.
Sorri, eu vestia uma blusa cinza de gola alta com jeans desfiado e um sobretudo preto.
— Não sou bombeiro, sou Samael, o anjo da morte. — Eu me ajoelhei diante do garoto que me ouvia atento. — Você morreu, Matthew.
As pessoas costumam ter todos os tipos de reações, mas a dele foi surpreendente.
— Você tem asas?
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De Cara Com A Morte
Teen FictionAnjos e demônios existem. E você descubrirá isso junto comigo. Um simples sonho, simples e misterioso. Um sonho com a Morte, o anjo da morte na verdade. Mas eu não sabia disso até ele aparecer na minha escola e me dizer que a minha morte estava pró...