Capítulo 04 - Conhecendo o inimigo

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— Pai atrasado? — Ela sabia dos boatos que circulavam sobre o pai que fez chorar por conta do filho atrasado. Uma grande mentira, na verdade, e estava ciente de que a partir do momento que o boato era referenciado por Manu tinha mais a ver com sarcasmo que dúvida.

Fez uma pequena careta, mas não findou o diálogo.

— Pelo contrário. O primeiro problema do dia se deu com uma mãe tão pontual que chegou cinco minutos mais cedo do que eu — Característica que geralmenteRafaella considerava muito boa.

— E desde quando isso é motivo de irritação para você? — A amiga de Kalliman expressou, dessa vez por uma confusão real.

Desde que conhecera a presidenta do Conselho tinha por certo que ela amava as pessoas disciplinadas. O que tornava a criatura que a mineira se deparou uma exceção?

Para Manoela, a começar pelo fato de que parecia ter despertado a fome de guerra no coração de quem nunca semeou outra coisa que não fosse a paz.

— Desde que ela decidiu que seria uma boa ideia não só estacionar o carro em minha vaga, mas também ser extremamente mal-educada comigo — A menor escutou com atenção o que foi dito por sua amiga, mesmo assim teve que respirar fundo. Como dizer a alguém tão perfeita na maior parte do tempo que estava equivocada em sua irritação?

— Se me permite dizer... — Aquele frase assombrou a mineira, mas mesmo assim ela interrompeu sua amiga — Acho que você leva muito a sério as convenções. Tudo bem que há vaga para o diretor, para o professor e conselheiro, mas se alguém estacionar em uma delas não há motivo para ficar com cara amarrada — Manu não acreditava nesses tradicionalismos. Achava isso uma perda de tempo.

— Em partes eu concordo. Pensando bem, se ela tivesse exposto seu ponto de forma educada eu até poderia ter aceitado, mas senti nela um tom de deboche que simplesmente me fez perder o meu sentido das coisas — E Manu bem conhecia uma Rafaella fora do justo e do paciente. Não era uma coisa divertida, e não porque Rafa ameaçava agredir alguém, mas sim porque a possibilidade de destroçar seu desafeto com suas palavras quando estava irritada era enorme.

— E com perder o sentido das coisas você quer dizer não falar obrigada e por favor ao fim das frases? — Era outro ponto que Manu gostava de levantar. A mineira era do tipo que dava longos discursos ao falar e, mesmo assim, conseguia não dizer uma única palavra feia.

Era admirável, mas as vezes também assustador. Como ela conseguia brigar com alguém e permanecer no auge de sua postura?

— De que lado você está? — A dona de casa quis saber por fim. Adorava Manu em todos os seus jeitos, andados e posicionamentos, mas a capacidade crítica de Manu em certos casos às vezes deixava-a sem ação.

Na maioria das vezes a paulista estava correta, mas isso não impedia Rafa de se sentir um tanto impactada com a mulher de 1.53 de altura.

— Do seu, sempre. E é por isso que peço que reveja suas prioridades. Porque é mais fácil permanecer irritada com uma mulher que mal conhece por um motivo tão torpe quando o seu marido continua insistindo e terceirizar as responsabilidades do casamento para você? Será que não é o caso de começar a pensar se não está tentando encontrar alguma estabilidade nesse caos que é o Santa Judith porque as coisas não andam bem em casa? - Manu questionou, deixando sua amiga um tanto sem palavras.

Talvez fosse Gavassi, em toda a escola, a única pessoa capaz de colocar Rafa exatamente nesse estado, coisa que a mineira no geral amava, mesmo que por vezes pudesse ser sufocante.

— Imagine se estivesse no lado contrário... — Ironizou a mineira com falsa irritação, fazendo Manu sorrir por conhecer o gênio da sua amiga.

Nem sempre as pessoas conseguiam dizer o que queriam e como queriam a Rafaella, pois, muitas vezes aquela mulher conseguia ser demasiado intimidante, portanto, ao se rodear de pessoas a castanha sempre buscava quem fosse assim, destemido e que falasse o que pensa, assim como era Manoela Gavassi.

Quando chegaram a porta da sala as duas se despediram, Manu com uma animação contagiante para voltar e Rafa com a promessa de que refletiria acerca do que sua amiga disse.

Só havia um problema com aquela promessa. Como qualquer uma, elas poderiam ser facilmente quebradas.

Pois, mesmo dando a entender que pensaria Rafaella não se deu ao esforço. Isso significava ter que revirar os acontecidos antes da Senhorita Andrade e reconhecer que Rod não estava colaborando no casamento. E mais... que casamento de um só era solitário e desgastante.

E não queria pensar em desgaste, porque essa palavra lembrava outra com a mesma letra de início e um final nada feliz.

Rafa pensava que casamento era para vida toda. E, ao menos por aquele dia, não quis pensar que era diferente. Assim, a mineira decidiu por todas as suas energias em seu trabalho, não conseguindo, no entanto esquecer de todo os conflitos que dividiam o espaço em sua mente.

Por uma ordem puramente baseada em temor prefiriu dar vazão aos seus pensamentos relacionados ao primeiro problema do ano letivo: Senhorita Andrade. De onde viera? Quem era seu filho? O que fazia?

A curiosidade ameaçou quase mata-la provocando que Rafaella agisse num impulso tão grande no intervalo das dez que, quando se deu conta, estava diante de Jaime, o secretário pessoal do diretor Alexandre e responsável por organizar e manter toda documentação da escola.

— Bom dia Jaime — A mineira disse num tom baixo, observando como o coreano a escutava, mas permanecia ignorando — Pyong — Chamou e, dessa vez, ele atendeu.

— Em que posso ser útil? — Perguntou o rapaz ficando de pé para receber a presidenta.

Rafaella sorriu. Era evidente o quanto gostava de ser respeitada.

— Você poderia checar para mim os novos registros de pais? Especificamente os que matricularam os filhos no primário? — A mineira pediu e o coreano começou a checar os arquivos do computador.

— Alguma finalidade específica? — Indagou o rapaz enquanto buscava a informação nos arquivos milimetricamente organizados.

— Não ainda. Estava pensando em organizar uma acolhida. Você sabe, como o Gabriel quebrou a perna na época das reuniões pré-anuais eu não tive tempo de ter o contato de sempre com os pais mais novos e, estava pensando, que para recuperar o tempo e estabelecer o vínculo necessário seria bom que eu ao menos cogistasse um encontro — Mentiu Rafaella. Antes uma inverdade bem elaborada que uma verdade injustificada. Como explicaria a Jaime que, na verdade, estava curiosa para descobrir sobre a Senhorita Andrade.

— Aqui. Prontinho! — O secretário falou, apontando na tela uma ata com, pelo menos, quarenta novos nomes e pelo menos cinco mães com Andrade no nome.

— Você conseguiria, por um acaso, abrir os registros individuais para mim? — Se havia chegado até esse ponto queria ir muito mais longe.

— Poder eu até poderia, mas não sei se tenho autonomia para isso, por mais que seja uma ordem sua — Expressou o homem coçando seus cabelos escorridos. Ele tinha razão, se o diretor descobrisse aquilo e não caísse na desculpa de Rafa isso poderia gerar problemas para Jaime.

— Você tem razão. Mais tarde eu conversarei sobre isso com o Diretor Santana e, com a devida autorização, retornarei para fazermos nossas buscas — Prometeu Rafaella, fazendo menção de sair da sala, mas não sem antes deparar-se com Alexandre.

— Por qual motivo a senhora Kalliman precisa de uma autorização?...

Sim teremos participação de alguns participantes da edição. Quem vocês gostariam de ver sempre por aqui? Algum nome em específico?
Quem vocês não querem ver de jeito nenhum?

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