2 _ Indecentemente angelical

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Louise

— Onde está meu batom vermelho? — Perguntei procurando pela minha penteadeira. — Aposto que foi a Lola quem pegou. — Acusei rindo e minha mãe segurou a risada.

— Lola jamais faria isso. — Ela defendeu brincando.

Olhei para dona Lola e ela estava com as mãos na cintura. Vestida com sua enorme e pomposa camisola e balançando seu leque colorido.

— Eu não peguei nada, Louise. — Se defendeu séria. — Sou uma dama honesta. Me ofende sua desconfiança. — Fez bico triste.

Alguém ouvindo de fora até acreditaria na inocência de uma senhorinha meiga de cabelos brancos. Entretanto os finos lábios completamente borrados de vermelho vivo à denunciavam.

— E esse biquinho vermelho? — Zombei e ela gargalhou saindo da personagem.

— Ainda estou em forma, não estou?

— Uma verdadeira dama do teatro. — Respondi beijando sua bochecha e ela me olhou vaidosa. — Pode devolver meu batom agora, por favor?

Ela sorriu e me estendeu o que eu queria. Passei o batom cuidadosamente nos meus lábios grossos e olhei dona Lola de relance.

— Vem até aqui! — Chamei e ela correu saltitante como uma criança. Nem parecia que já tinha oitenta e seis anos de idade.

Tirei a bagunça que ela havia feito na boca e passei certinho. Ela olhou encantada para o espelho, fazendo caras e bocas.

— Ah, eu também quero. — Dona Rose pediu aparecendo na porta do meu quarto.

— Agora você arrumou para a cabeça, minha filha. — Minha mãe brincou me fazendo rir.

Passei rapidamente em dona Rose que se juntou com Lola na frente do espelho. Vesti minha meia arrastão e coloquei minhas amadas botas negras de camurça de cano longo.

— Acha que Adam vai gostar dessa cor? — Rose perguntou.

— Ele vai amar é tirar esse batom. — Lola respondeu maliciosa, deixando a amiga constrangida.

— Meninas, comportem-se! — Minha mãe advertiu e elas sorriram. Depois ficaram cochichando uma para outra.

— Já vou indo! — Contei e as duas correram para me abraçar. Depois minha mãe beijou meu rosto.

— Boa sorte! — Desejou triste.

Minha mãe não gostava dos meus trabalhos, não por preconceito, mas porque achava que eu merecia mais da vida. Entretanto como precisávamos do dinheiro para manter nosso asilo, ela não reclamava. Os gastos eram altíssimos para conseguirmos dar conforto à todos os cinquenta e dois idosos que abrigávamos, principalmente porque no início os familiares se dispõe a ajudar, porém com o passar do tempo param. E o pior, nunca mais visitam os parentes. Na maioria das vezes abandonam os próprios pais. Lamentável!

Eu uni o útil ao agradável. Sempre amei dançar, e o fato de dançar tirando a roupa era algo bem menos vulgar do que esperado. O Club onde eu trabalho há três anos é tranquilo, nunca tivemos nenhum grande problema. Eu e as outras meninas fazemos o show enquanto a platéia bebe animada. Ninguém pode tocar em nós, o que torna tudo melhor.

Meu segundo emprego é como acompanhante de luxo, e diferente do que muitos pensam, eu apenas acompanho mesmo. Muitos executivos de mais idade me contratam apenas para figurar em suas festas caras e outros me pagam para desabafar.

— Vamos jogar baralho? — Senhor John me chamou e eu beijei a testa dele.

— Amanhã eu jogo. — Respondi e ele me olhou murchando o sorriso. Ele amava jogar a valer. Mas como minha mãe não permitia dinheiro, apostávamos uvas. E como ele joga mal, eu sempre dou minhas uvas para ele. Provavelmente era isso que ele estava se lamentando.

— Que maravilha! Se Louise não vai jogar então não vou perder. — Senhor Lourenço comemorou me fazendo rir. Ele sempre ganhava dos outros quando eu não estava. Eu suspeito que ele rouba.

— Até mais, minha filha! — Senhor Tom balançou o lenço branco se despedindo de mim. Era um doce senhor romântico, adepto de leituras clássicas. Foi ele quem me fez gostar de Shakespeare.

Avistei Adam contar algo aparentemente engraçado para um grupo de senhoras e todos acenaram para mim. Provavelmente teríamos uma cena de ciúmes de Rose. Eu não acredito que irei perder isso.

Segui para a rua e o vento forte da noite me atingiu em cheio. Peguei o bondinho e desci na porta do Club mais movimentado de Mônaco.

— Boa noite, meninas! — Cumprimentei e todas lançaram sorrisos animados para mim, respondendo em seguida.

— Sabe quem está aqui hoje? — Lea perguntou e prosseguiu antes que eu tivesse chance de chutar a resposta. — O piloto delicioso, Nicholas Taunay! — Contou abanando o rosto com as mãos. — Tomara que ele me escolha para uma dança particular.

— É claro que vai. Ele não é louco de resistir ao charme dessa loura fatal. — Respondi e ela sorriu olhando no espelho, ajeitando os seios no vestido vermelho para ficarem mais atraentes.

— E você conseguiu resolver aquele assunto? — Perguntou séria e eu suspirei.

— Ainda não, mas tenho fé que vou conseguir.

— Vai sim.

Agradeci pela força e fui até a arara para pegar a fantasia de anjo. Tirei a minha roupa e vesti rapidamente.

— Dois minutos para entrar no palco. — Jules gritou nos assustando. Tirou um lenço do bolso e secou a careca lustrosa de suor. — A casa está cheia, meninas. Arrasem!

— Pode deixar, chefinho. — Concordei e ele me olhou de cima à baixo e arqueou a sobrancelha.

— Cadê as asas do anjo?

Arregalei os olhos e de repente todo mundo começou a procurar as benditas asas no camarim. Mas nada.

— Ninguém sai daqui antes dessas asas aparecerem. — Ele ameaçou impaciente.

— Achei. — Mila falou no mesmo instante e Lea e eu a olhamos desconfiadas.

— Onde estava? — Questionei e ela deu de ombros.

— Caída atrás da cadeira. Vocês são muito desorganizadas.

Jules lançou um olhar aliviado e me ajudou rapidamente a colocar. Lea e eu subimos no palco em seguida.

Entrei no ritmo da música enquanto a platéia mista gritava animada. Notei Lea vestida de diabinha dançar olhando fixamente para um homem, provavelmente Nicholas, por quem ela tinha uma queda. Aliás, queda não, um penhasco mesmo. Ele era famoso por ser piloto de fórmula 1, porém pelo que eu sabia sempre ficava em segundo lugar.

Dancei tirando a saia branca e rebolando lentamente do lado contrário da minha amiga Lea. Várias notas de euro começaram a cair no palco. Fazíamos movimentos sincronizados até ficarmos apenas de calcinha e sutiã. Se algum cliente quisesse ver o show completo tinha que pagar por fora, uma apresentação particular.

Lea correu até mim e meneou a cabeça na direção de Nicolas.

— Olha, amiga, ele está falando com Jules! Com certeza quer uma dança particular. — Comemorou eufórica e eu sorri cúmplice.

Jules então fez sinal em nossa direção. Ela sorriu e começou a andar na direção deles, porém ele fez sinal para ela parar e apontou para mim.

Lea petrificou no lugar e eu olhei chocada para Nicolas, ele me encarava fixamente com um sorriso de canto de boca. Jules repetiu o sinal impaciente e eu olhei para minha amiga que estava de cara fechada ao meu lado.

— Sinto muito, Lea! — Falei sincera e ela cerrou a mandíbula. Correu inconformada de volta para o camarim.

Suspirei pesarosa e segui para onde Jules estava, pois ele estava quase indo me buscar.

Quanto Cu$ta O Amor Where stories live. Discover now