I22I - Trincada

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Esgotada. Era assim que eu me sentia enquanto Kaydor, um dos únicos subordinados amigáveis que eu conhecia do Lobo, me escoltava até o seu salão subterrâneo de ossos.

Mesmo depois de ter me dado algumas horas para tratar meus ferimentos, eu sabia que o Lobo estava furioso. Tinha infringido a primeira regra que ele havia me posto e o conhecendo mesmo que tão pouco sabia que ele em hipótese alguma deixaria isso de lado.

Era como havia me dito: A tentação é o pecado dos ingênuos.

Sim, eu havia sido estúpida por acreditar na esperança do meu coração e pensar por um segundo que poderia escapar sem consequências. Por sorte ou nem tanta assim eu tinha adiado ao máximo minhas represarias a entrar na inconsciência logo depois de ver Jhulia desaparecer em segurança.

Mas cá estava, tão acabada por falta de palavra melhor que tinha até esquecido de agradecer Kay por ter retirado as lascas de madeira das minhas mãos e as enfaixado com cuidado.

- Obrigada. – Falei tardiamente, assim que paramos em frente a grande porta em arco de madeira, marcada tão profundamente por garras que quase se via seu interior.

Ele assentiu, balançando os cabelos vermelhos. Um relapso de memória me lembrou de outra pessoa e então daquela caixinha novamente: Ele não foi lhe ver quando foi escolhida por que estava morto.

Tentei afastar aquele pensamento, Kay não era Kiros. Tentei manter a caixinha presa novamente no fundo do meu coração, mas ela lutava firmemente para ganhar seu espaço. E por mais que eu tentasse contê-la suas amarras estavam se soltando lentamente.

A porta foi aberta.

Vesti minha máscara e caminhei a passos curtos para o salão vendo o Lobo sentado despojadamente em seu trono.

Seu cabelo estava completamente solto sem ter nada de feminino nisso, caia jogado em seus ombros como cortinas negras e brilhosas, um belo contraste para os olhos luminosos. Ângela estava deitada aos seus pés, como uma concubina maldosa. Elikham também estava no salão, encostado a lateral do trono observando tudo com seus olhos verdes e indiferente.

Kay se ajoelhou ao meu lado e outra vez me recusei a fazer o mesmo recebendo um olhar de desaprovação de Ângela.

- Posso saber o que me deu a honra de ser convocada por você? – Perguntei, quando ninguém falou nada.

- Mestre, o chame de Mestre, sua ratinha sem modos. – Ângela corrigiu, a ignorei.

Uma sobrancelha foi arqueada para mim.

- Se fazer de boba não faz parte do seu charme Aysha. – O Lobo acusou, seu tom levemente irritado. – Mais uma vez me desobedeceu, dou-te liberdade uma vez e você escapa. Isso não ira acontecer novamente. – Prometeu.

Eu não podia ficar calada diante daquilo.

- Liberdade? Você me levou para ser uma isca, quase morri uma segunda vez por sua causa. – Repliquei seu tom.

- Não a mandei ir sozinha atrás do ogro. – Disse, acrescentando com muito acento. – Você tomou essa decisão.

Porque ele tinha se recusado a ir atrás da ameaça mais iminente e claro que no momento não sabia o quão bons eram os patrulheiros de Miticovia. Eu só rezava aos deuses antigos que Hansel ficasse bem, afinal por minha culpa ele tinha se machucado.

Olhei para Elikham, lembrando-me de algo que vinha martelando minha cabeça desde que eu havia recobrado a consciência.

- Na floresta... – Hesitei, respirando fundo. – O que aconteceu? – Perguntei.

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