I57I - Traidor

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Abri a boca para chamar seu nome, tão descrente em minha visão que quase não acreditei. Kay estava parado na curva do corredor com bochechas coradas, deixando mais do que claro que havia sido um espectador.

- Como veio parar aqui? Te machucaram? - Perguntei, me afastando de Raymond para poder respirar. - Você está bem?

Da última vez que vi Kay ele havia sido capturado por Ângela, usado como refém para que eu perdesse um desafio feito pelo clã de licans selvagens que Raymond comandava, depois ele fora levado por Ulrik e novamente usado como uma isca. Se eu acreditava ter má sorte, Kay sem dúvidas possuía o dobro de azar.

- Oh, ele está. - Disse Raymond, o velho sarcasmo lustrando sua voz. - Diga o que seu mestre deseja.

Senti minha testa franzir com a declaração, ele não podia estar se referindo ao...

- O Lukoi me pediu para levar Aysha até um dos quartos. - Falou, os olhos castanhos encarando o chão.

- Você está trabalhando para o Lukoi? - Perguntei, não me importado em esconder a decepção em minha voz.

Eu genuinamente acreditava que Kay era uma das melhores pessoas que eu já havia conhecido, ele tinha me defendido sem hesitar, tratado dos meus ferimentos sem esperar nada em troca e principalmente, havia sido gentil comigo. Fosse pela sua personalidade inofensiva ou por sua aparência inocente, eu sentia uma grande vontade de protegê-lo. Mas saber que ele trabalhava para o Lukoi, isso, mudava tudo.

- O Lukoi não saberia tão bem dos nossos passos se não tivesse alguém para conta-los. - Disse Raymond.

Kay encolheu os ombros e inesperadamente se pôs de joelhos no chão.

- Eu sinto muito! - Falou.

Respirei fundo.

- Levante-se, vamos fazer o que o Lukoi deseja por enquanto. - Falei, depois me virei para Raymond. - Nós vemos no jantar?

- Não faça nada imprudente.

Sorri de lado.

- A prudência nunca me caiu bem. - Falei.

- Aysha...

- Prometo que tentarei.

Nos separamos e fomos por caminhos opostos. Kay me levou para um andar superior, com janelas amplas nos corredores de pedra onde eu podia ver outras alas do castelo. A neve continuava caindo lá fora, forrando tudo com um perfeito manto branco.

- O que está ganhando com isso? - Perguntei, quando ele parou para abrir uma porta.

- Nada.

- Não minta para mim, Kay.

- O Lukoi prometeu que me tornaria dominante. - Respondeu, soltando o ar. - É tão errado desejar não ser mais um saco de pancadas? - Perguntou, olhando sobre o ombro para mim.

Lembrei do dia que nos conhecemos, da forma como Raymond o tratou, literalmente esmagando-o e de quando Ângela o subjugou facilmente, do medo que ele sentia ao se referir a ela.

Seria hipocrisia minha dizer que eu não entendia seu desejo, tantas vezes fui machucada por ser fraca e mesmo agora quando eu acreditava possuir poder o suficiente, me encontrava diante de um inimigo mais forte.

Precisamos de mais, precisamos de tudo. A caixinha... não, a Liones em mim clamava.

E onde iriamos parar assim?

No topo, sem ninguém para nos machucar.

Balancei a cabeça tentando ignorar os pensamentos conflituosos em minha mente.

VermelhoWhere stories live. Discover now