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CHARLIE — 1944 — ENGLAND

Encarava minha mãe colocar a mesa do jantar em completo silêncio, não tinha palavras pra explicar o que estava acontecendo, tinha certeza que ficaria desesperada e a última coisa que gostaria agora é deixá-la preocupada.

Os olhos verdes de Alex se mantinham fixos na mesa se juntando ao meu silêncio, os pratos sendo colocados na mesa pareciam barulhentos com nossas bocas fechadas, me sentia culpada por tomar essa decisão, mas eu queria que todos simplesmente entendessem que não posso desistir ou abaixar a cabeça pra pessoas que acham certo apoiar a supremacia branca defendida pelo eixo por questões econômicas alegando falsa paz, simplesmente não posso.

— Vocês dois não passam um segundo sem discutir — minha mãe parou ao lado da mesa com as mãos apoiadas na cintura — o que aconteceu?

- Só tive alguns problemas no trabalho, mãe... Na verdade estou sem fome.

- E você, Alex?- ela desviou o olhar pra ele

- Só estou cansado.- ele deu de ombros

Ela soltou seu usual suspiro descontente mostrando que não acreditava em nenhuma palavra nossa, comemos rapidamente e eu subi as escadas até meu quarto, encarei o teto por longos minutos ainda pensativa, depois desse tempo escutei algumas batidas e assim que virei o rosto na direção do barulho, encontrei Alex encostado na porta com os braços cruzados me encarando.

- Eu sei que está bravo comigo- me sentei

- Vai muito além de bravo. - Ele fechou a porta atrás de si e se aproximou- estou furioso, decepcionado, assustado, porque você pode não saber, mas eu sei como termina essa história.

- Eu sei o que aconteceu com seu pai e que talvez realmente seja certo dar as costas pra isso, mas eu não consigo.

- As vezes eu queria que tivesse um pingo de egoísmo em você...

- Eu não vou te obrigar a ficar, Alex.

Gostaria de ter alguma ideia do que se passava na cabeça dele, me surpreendi quando ele se abaixou pra ficar na minha altura e apoiou uma das mãos na minha perna ainda olhando fixamente nos meus olhos.

- Mas eu vou ficar não importa o que aconteça.

*

A semana se seguia tensa, todos os olhares no jornal estavam sob mim por saberem das ameaças, me ofereceram exílio fora da Inglaterra e em algumas cidades do interior, mas eu ainda tentava escrever minha nova coluna que falaria sobre Paul, não poderia deixar ele morrer assim, toda vez que olho minhas anotações sobre ele começo a notar como a vida é frágil e rápida e apenas no piscar de olhos tudo acaba sem saber se tem um depois, ou aquilo é um fim.

No final do expediente, eu saía do prédio e assim que olhei para os lados senti alguns olhares sob mim, antes que eu voltasse pra dentro senti uma mão segurar meu braço, assim que ergui o olhar assustada pude encarar Alex me levando em passos apressados pra longe dali, antes que eu conseguisse dizer alguma coisa entramos numa cafeteria, ele olhava para os lados de forma cautelosa e por fim me encarava.

- Eu sabia que eles viriam atrás de você, pelo menos agora sabem que está comigo.

— Como assim? Você conhece essas pessoas?

Ele soltou um longo suspiro parecendo nervoso e logo pegou dois cafés indo até a mesa ainda olhando para os lados com cautela.

— Não me respondeu — Insisti

— Um deles, Alois Schindler, é marido da minha tia, foi ele que me ensinou a atirar, mas assim que começou a guerra mostrou esse lado... Eu tenho tanta raiva por ter considerado ele da minha família.

Por um momento continuei o encarando, eram tantas informações que eu mal conseguia processar direito.

— Você acha que poderia conseguir que eu falasse com ele? Talvez eu o convencesse...

— Charlie, não tem conversa com essas pessoas — revirou os olhos — deveria agradecer por não terem feito nada — voltou a olhar para os lados — e é muito estranho eles terem desistido facilmente assim.

Senti uma falta de ar no momento, Alex se aproximou de mim e me ajudou a sair da cafeteria, era como se houvesse um nó me impedindo de respirar, até finalmente parar.

— O que foi isso? — Ele perguntou

— Não sei — o encarei — parecia um nó, uma angustia... Como se eu estivesse perdendo algo.

— Perdendo algo?

Na mesma hora todas as peças se encaixaram, ergui a cabeça de forma brusca pra encarar Alex e segurei em seus ombros.

— Eles estavam aqui, mas talvez eu não fosse o alvo.

Aos poucos ele raciocinou e entendeu perfeitamente o que eu queria dizer.

— Anabeth...

Assim que paramos em casa, vi uma das portas abertas, antes que eu entrasse Alex segurou meu braço apontando pra fechadura quebrada, ele pegou uma madeira que estava jogada no chão e passou pela minha frente, entrei com cuidado ao seu lado e caminhamos até a cozinha, a comida estava completamente queimada, desliguei o fogo finalmente me direcionando até a garagem onde ela costurava, assim que acendi a luz senti meu corpo pesado demais pra aguentar e cai de joelhos.

— Mãe! — A segurei — mãe, vai ficar tudo bem— passei a mão em seu rosto frio — por favor, vai ficar tudo bem, fala comigo...

Alex se abaixou ao lado de seu corpo ensaguentado colando os dedos em seu pescoço erguendo o olhar pra mim em seguida fazendo um sinal negativo com a cabeça em seguida.

— Temos que sair daqui, agora! — Me puxou

— Eu não posso deixar ela aqui — Tentei me soltar — temos que ligar pra ambulância

— Charlie, me escuta — segurou meu rosto — você sabe que não adianta, mas não vai mudar nada se ficar aqui pra morrer também, então me deixa te ajudar, porque mesmo que você me odeie depois, não vou te deixar aqui.

Ele me puxou pra fora da garagem, fazendo uma ligação pra polícia e subiu correndo até o quarto colocando todas as nossas roupas em uma mala, tudo parecia um pesadelo, o pior deles, era como se eu finalmente entendesse o quão cruel é a realidade e assim que olhava pra expressão fria no rosto de Alex o entendia cada vez melhor: nada continua o mesmo quando se está numa guerra, porque ela irá arrumar um jeito de te matar ou matar algo dentro de você.

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socorro tô me sentindo abandonada voltem pra mim enfim capítulo bad sorry mas faz parte

MERCYOnde as histórias ganham vida. Descobre agora