Capítulo 47 (FINAL)

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Daniel entrou no quarto com o olhar focado em mim, cumprimentando Bruce com um aceno discreto, respondido na mesma medida por meu irmão. Não consegui encará-lo, estava machucada de todas as formas que poderia vir a mente e mais perdida do que nunca, vê-lo naquele momento só aumentava a intensidade do que havia acontecido. Sentia como se todo esse tempo fosse envolto por algum tipo de farsa. Não tinha a ver com seu passado, se fora tão ruim quanto Zachary disse, só cabia a Daniel me contar e se quisesse, mas o nosso presente já era outra história. Uma história quase arruinada.

- Preciso avisar o médico que você já acordou. Volto depois. - Bruce sorriu para mim e saiu, deixando-me sozinha com Daniel.

Eu não tinha o que falar, na verdade não tinha nada de bom para falar, apenas os fatos amargos. Ele sentou cuidadosamente numa das poltronas, a mais distante, e só nesse momento percebi a tala gessada que pegava do cotovelo e chegava a contornar os dedos de sua mão direita. Ele baixou a cabeça enquanto o observava de soslaio. Eu não sentia como se precisássemos dizer alguma coisa.

- Me perdoa. - Daniel disse baixo, mas num tom firme, ainda sem olhar diretamente para mim. - Eu... Eu sinto muito por tudo, Heather. Pelas coisas que disse para você e pelas coisas que aconteceram naquela madrugada.

Naquela madrugada?

Cerrei os punhos, tendo a impressão de que ainda não estava bem o suficiente para qualquer esforço. Um incômodo afetava o final das minhas costelas, na lateral esquerda e ainda me sentia sonolenta.

- Você sente muito mesmo depois de todas as chances, Daniel? - Franzi o cenho enquanto escrutinava suas feições que só me lembravam meus sentimentos pisoteados. - Você não sente nem a metade do que eu sinto pelas palavras vazias e pelas coisas que nem sei se foram verdadeiras!

Ele respirou fundo, apoiando a mão boa próxima ao joelho enquanto mantinha a outra suspensa.
- Eu sei que não, e é por isso me sinto pior ainda, Heather. Porque metade de tudo isso eu deixei acontecer e sequer passei pelo o que você passou, não posso nem absorver a sua dor. - Ele meneou a cabeça lentamente, virando o rosto para o outro lado, voltando a encarar o chão. - E ainda tem essa... Essa dor que me corrói porque eu sei que, independente da decisão que tomar, estará certa. O que eu sinto, o quanto o amor por você me consome, já não faz diferença.

Meu lábio inferior tremeu, enquanto franzia o cenho. Como ele poderia ter coragem de me falar sobre amor quando quebrou uma das bases?
- Decisão? Sobre o que? Agora eu tenho direito a alguma escolha, Daniel?

- Sobre nós dois... - ele murmurou, me encarando por um milésimo de segundo no qual evitei absorver o impacto seguro de seu olhar.

- Mal sei o que aconteceu. Eu passei por momentos horríveis, onde a cada segundo eu implorava para que pelo menos uma parte minha saísse ilesa. - Ofeguei, apertando o pano entre meus dedos como se o alívio de cada palavra impulsiva tornasse a sensação menos ruim. - Tudo dói. E eu sinto que não restou nada, Daniel.

Ele fixou o olhar sobre mim, cerrando a mandíbula com força enquanto dor e cansaço dominavam seu semblante, de modo que pareciam fazer parte de alguém que por um instante se tornou desconhecido. Daniel entreabriu os lábios, mas som nenhum saiu, fazendo-me desistir precocemente de ouvi-lo enquanto, por um favor do universo, a porta se abria. Um homem alto e de cabelos grisalhos, feição calma e usando jaleco entrou com uma prancheta em mãos. Permanecemos calados enquanto ele vinha em minha direção, checando a agulha presa em meu braço que levava a bolsa de soro.

- Boa noite, Heather, sou Phill Gunter, o médico responsável pelo seu tratamento. Como está se sentindo?

Limpei a garganta devagar, observando seus procedimentos rápidos, como se fizesse um check-up clínico.
- Sonolenta, fraca e... Dolorida.
Ele abriu um pequeno sorriso, anotando algo na prancheta e me encarando em seguida.
- O efeito dos sedativos ainda se faz presente, por isso a sonolência e você precisa de repouso, passou por situações muito estressantes então não há nada de mais em querer manter-se quieta. E deve.

The 2 Of Us - Livro 1. Duologia The 2 Of Us.Where stories live. Discover now