Capítulo 1

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"Mas eu tenho mais sorte na minha cabeça."
- This Side of Paradise (Hayley Kiyoko)

Respirei fundo e mordi com força meu trêmulo lábio. Chovia muito, e o cheiro de morte impregnava em minhas roupas me sufocando. O reverendo dava o sermão aos poucos presentes naquele enterro.

- *Não há família que possa escapar dessa dor, a que parece ser a mais aguda de todas as dores. O luto. Algum dia, todos enfrentarão a dor que lateja na alma e devasta nossas vidas. Enterrar alguém que amamos, ser privado do convívio com tal ente, não é fácil. Mas há consolo para aqueles que choram, sabem que há esperança, pois sabem que Cristo já venceu a morte.

Ela já estava fraca antes mesmo da doença, não era a mesma pessoa ainda que fingisse ser. A tuberculose tomou conta muito fácil, e assim vieram infecções e hemorragias. Mesmo o melhor médico, do melhor hospital, não conseguiu salvá-la, porque ela simplesmente não deixou.

Wanda estava ao meu lado e sua mão apertava a minha de maneira reconfortante. As lágrimas escorriam sem cessar pela minhas bochechas e a dor no meu peito só aumentava desde que recebi a notícia do falecimento de minha mãe.

Os únicos raios de Sol eram tão fracos que eu podia jurar que estava anoitecendo. Eu consegui imaginar o lugar antes de se tornar um cemitério, provavelmente quem passasse por ali, sentia calafrios. Eu sentia calafrios. Sentia também um abandono e um grande vazio.

Flores estranhas e quase sem cor dominavam os túmulos abandonados e as árvores pendiam com seus galhos, como se fossem dar o bote a qualquer momento. E davam, levando toda a esperança de quem perdia e enterrava seus entes. Nem a área além dos limites do cemitério conseguia superar a paisagem, era o começo de um pântano; alguns pássaros cantavam por lá, mas pareciam mais pedidos de ajuda.

Louis estava aos prantos do outro lado da cova, enquanto Stephan e Rick davam duro para cobrir o caixão de forma decente. Seus guarda-chuvas estavam jogados ao lado da lápide, os meninos estavam ensopados. Ainda era possível ver a silhueta do reverendo caminhando com seu guarda-chuva em direção a capela e, mesmo fazendo aquela cerimônia de forma monótona, me sentia um pouco mais reconfortada pelas suas palavras.

Não era fácil saber que eu não a veria mais sorrir; não era fácil saber que dali em diante eu estaria praticamente só; não era fácil aceitar que minha mãe estava morta, mas eu teria de me conformar. Eu não podia fazer mais nada. Nunca pude. O máximo que estava ao meu alcance eu fiz: estive ao seu lado, retribui todo o carinho que eu havia recebido durante meus 23 anos e me fiz de forte em meio aos acontecimentos que mudaram aos poucos e drasticamente nossas vidas.

Quando os garotos terminaram de cobrir o caixão, Louis pôs, gentilmente, um lindo buquê de lírios sobre o túmulo. Rick pegou as pás e jogou-as na mala do carro, e quando voltou, deu uma última olhada para a lápide que continha as seguintes inscrições: " Suzan Colbert. Mãe e Guerreira. Para sempre em nossos corações. 1967-2015".

- Adeus, titia.

Com as mãos na cintura, ele admirava o buquê; seus olhos castanhos e seu nariz estavam avermelhados. Coloquei a mão em seu ombro e o acariciei, na tentativa de confortá-lo. Rick sentia muito e tanto quanto eu, pois mamãe o acolheu como um filho quando tia Flery faleceu em um acidente. Bruce e eu perdemos nossa tia, mamãe perdeu sua irmã, mas Rick perdeu a mãe. E agora eu sabia como era.

O abracei por um longo tempo. Ele era mais alto, então encostei minha cabeça em seu peito e assim ficamos. Deixei as lágrimas rolarem livremente por meu rosto, como se assim pudesse alcançar algum consolo real e, não a vontade de desabar de vez. Rick sempre foi sensível, mas neste momento me abraçava e tentava me tranquilizar enquanto continha seu pranto. Quando eu o soltei estávamos mais calmos e, com certeza, mais próximos do que nunca.

The 2 Of Us - Livro 1. Duologia The 2 Of Us.Where stories live. Discover now