Vol. 21

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Todo o salão fora tomado pelas feras aladas. O embate estava deflagrado entre os acólitos da Cidade Escarlate e as criaturas que conclamei. Em meio à batalha Vishal gritava o nome de seu irmão quase como que em desespero. A imagem das criaturas aladas lhe passou uma sensação estranha, como se Kalisto estivesse presente. Na verdade, estava. O primogênito de Hanna havia burlado a morte definitiva, se unindo a mim.

As feras o evitavam fazendo com que Vishal investisse em vão contra o ar, em sua tentativa infrutífera de abater as ameaças aladas. Parecia invisível aos olhos das feras.

Me ergui em meio a metamorfose. Alguns asseclas investiram contra mim, sendo prontamente repelidos. Os instintos me conduziam à Vishal. Mesmo tendo dito que não haveria controle por parte de Kalisto, sabia que o meu ímpeto estava diretamente ligado a ele. A mesma força que me impediu de decidir entre o meu pai e Damra me conduzia até Vishal. Teria que aprender a conviver com Kalisto, uma vez que ele habitava os meus instintos de sobrevivência. A adrenalina que navegava pelo meu corpo ativava o poder que havia herdado, quando cravei meus jovens caninos em sua jugular.

Caminhava, ignorando o aglomerado, quando avistei Hanna indo ao encontro de meu pai, abrindo a gaiola que o mantinha cativo e fugindo com ele.

Fitei Damra que também viu as ações de Hanna. Com um simples pensamento, induzi uma das feras aladas a romper as grades da gaiola e libertá-la. Em alta velocidade, Damra cruzou o salão sobre nossas cabeças indo ao encontro de Hanna.

Deveria ser rápido. Comecei um pequeno trote e neste momento Vishal notou a minha chegada. Invocando sua forma bestial, partiu ao meu encontro. A fera acelerou sua cadência e sob suas quatro patas cruzou o salão. O choque causou um grande estrondo, abrindo um clarão. Medimos nossas forças ali mesmo. Vishal levava uma ligeira vantagem, uma vez que ainda não havia me acostumado com esta nova forma, mas pesada, com asas. Precisaria aprender a utilizar seus recursos em pleno combate, mas para isso esperava que Kalisto pudesse me ajudar.

Vishal cravou seus dentes em meu braço. O lobo apertou sua poderosa mandíbula pressionando meus músculos e como um cão, sacolejou a cabeça forçando ainda mais a mordida. Naquele ritmo meu braço não duraria muito. Subitamente, sem que eu mesmo pudesse esperar, espinhos brotaram do meu braço forçando Vishal a recuar. O lupino avançou de novo, sendo impedido desta vez pelos esporões das minhas asas. Repetidos movimentos perfuraram o seu corpo.

Vishal tocou ligeiramente nos ferimentos. Ele conhecia aquele ataque. Soube de alguma forma que seu irmão estava por perto. 

Instintivamente abri os braços, fechando-os em seguida com as mãos palmadas em sua direção. Uma chuva de criaturas aladas desceu sobre ele.

- Adeus irmãozinho! - A voz de Kalisto se misturou à minha.

Vishal me encarou sem acreditar, momentos antes de desaparecer sob o ataque das criaturas aladas.

Imediatamente minhas asas se expandem e com um giro veloz, parti rumo ao encontro de Hanna. Não demorou muito para avistá-la. Estava com o meu pai sob a lâmina de sua adaga. Damra mantinha-se a distância, impotente diante da cena. Pousei ao seu lado. Nossos olhos se cruzaram e sua expressão mudou, vendo-me naquela aparência. Algo dentro de si sabia o que aquilo realmente significava.

- Para trás! - Hanna gritou pressionando a lâmina contra o pescoço do meu pai, que debilitado não tinha forças para reagir.

Diante daquele impasse percebi que era tudo ou nada.

Damra fez menção em avançar, mas a contive. Recolhi minhas asas e tentei negociar uma rendição sem mais derramamento de sangue.

- Você precisa reconhecer que acabou Hanna. - Alertei.

TRAGO (2017) - LIVRO (COMPLETO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora