Capitulo 14.

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Eu acordei sem saber onde estava. A única coisa que eu lembrava era de estar deitada no colo de Ian, mas não sabia dizer se ele tinha me levado pra casa ou não. Com a maior dor de cabeça que já senti na vida, abri os olhos e descobri que estava em casa. No meu criado mudo estava meu café da manhã, ao lado de uma rosa vermelha e um bilhete:
Se você acordar antes das 16h, saiba que temos encontro marcado na casa de Gabriel.
Se não acordar, saiba que estamos brigados.

Sentei na cama e comecei a apalpar os lençóis feito doida, procurando meu celular. Quando encontrei, vi as horas. 14:30, eu ainda tinha tempo. Involuntariamente, abri um sorriso.
Me levantei da cama num pulo e ao dar de cara com o espelho, tomei um susto. Eu estava horrível, os cabelos soltos e embaraços criaram um ninho que eu não sabia como desfazer, eu ainda usava a roupa do ballet e parecia mais um panda que uma pessoa, por conta da maquiagem exagerada e borrada nos olhos.
Tomei um banho de longos quarenta minutos e resolvi descer.
- Bom dia - falei, ainda nas escadas.
- Ola, princesa. - Minha mãe me deu um beijo na bochecha quando encostei no balcão.
- Bom dia, Lisa.
- Olá papai. - Dei a volta no balcão e lhe dei um abraço, pegando uma rosquinha de morango.
- Onde vai arrumada? - Ele perguntou
- Ipanema.
- Desde quando você vai para Ipanema?
- Vou sair com o Ian.
- E eu posso saber quem é Ian?
- Levei ele ao baile ontem.
- O conheceu onde? - A sobrancelha de meu pai estava arqueada, coisa que ele fazia apenas quando estava bravo.
- Essa é uma história engraçada.
- Eu tenho um ótimo humor.
- Somos amigos, pai.
- E Pedro? Eu deveria esquecer o escândalo que a senhorita fez no baile?
- Bom, nós não namoramos mais, então Pedro não tem que opinar nos meus amigos.
- Não gosto de você andando com gente que não conheço.
- Eu já sou bem grandinha pra saber me cuidar.
- Você é minha filha, Lizzy.
- Eu sei, papai. Marice, pode me informar as horas?
- Três e quarenta e cinco.
- Ih - Falei, engolindo meu café - Preciso ir, tchau tchau. - Comecei a correr. - Qual motorista está de serviço hoje?
- Fernando, aproveite e peça desculpas a ele por ter te esperado por horas aquele dia. - Minha mãe disse
- Pode deixar, mãezinha.
Entrei no carro e avisei Fernando que iria pra Ipanema, não me esquecendo de pedir desculpa pelo dia que eu resolvi sair com um estranho.
- Tá tudo bem, senhorita. - Ele respondeu.
Às vezes eu invejava o modo o qual minha mãe escolhia nossos funcionários. Marice estava conosco desde que eu era um bebê, Fernando e Jorge, nossos motoristas, eram novos no serviço, mas muito competentes e educados.
- A senhorita já passeou por esse parque? - Fernando perguntou, quando passamos em frente ao Jardim Botânico.
- Não... moro aqui tem anos e nunca nem entrei.
- Deveria, é muito bonito.

                                  ****
A melhor coisa de não ser mais um alcoólatra é não acordar de ressaca. Acordei com a campainha tocando, então deduzi que Gabriel não estava em casa.
Quando abri a porta, os olhos mais bonitos do mundo me encararam, me fazendo me sentir a pessoa mais feia do mundo, porque sem camisa e coque mal feito eu não era nada muito bonito de se ver.
- Olá.
- Quatro em ponto.
- Entra.
Lisa entrou, estava de short, uma blusa branca e chinelos de dedo. Os cabelos presos e as olheiras indicavam que ela estava de ressaca.
- Achei que estragava o cabelo prendê-los molhados.
- Não tive tempo de secar...já que alguém disse que brigaria comigo caso eu me atrasasse. E eu não queria que você brigasse comigo. - Ela disse, brincalhona.
- Não? - Eu parei na frente dela.
- Não. - Ela sorriu, e eu coloquei meus braços ao redor de sua cintura, me aproximando.
- Não não, eu só te beijei ontem porque estava bêbada, Ian Castelli. Estou sóbria e não tenho a mínima intenção de ter um romance com você. - Ela falou, sorrindo como se não tivesse acabado de quebrar meu coração.
- Lisa...
- Qual é, Ian - Ela tirou meus braços dela. - Não estrague isso. O que vamos fazer hoje?
Eu ficava sem reação em a cada palavra que ela falava.
- O que você quiser. - Falei.
- Eu quero conhecer o Jardim Botânico.
- O bairro?
- Não, né, o parque. Vamos?
- Peça um uber.
Enquanto Lisa pedia, fui ao quarto colocar uma camisa e, me encostando na porta, percebi que não aguentaria aquilo por muito tempo. Ela era confusa, desorientada e até bipolar, e eu não tinha forças para lidar com ela. Lisa me lembrava Amora. E lembrar de Amora me assustava.
- Vamos? - Ela bateu na porta.
Após longos minutos em silêncio, descemos em frente ao Jardim Botânico e eu paguei nossas entradas.
- Esse não é o lugar mais lindo que você já esteve? - Ela perguntou, impressionada.
- Na verdade, não.
- Não? E qual é?
- Uma cidadezinha chamada Águas de São Pedro tem meu coração.
- Me leve lá um dia.
- Se você merecer...
- Babaca - Ela me deu um soco no braço, rindo e ajeitando o rabo de cavalo.
Lisa segurou minha mão enquanto passávamos pelas palmeiras do Jardim Botânico. E eu quis que o mundo parasse.
- Me fale de você - Pediu.
- O que você quer saber?
- Tudo.
Ela sorria como criança em parque de diversões.
- Faça perguntas e eu responderei.
- Seu nome completo.
- Ian Samin Castelli.
- Samin?
- Minha mãe tem descendência árabe.
- Legal!!! Lisa Toledo Wengrov, prazer. Irmãos?
- Gabriel e Amora Castelli - falei, engolindo em seco.
- Sou filha única. Idade?
- 22 anos.
- 21. Melhor amigo?
- Não tenho
- Alice Fantine
- Preciso conhecê-la.
- Não deixarei, ela é bonita demais pra aparecer no seu campo de visão.
- Como?
- Qual é, Ian, você se apaixonaria por ela... - Ela sorriu, e eu me perguntei se tem se apaixonar por duas pessoas ao mesmo tempo. - Alice é tudo que não sou.
- Então eu não me apaixonaria por ela.
Lisa soltou minha mão e parou de andar. Olhei para trás e ela estava paralisada, então fui até ela.
- Está tudo bem?
- Eu realmente quero te beijar agora.
- Não estou te impedindo.
Lisa entrelaçou os braços em meu pescoço e me beijou rapidamente.
Ela abriu os olhos, sorriu e segurou a minha mão novamente. E, porra, eu quis transar com ela ali mesmo.
Eu sabia que se segurasse a sua mão, eu ficaria bem, não porque a paixão que tinha por ela me acalmava, mas porque havia algo dentro de mim que biologicamente me conectava a Lisa Wengrov. Então, naquele dia, quando a chuva caiu e o céu entrou em guerra consigo mesmo e ela me odiou por correr com ela no colo em pleno Jardim Botanico, fazendo com que as pessoas nos encarassem e rissem, eu soube. Eu soube que se eu segurasse a sua mão, tudo ficaria bem. Elas não eram um clichê, nossas mãos não se encaixavam perfeitamente, como em filmes e poesias antigas de romance...ela era menor do que eu, nossas mãos tinham tamanhos diferentes e as vezes demorávamos pra encontrar o jeito certo de entrelaça-las, mas unidas, se tornavam a única coisa para qual eu conseguia olhar, a única coisa pela qual eu lutaria. Um emaranhado de artérias, veias, tecidos, pele...e eu me apaixonei por cada célula.

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