Bom amigo

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— Essa coisa tá ligada? Gravando! Saudações, pessoas do futuro, aqui quem fala é Steve Stuart, futuro diretor de cinema! Sejam bem-vindos à L. M. Alcott High de 1985! Vamos conhecer de perto os campeões do passado... Essa tomada não ficou boa. Corta!

Steve, um de meus colegas de classe, foca sua câmera filmadora JVC® na cara de cada um que se faz presente na sala de aula, aproveitando o horário vago para pôr sua peripécia em dia. Apoia a câmera sobre um ombro, e com um dos olhos fechados, filma a todos nós em uma única tomada, agindo como se fosse um cineasta. Segundo o próprio cameraman amador é um registro histórico que irá direto para a cápsula do tempo da escola. Não sei como o garoto magrelo de cabelo cacheado e óculos foscos aguenta carregar aquela pesada filmadora.

Entrevista as garotas que fazem parte da equipe de líderes de torcida, os garotos que são do time de basquete, e os outros, nós, os seres comuns e medianos deste grande Sistema Solar. É um momento de grande distração para todos. 

— Já assistiram aquele filme que tem um robô malvado e um astronauta⁴⁴? — Steve vira a câmera para si mesmo, filmando-se. — Um dia, eu farei filmes iguais àquele... Talvez, no futuro, eu já seja muito famoso e já tenha recebido diversos Oscars® — Steve diz com uma confiança inabalável.

— Você fala como se tivesse entendido aquele filme. Como vai ganhar um Oscar® se nem sabe o nome desse filme! — alguém fala do fundo da sala para Steve e todos riem.

Dou pouca atenção para a filmagem que Steve está fazendo pela sala de aula, pois estou muito entretido lendo o livro que o pastor Carl deu-me ontem à noite, após o meu batismo. É livro muito interessante explicando alguns conceitos bíblicos para aqueles que são novos na fé. Sei que irei tropeçar, cair muitas vezes e me levantar durante essa jornada, porém, não posso desistir. Eu já decidi que serei uma nova criatura daqui para frente. Tudo parece diferente para mim agora.

Steve invade o meu espaço pessoal, e a luz invasiva de sua câmera filmadora faz com que minha visão fique confusa e eu veja estrelas. Pisco os olhos, em seguida, coçando-os. Escondo o meu livro diante dos olhos de Steve e de sua câmera curiosa, empurrando-o para debaixo do espaço da carteira escolar.

— Ei, John Walker, como você se vê daqui a trinta anos? Já sei, com essa aparência de galã, com certeza, você será um astro em Hollywood, não é mesmo?! Já pode me chamar de vidente! O que é isso? Um olho roxo? — Steve dá um desconfortável zoom no meu rosto. — Não acredito que você estava brigando! Será que você continuará no caminho do rebelde sem causa? Só espero que você não deprede mais casas daqui a trinta anos.

Ele gargalha de forma quase cínica, e Jake, como se quisesse parar tal gravação provocadora, coloca a mão sobre a lente da câmera filmadora de Steve.

— Para com essa baboseira, Stuart — Jake diz, de braços cruzados. — Ninguém tem o poder de adivinhar o futuro. Você é a única pessoa responsável pelo seu próprio destino, e não o que os outros falam a seu respeito.

Sinto como se a última sentença de Jake fosse direcionada especialmente para mim. Mas deve ser apenas impressão minha.

— Ah, cara, não toque nessa belezinha. Tive que cortar muita grama para comprá-la. E nada de pôr a mão na lente. Assim vai destruir a minha obra-prima cinematográfica, Benson.

Jake pigarreia, apontando para professora sisuda que está atrás de Steve. O cameraman amador logo fica constrangido e desliga a sua filmadora.

— Steve Stuart, é proibido trazer qualquer equipamento eletrônico para a escola — a professora Donna exclama, muito aborrecida. A boca tensa em uma linha de batom vermelho.

Nós, em uma casca de noz!Where stories live. Discover now