J.A.W.

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Na quarta-feira seguinte, eu já havia conseguido a proeza de decorar o nome de todos aqueles inúteis da minha classe, e cada sala de cada devido prédio. Só não sabia, o nome dos integrantes do grupinho que insistia em manter a atenção fixada em mim. Os nomes destes não me vinham à memória. O que realmente importava era que o ritual tosco de apresentação havia cessado.

Na casa de Robert, as coisas caminham como uma lesma sobre uma folha molhada. Quase não falo com ninguém quando chego da escola — exceto Lucy. Mas nesse caso, é somente para dar bronca nela para não mexer nas minhas fitas cassetes. Faltei toda a baboseira de "acompanhamento psicológico" durante uma semana e para minha grata surpresa, pensei que Susan fosse me dedurar para Robert. De jeito algum cairei no truque dela. Ela deve estar esperando o momento certo para atacar, fingindo-se de "madrasta boazinha". Hunf!

Na aula de biologia, a professora nos orienta a fazer a primitiva tarefa de dissecar sapos. Não acredito que ainda somos obrigados, depois de tanto tempo, a fazer isso. Encaro, com uma imensa vontade de vomitar, o sapo morto, aberto, e estirado sem dignidade alguma diante de mim. Meus outros colegas de classe não se importam em zombar e cutucar o cadáver do anfíbio com seus bisturis. A professora anda até ao quadro e rascunha algumas coisas com o giz, e explica o quão importante é a aula de dissecação. Em outra época, na minha antiga escola, acabei por sentir pena dos sapos que virariam experimentos nas mãos dos estudantes, e soltei-os no jardim da escola. Óbvio que eu fui punido por aquilo, mas não me arrependo do que fiz.

Ao invés de estudar os órgãos do sapo, faço um desenho caricato da professora. Grande boca que dispersa palavras por minuto, e olhos extremamente raivosos. Divirto-me com isso. É uma maneira de fazer essa aula enfadonha correr. Mas, não demora muito para que ela descubra minha pequena travessura ao arrancar a folha de papel de minhas mãos, e sentencie uma frase aos berros para mim.

— VÁ PARA A DIREÇÃO AGORA MESMO!

Sob os olhares de divertimento dos meus colegas, vou para a sala do diretor como a professora ordena. Apanho minha mochila, pondo-a em minhas costas.

• • •

Assim que retorno da sala do diretor — após ter de digerir um discurso para lá de clichê sobre me comportar melhor —, dou-me conta de que a sala de aula encontra-se vazia e vejo-me sozinho cercado por mesas abandonadas por seus respectivos donos. Todos estão no refeitório, divertindo-se a comer hambúrgueres e tomando refrigerantes diet

O refeitório está repleto de alunos divididos em seus devidos grupos. Entrar em um deles nessa altura do campeonato, é praticamente impossível. Como se eu precisasse andar em grupinhos... Acabo por comprar uma lata de refrigerante e um sanduíche natural. Bebo a contragosto o líquido açucarado e enlatado. 

Vou para o lado de fora da escola. Limpo o concreto do banco com resquícios de  folhas secas e sento-me. Já deveria ter me acostumado com o clima e com todo esse cinza que domina os céus, mas acontece que sinto falta do calor do sol, da areia quentinha e do azul do mar.

— Então, você é de Miami?

Um garoto de bandana preta com desenhos de caveira, que se opunha aos cabelos castanhos arrepiados, de olhos escuros e maliciosos, e rosto com espinhas razoáveis sorri para mim. Veste uma jaqueta esportiva, em vermelho e branco, as mesmas cores do time da escola. Era ele, quem me analisava ao longe com seu grupinho, poucos dias atrás.

— Los Angeles — respondo sem erguer minha cabeça para o indivíduo que questionou-me.

— Isso explica a pele bronzeada — disse o garoto de jaqueta esportiva escolar, sentando-se ao meu lado. — Um cara descolado como você não deveria ficar sozinho.

Nós, em uma casca de noz!Onde as histórias ganham vida. Descobre agora