Sentença de um garoto traído

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Se alguma coisa pode dar errado, dará.

É o que eu aprendi com a Lei de Murphy. 

Eu deveria ter percebido que aliar-me ao Billy, era um erro. Que vim morar nesta maldita cidade, era um maldito erro. Mas, fazer Mary chorar pelas cartas anônimas que recebeu, e pelo o que eu fiz à casa dela, era um terrível pecado que eu havia cometido. Consegui magoar a única pessoa que nada tinha a ver com meus inúmeros problemas, e o pior, não a vejo tem muitos dias.

Meu rosto está menos inchado, ainda estou recuperando-me depois surra que recebi de Billy e seus capangas, mas os hematomas ainda estão visíveis. Quando apareci na escola com curativos adesivos nas bochechas e várias escoriações na face, escutei várias vozes a sussurrarem que eu merecia aquilo e muito mais. Que a pessoa que espancou-me merecia um troféu de "herói do ano". Descobri como era mais fácil linchar alguém quando se está cercado por outras pessoas. Fazer um de alvo para se sobressair. E foi isso que Billy fez comigo.

A fatia de bacon com ovos fritos parecem sorrir, enfeitada no prato de porcelana posto por minha madrasta diante de mim. Toco-os, a gordura impregnada na ponta dos meus dedos. Lucy olha-me, calada como sempre, como se a minha pele estivesse esverdeada ou se sobre a minha cabeça houvesse duas antenas salientes. Desvio o meu olhar do dela, a tempo de encarar Robert e seu farfalhar irritante de jornal. O tratamento de gelo cruel do meu dito pai estendeu-se durante toda esta semana. A única pessoa que ainda tenta ser amigável comigo é a Susan.

Abandono o meu café da manhã sem sequer ter tocado nele, direcionando-me ao meu quarto, o corpo inclinado, o olhar focado no chão. Tenho olhado muito para o chão esses dias. Ah, os dias que passei em L.M. Alcott High foram, para resumir de forma delicada, um verdadeiro inferno. Foi como cutucar um ninho de vespas e esperar aflito pelos ferrões, mesmo sabendo que eu não teria chance. Todos na escola odeiam-me de corpo e alma, e não exagero quando falo isto.

Meus dedos passeiam pelo meu cabelo. Tive de cortar uma mecha, por conta de um chiclete mal mascado colado a ele. Aquilo só seria o começo de uma semana infernal repleta de castigos infantis que eu enfrentaria. Na aula de sociologia, quando voltei de uma fatídica aula de ed. física, aonde corremos como idiotas em círculos no ginásio, me deparei com a mesa aonde costumo sentar, cheio de garranchos sobre a madeira branca escritas com caneta permanente. Palavras ríspidas de alguém que preferem-me morto. Sem coragem para continuar encarando aquilo, cobri toda a extensão da mesa com vários folhas de papel que arranquei do meu caderno. Fui obrigado a lanchar trancado na baía do banheiro masculino, pois toda a bendita vez que almoçava no refeitório, viro uma espécie de alvo vivo.

Adentro o meu quarto, fechando a porta. Deito-me na cama, tratando de afogar-me nas canções altas e ensurdecedoras do bom e velho rock n' roll, meu ópio pessoal. Com o dedo indicador, aperto o botão lateral do walkman, aumentando o som dos fones que emanam o Bohemia Rhapsody. 

Preso em um deslizamento, sem fuga para a realidade, e assim como dizia a letra daquela música, assim encontrava-se a minha vida.

Sair da Califórnia foi um erro. Morar em Paradise foi um erro. Fazer amigos foi um erro. 

Eu sou um erro.

Eu.

Sou.

Um.

Erro.

Posiciono meu antebraço sobre o rosto, bloqueando a luz, quando sou cutucado por uma mão que insiste em acordar-me de meu efeito hipnótico.

— John, querido — é a Susan, fitando-me com a sua cara de preocupação —, lembre-se que hoje iremos ao tribunal.

Oh, sim, como eu poderia esquecer! Hoje tenho de comparecer ao pequeno tribunal. Esse anúncio está encravado em minha mente e Robert não permitiu-me esquecer disto por nenhum segundo. Entrou em contato com uma advogada, colega de faculdade, da qual prometeu avaliar o meu caso. E por quê eu vou para o tribunal? Ao que parece, o pastor Carl Marshall queria deixar tudo como estava, mas a esposa dele, Ellie Marshall, resolveu ser mais vingativa e punir-me.

Nós, em uma casca de noz!Where stories live. Discover now