A campainha incessante toca, irritando-me. Logo lembro-me que deve ser o tal voluntário que chegou para levar as caixas com as doações. Droga! O problema é que estou coberto de espuma e com xampu no cabelo.
— Lucy, atenda a porcaria da porta! — grito debaixo do chuveiro, de olhos fechados, retirando todo o excesso de xampu.
A campainha continua com seu som insistente.
— Lucy! — grito outra vez. Certeza que ela está com os olhos pregados na TV.
O barulho cessa. Possivelmente, abriu a porta para o voluntário. Ou para algum estranho. Tapada do jeito que é, deve ter aberto a porta para algum mau elemento e o silêncio do andar de baixo incomoda-me. Visto uma calça moletom e enquanto enxugo meus cabelos com uma toalha, desço as escadas e caminho até a porta.
Para minha surpresa, a porta jazia aberta, e Lucy atendia o voluntário que viera sozinho — ao menos imagino que tenho o recepcionado devidamente, já que nada fala. Bom, não era um voluntário, como dizer, era uma voluntária. Noto que desta vez, ela não calça suas meias listradas, porém, ainda assim a reconheço. Veste um moletom de cor branca, com mangas bastante compridas, com a estampa de um unicórnio cor-de-rosa. A calça jeans completamente desbotada, quem sabe, por mal lavagem. Os cabelos estão presos, amarrados em um volumoso rabo de cavalo. Estampa no rosto, um largo sorriso.
— Ei — olha por cima da cabeça de Lucy e acena para mim. — Sou eu, a Mary Marshall.
— Eu sei quem é você — corto sua apresentação desnecessária. — O que faz aqui?
Lucy deixou Mary plantada sobre o tapete de "boas-vindas", voltando ao programa infantil que ainda passava na TV, sentando-se no chão. Mary balança o corpo para frente e para trás, como se esperasse que eu a convidasse para entrar.
— Sou a voluntária que veio buscar as doações para a caridade — de repente desvia seus olhos que mantinha em mim, focando-os no assoalho da entrada. — A Sra. Susan se encontra?
— Não.
— E o Sr. Walker?
— Viajaram e não sei quando vão voltar. — continuo a esfregar a toalha na cabeça, eriçando meus cabelos. — As caixas estão aqui na sala.
Inclino minha cabeça, e não noto nenhum sinal de carro. Como ela vai levar esse tanto de caixas?
— Sabe, estou virando uma planta aqui fora. Daqui a pouco, terei raízes, folhas e flores.
— Entra — sibilo.
Mary passa por mim, não sem antes, olhar para trás, verificando se havia pessoas transitando na rua. Cobre um lado da face com a mão. Dou de ombros, vendo-a ir para o sofá.
— Então, como você vai levar essas caixas? Carregando na cabeça é que não será, né?
— Jake me prometeu que passaria aqui, assim que acabasse o turno dele na farmácia. Se importaria? — sinaliza para meu tórax desnudo.
— O que tem de errado?
— Não costumo ficar tão perto de rapazes que parecem que saíram de uma capa de revista. Tenho uma reputação a manter. — fica de costas para mim.
Reviro os olhos. Estou em minha própria casa e sequer posso ficar a vontade.
— Tem TANTAS caixas aqui. Seu pai é um homem muito generoso por doar isso tudo.
— Isso porque você não convive com a fera.
Retorno para o meu quarto e apanho uma camisa que estava em cima da cama e visto-me. Caminho até a cozinha, a fim de tomar meu café da manhã. Abro a geladeira e pego o leite. Tomo a liberdade de cortar maçãs e bananas. Coloco os pedaços no liquidificador juntamente ao leite, e trituro, vendo tudo tornar-se uma mistura homogênea cor creme. Até mesmo esqueço-me da garota que encontra-se na sala, assistindo os desenhos animados na TV. Despejo a minha vitamina no copo e bebo tudo de uma vez. Retorno a sala, para ver como aquela garota está.
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Nós, em uma casca de noz!
Genç Kurgu❝Meu avô sempre me dizia, que estranhos são amigos que você ainda não conhece.❞ Uma história sobre amizade, esperança e superação. Nos pensamentos mórbidos de John Walker, aquele seria apenas mais um castigo tedioso onde pagaria por seus pecados em...
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