|5| numbers ✅

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S k y l a r

Ele estava pronto para responder ao que eu disse, mas a voz esganiçada de uma mulher interrompeu-o.

" Se querem falar, saiam daqui. Isto é sítio para ler, e não para falar. " A bibliotecária de cabelo encaracolado e a mastigar uma pastilha, informou-nos.

Encaminho-me para a mesa perto da janela com o livro de romance, e Harry faz o mesmo procedimento que o meu, porém traz consigo aquele tal livro de terror. Ele senta-se a meu lado e os nossos corpos ficam bastante próximos. Só uma pequena linha invisível é que nos separa.

Tiro o telemóvel da minha mochila, e encaixo os fones nele. Meto-os nos meus ouvidos e seleciono uma música da minha lista ao acaso. Comecei a pensar ao som da música se é possível amar alguém que não existe, indiretamente. Só existe dentro de nós. E eu pergunto-me: como é que uma rapariga pode amar algo que não sabe sequer da sua existência? Eu amo a minha mãe e o meu pai, mesmo depois de tudo o que eles fizeram-me. Mesmo depois de eles me terem destruído, eu amo-os. Afinal são as coisas que mais amamos, que nos destroem. É algo inevitável. E eles nem tampouco existem, como eu disse. Existem somente dentro de mim.

A música The Beach dos The Neighbourhood começa a soar pelos meus ouvidos, e eu começo a ler a primeira página daquele livro. Sinto que estou dentro deste livro, sinto-me no corpo daquela personagem, que se encontra tão despedaçado por ser rejeitado por alguém que ama. O motivo de ele estar despedaçado, e com uma dor imensa no seu coração, é por causa de uma simples rapariga. O meu tipo de dor é diferente. Não é uma dor suportável. É uma dor que se alastra por cada membro do corpo e consome-me aos poucos. Algo angustiante e excruciante. E o motivo não é um rapaz, mas sim uma família que sempre me rejeitou. Não daquela maneira direta, mas sim da indireta. Eles nem se apercebem do quanto me magoam só com atitudes. Do quanto me matam por dentro.

Estava tão entretida no meu mundo, um lugar que eu adoro estar, até que o fone do meu ouvido esquerdo é retirado. Obviamente por Harry. Quem mais poderia ser?

" O que pensas que estás a fazer? " Fuzilo-o com os olhos.

" Posso ouvir contigo? " Ele pergunta a fazer beicinho.

" Esse beicinho não vai convencer-me. " Faço uma pausa. Está bem, aquele beicinho até pode convencer-me. Só porque é fofinho, para que conste. " Tudo bem. "

Ele aproxima-se mais de mim, e os nossos braços tocam-se. A linha que nos separava anteriormente, desapareceu. Não que eu esteja incomodada, mas nunca estive tão próxima de um rapaz em toda a minha vida. Não ao ponto dos nossos braços tocarem-se. Ele coloca o fone no seu ouvido, e a sua reação à música não é surpreendente, algo que me fascinou. Pensava que ele iria criticar a música.

" Gostas da música? " Pergunto olhando para o fundo dos seus olhos.

" É a minha música preferida. " Ele sorri e os seus olhos voltam a centrar-se no livro.

Um sorriso estupidamente idiota ganha forma na minha cara, e volto a tomar atenção ao livro de romance que está entre os meus dois braços. Eu e Harry temos muitas coisas em comum. Nunca imaginei que isso fosse possível.

Começo a folhear cada folha, começo a asborver cada letra e também a ficar emocionada, de uma certa forma. Estou com pena do rapaz deste livro. Nada na vida lhe corre bem. Especialmente se esse assunto forem raparigas chamadas Katherine. O quão uma pessoa pode ficar destruída, quando dezanove pessoas te deixam? E mais. E se essas dezanove pessoas, terem o nome de Katherine? Que coisa de loucos.

Duas Metades {HS}Where stories live. Discover now