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Capítulo 1

Haiukan



Yiling — China

Três anos depois

Gosto da quietude do lugar. A paisagem, tirando o mar ao fundo, é um pouco monótona, mas não preciso de variedade. Na verdade, prefiro os padrões. Sem surpresas, sem curvas.

Enquanto  caminho  pelo  terreno  acidentado,  penso  que  essa  deverá  ser  a  última  vez  em  que piso  aqui.  Odin,  o  único  outro  ser  humano  a  quem  fui  leal  além  da  minha  família  e  com  quem trabalho há cerca de dez anos, desde que concluímos a faculdade, terminou o acerto de contas com o passado  dele  e  decidiu  doar  essa  ilha  para  uma  cooperativa  comandada  por Xiao Changze,  um  dos moradores. Assim, não há mais qualquer razão para que voltemos aqui.

Olho  para  o  lugar  onde  ficava  a  casa  de  barcos  que  mandei  derrubar  há  algumas  horas  e penso  em  como  Wen Rouhan  pagou  de  forma  gloriosa  por  todos  os  pecados  dele.  Não  tenho dúvida de que naquela noite em que o deixamos com seus ex-empregados, o maldito sofreu.

Eu  não  sou  de  me  impressionar  fácil,  mas  jamais  teria  imaginado  que  alguém  com  uma

aparência tão pacata quanto Sr Xiao fosse capaz de liderar um linchamento. Acho que ninguém sabe ao certo o que um pai ou uma mãe faria para vingar seu filho.

De  qualquer  modo,  o  miserável  teve  o  que  mereceu.  Menos  um  abusador  de ômegas no mundo.

Destravo meu carro e já estou quase entrando nele quando uma mulher de aparência cansada, mas que acredito que não tenha ainda sequer quarenta anos, cruza o meu caminho.

— Ele não está morto — diz.

Eu a olho por um instante, tentando fechar o quebra-cabeças, mas não custa muito e percebo que estou falando com a esposa de Changze. Eu já a vi de relance algumas vezes.

— Como você sabe? — Pergunto, entendendo imediatamente a quem ela se refere.

— Eu sinto no meu coração. Por favor, encontre meu filho. Eu não durmo direito há três anos. Aqui está uma foto dele.

O ômega,  Xiao Zhan,  foi  um  dos  que  foram  levados  com  uma  falsa  promessa  de  bolsa  de estudo na capital, Yunmeng, e que assim como os outros, desapareceu em pleno ar.

O  pai  dele, Changze,  pediu  ajuda  a  Odin  e  a  mim.  No  entanto,  não  importava  o  quanto procurássemos, não conseguimos rastreá-los.

Isso não é pouca coisa, se levarmos em consideração que Odin é considerado o  imperador da tecnologia  da  informação.  Então,  a  falta  de  pistas  fez  com  que  nós  dois  intuíssemos  o  que  havia acontecido — eles muito provavelmente foram traficados para o comércio sexual.

Eu  poderia  ter  resolvido  essa  dúvida  com  um  telefonema,  mesmo  sem  garantir  que  o encontrássemos vivo, ao menos daríamos aos pais algum encerramento. O problema é que Odin não quis dever mais um favor à minha família depois do que aconteceu com o Sheik.

Observo a mulher. Ela parece esgotada. Morta em vida.

Meu  primeiro  instinto  é  dizer  que  sinto  muito,  mas  que  não  me  envolverei,  mas  há  tanto desespero em seu rosto que acabo reconsiderando.

Pego a fotografia de sua mão e guardo-a sem olhar.

Tiro um cartão do bolso e entrego a ela.

𝕺 𝖒𝖆𝖋𝖎𝖔𝖘𝖔 𝖊 𝖘𝖚𝖆 𝖔𝖇𝖘𝖊𝖘𝖘ã𝖔Onde histórias criam vida. Descubra agora