Capítulo 19

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Não demorou muito para que Karl chegasse e se juntasse a nós. Pelo menos carona pra casa eu tinha garantido com esse passeio aleatório.

Sair com os meninos acabou sendo mais divertido do que eu esperava. Até Damian parou de reclamar depois da sexta latinha. Karl não bebeu, já que estava dirigindo, mas ele nem precisava. Com os meninos, ele era brincalhão e jovial. Não era para menos, os quatro tinham a mesma idade, estavam na universidade e compartilhavam muitos gostos e interesses. Às vezes eu me esquecia disso.

Embora eu gostasse muito de beber, não cheguei a esvaziar mais do que duas cervejas. Ainda estava acuada demais para me deixar ficar alegrinha e correr o risco de aflorar meu lado insuportável. Eles mal me toleravam quando eu estava sóbria.

Karl passou uma lata para Micah e se deitou na areia. O silêncio absoluto reinou por um bom tempo. As ondas quebrando na praia eram as únicas audíveis. Já estava tarde – ou cedo –, e faltavam poucas horas para amanhecer o dia.

— Por que você largou a faculdade? — A pergunta me pegou de surpresa.

Quando o assunto veio à tona, há quatro anos, ninguém nunca me perguntou o porquê. A mamãe só gritou e gritou, me chamando de filha ingrata e irresponsável. Kate já não falava comigo nem quando morávamos na mesma casa, depois da nossa briga, naquele tempo, ela provavelmente não queria me ver pintada de ouro. E Karl me odiava desde sempre, então imagino que tenha sido fácil para ele me chamar e dizer para que me virasse sozinha. Todos pareciam ter aberto mão de mim como se eu fosse um caso perdido. E eu era.

Ainda assim, daí veio todo o meu rancor – que eu esperava diminuísse cada vez mais.

— Vai fazer diferença se eu te contar agora? — Eu podia simplesmente responder, mas não achava que ele fosse entender.

— Não — ele informou o que eu já sabia. — Só estou curioso.

Pensei um pouco a respeito, e cheguei à conclusão de que os motivos não importavam. Nenhuma resposta me livraria das consequências.

Existia sim uma causa para ser uma decepção constante para todos. Uma que chegava a ser ridícula só de pensar. Desde muito nova, sempre fui geniosa. Me frustrava mais, me enfurecia mais. Como um completo exagero errante. Mas não me alegrava mais. Não me satisfazia mais.

Se as últimas palavras que eu ouvi do meu pai não tivessem sido "Fique no seu quarto", eu teria gostado de ter morado em casa, de ter terminado a faculdade, de ter criado laços com a minha família. Porém, ao invés disso, como se o contrário da ordem fizesse me sentir livre, eu saí do meu quarto, corri pelos lugares, fugi para o mundo.

— Porque eu era idiota e fútil — admiti, odiando lembrar das inseguranças que me acompanhavam de perto e que costumavam influenciar todas as minhas decisões. — Ainda sou — pronunciei baixinho para mim mesma.

A conversa mudou depois disso, mas meus pensamentos continuaram tencionando para o passado. Infelizmente a cerveja acabou, porque eu estava considerando ficar bêbada de verdade agora.

Karl levou os meninos em seus respectivos endereços primeiro e depois, em um viagem silenciosa, voltamos para casa. Parecia um jeito melancólico de encerrar o passeio.

Desejei boa noite a Karl, achando que ele fosse se trancar no quarto e capotar. Ele parecia cansado, e também parecia um pouco frustrado, mas talvez fosse apenas minha própria impressão desanimada sendo refletida. Não que eu fosse dizer isso a ele. Perguntar o que o incomodava, oferecer um ombro amigo ou algo do tipo não estava na minha lista de coisas a se fazer.

Mas quem sabe eu deveria acrescentar isso, já que antes mesmo de alcançar a porta do quarto dos fundos o som de tilintar e da geladeira soaram anunciando a presença de Karl ali perto.

Singularidades de um Amor (sem cerimônias) ✔Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon