Capítulo 58

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Seu ombro esquerdo ardia como o inferno. Mas os pensamentos de Lucien tomaram foco quase que instantâneamente, seus ouvidos e a visão apurados para detectar as ameaças ao redor. Quem quer que houvesse atirado aquela maldita flecha não deveria estar muito longe, 60 metros no máximo, para atingir com tamanha precisão. Segurando Elain pela nuca, Lucien a colou ao seu corpo, precisando senti-la próximo a si enquanto continuava a vasculhar o perímetro, o olho de metal rangendo enquanto trabalhava rapidamente.

Não tinha um único momento de sossego nessa porcaria, pensou.

A flecha havia vindo de algum local entre as árvores, logo mais adiante de onde estavam. Aquela porcaria estava ardendo demais e o freixo impossibilitava a cura. Lucien sabia o que deveria fazer, embora fosse sangrar como um porco abatido quando removesse a flecha, precisava retirá-la e cauterizar o ferimento para que cicatrizasse.

Respirando com dificuldade devido a dor, Lucien conseguiu clareza o suficiente para rastrear os sons e cheiros de ao menos duas dúzias deles.

- Maldição. - Murmurou.

- O que foi? - Elain perguntou, assustada.

O movimento que ela fez para olhá-lo fez seu ferimento doer como o inferno, e Lucien gemeu, fazendo uma careta antes de responder.

- São humanos. - Praticamente rosnou as palavras.

Elain tentou se virar para ver por trás de si, mas ele a impediu. Podia ouvir os sons claramente agora, os passos se aproximando. Ao longe, podia discernir os sons da vida cotidiana nos jardins da Mansão. Ao menos não chegaram lá ainda. Deveriam estar a caminho da Mansão quando se depararam com ele e Elain ali. Maldição, se Lucien não tivesse vindo atrás dela, se não tivesse tido aquele momento de fraqueza e dúvida e dor ao vê-la sair aos prantos, Elain estaria sozinha naquela cilada, e provavelmente já estaria morta a essa altura.

No entanto, algo estava fazendo com que os humanos se retardassem. Eles pararam. Os murmúrios começaram.

- Consegue ouvir o que eles estão dizendo? - Elain sussurrou, provavelmente também ouvindo a agitação, graças aos sentidos feéricos. Lucien negou com a cabeça, não conseguia discernir as palavras.

A dor em seu ombro estava piorando a cada segundo, ramificações de agonia descendo por seu peito e deixando seu braço dormente. Ele não podia se permitir cair agora, tinha de protegê-la, proteger sua parceira.

Respirando fundo, Lucien afastou-se de Elain apenas o suficiente para passar o braço direito entre seus corpos, segurando a pena da flecha. Com dificuldade, ergueu o braço esquerdo e o levou à ponta de ferro. Trincou os dentes e prendeu a respiração ao fazer o esforço necessário para quebrar a ponteira e remover lentamente a flecha de seu ombro. Elain o observava com a expressão fechada quando Lucien exalou profundamente, jogando o freixo ensanguentado no chão ao lado deles. Lucien cambaleou uma vez, mas sua parceira o amparou, colocando uma de suas pequenas mãos em seu ombro enquanto a outra o abraçava pelo tronco.

- Você está bem? - Elain parecia genuinamente preocupada.

- Já sofri coisa pior. - Lucien piscou o olho de metal para ela, que sorriu fracamente em resposta.

Os passos dos humanos recomeçaram, e Lucien estava tentando pensar com clareza quando a epifania o atingiu: se a maldita flecha de freixo tivesse ido um pouco mais para a direita, teria atingido Elain diretamente na cabeça, bem no meio do crânio. Ela era o alvo. Estava claro como o dia. O macho olhou para o rosto da pequena fêmea à sua frente, tão concentrada na tarefa de estancar o sangue de seu ombro.

Outra flecha passou zunindo por eles, tão próximo que o silvo da madeira cortando o vento ecoou em seus ouvidos e balançou os cabelos de Elain.

Os invasores apareciam na clareira agora, e puro instinto guiou Lucien quando ele pôs Elain para trás de si, usando seu próprio corpo como escudo entre ela e os invasores humanos. Lucien estava certo em suas contas, ao menos duas dúzias de soldados humanos os encaravam, todos portando arcos com flechas de freixo, o símbolo de Lorde Nolan, pai daquele humano que deveria ter se casado com Elain, pintado em suas armaduras reluzentes.

Corte de Flores FlamejantesWhere stories live. Discover now