Precipitada

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Você mal encostou na comida- Riley me disse.

E você também não- A olhei, nada simpática, não acordei muito bem hoje- Você não come, não se sente bem, foge da mesa, o que está acontecendo?

Não vem pagar de mamãe- Ela enfia uma colher de pudim na boca- Hoje eu tô comendo, não tá vendo?- Disse de boca cheia- E você, não tente fugir da minha pergunta, com certeza foi depois do que Edwin te falou.

Falou que eles vão ter que passar alguns dias fora, e não fazem ideia de quanto tempo será- Bate o punho na mesa- Está satisfeita?

Claro que não!- Ela se levantou depressa e limpou a boca- O Mozart não pode simplesmente sumir, como vai ficar a minha...- Ela se calou antes de terminar a frase.

A minha o que?- Perguntei.

Eu falei errado, como eu vou ficar sem ele, Rebecca, é isso- Me respondeu grossa, e saiu da sala de jantar com pressa.

O que você vai fazer maluca?- Me levantei da cadeira indo atrás dela.

Vou ligar pra ele, afinal, tem que me explicar essa história, não pode me abandonar aqui logo quando mais preciso dele- Lambeu os dedos, e se sentou no sofá, pegando o telefone.

Encarei ela digitando os números que já sabia de cór, ela pôs o telefone no ouvido, e pacientemente, esperou que ele atendesse, porém, depois de muito tempo, rediscou mais uma vez, e outra, e outra, até bater o telefone com força.

Mas que porra!- Cruzou os braços e se recostou com força contra o sofá.

Eles vão aparecer uma hora ou outra, pra quê esse desespero?- Arregalei meus olhos, completamente impressionada com aquela sua atitude infantil.

Por que ele disse que não queria me ver nunca mais- Ela olhou para mim, e pude sentir as lágrimas ferverem em seus olhos- Ontem eu estava chorando, por que ele me tratou como se eu fosse um insignificante objeto nessa casa, não me atende a dias, e eu não sei o que fazer.

Suspirei fundo revirando meus olhos, a Riley ultimamente está muito insuportável, doente o tempo todo, chata o dia inteiro. Eu lembro que ela ficava irritada assim, quando não comia direito, mas poxa, tanta coisa gostosa aqui.

Aquele bolo de hoje, ela meio que obrigou a empregada tirar da mesa, dizendo ela que estava com um cheiro insuportável, que chegava revirar seu estômago, a dando... enjoou?

Riley...- A olhei e fiz um gesto relativo com a mão, logo após, arregalei meus olhos novamente, ergui minha cabeça, e apontei para ela- Riley, você tá grávida!?

Não, não, não!- Respondeu rígida e se levantou- Não vem colocar mais minhoca na minha cabeça- Passou por mim.

Volta aqui mocinha!- Peguei seu braço, e a fiz voltar- Você começou a andar com Mozart, quase um mês antes da festa, e se sentiu mal, justo no dia do baile, e desde então, está nesse enjoo insuportável- Calma Rebecca, talvez você esteja apenas fazendo um mal jús- Você ficou, ou não, com o Mozart?

Você já tá me chamando de quê?- Balançou seu braço, e me olhou ofendida- Quando eu te falei que eu não era mais uma criança, era pelo simples fato de que eu sabia o que estava fazendo. Eu, NÃO, fiquei com Mozart, e, NÃO, estou grávid...

Ela diminuiu gradativamente a sua voz a cada palavra. Começou a chorar e o que eu imaginava finalmente foi confirmado. Ela me abraçou de volta, choramingando igual uma criança.

Eu sinto muito...- Devolvi seu abraço, mas logo eu a soltei- Mas eu te avisei tanto, Riley, e em troca, você me traiu- Nos encaramos em silêncio, até eu decidir continuar falando- Desde que... chegamos aqui, nunca mais fomos como antes.

Eu nunca me senti bem aqui, mas fiquei por sua causa, e ainda estraguei a tua vida- Confessou com o semblante baixo, cobrindo seus braços com as mãos- Eu sinto muito Rebecca, eu não quis te magoar, foi Mozart que me disse, que era o certo a se fazer.

Isso não muda o fato de que ele estava só me usando, se realmente fosse amor, ele teria me mandando alguma carta, teria me ligado, mas não, esqueceu completamente de mim- Sorri ladino forçadamente, não queria ficar lembrando disso- Eu tenho que te agradecer, por ter me salvado dele, ou se não, ainda estaria sendo enganada.

Ela me abraçou, e eu devolvi seu abraço. Ela fez isso pensando em mim, jamais ficaria brava com ela, era só uma questão de tempo, para que eu entendesse o verdadeiro propósito de sua atitude.

[...]

"Foi há muito tempo, mas descobri que não é verdade o que dizem a respeito do passado, essa história de que podemos enterrá-lo. Porque, de um jeito ou de outro, ele sempre consegue escapar."

O Caçador de Pipas - Khaled Hosseini

Não podemos esquecer o passado, principalmente quando ele marca permanentemente nossos pensamentos no futuro- Reflito sobre aquela estrofe.

Tudo que eu lia agora, realmente parecia que estava falando desse momento complicado que eu estou passando na minha vida. Os livros fictícios, nem se fala.

Parece que de tanto ler, de tanto gostar desses livros, eles se tornaram realidade, e vierem direto para a minha vida. A diferença, é que o casamento não é arranjado, e que meu pretendente seja comprometido.

Essas lembranças vão me matar um dia, eu não aguento mais passar os dias inteiros pensando nisso, esta me sufocando, eu não consigo conversar com ninguém.

Eu e Riley acabamos nos afastando, infelizmente, não era pra ser, conversamos e tudo, mas ela gosta de ficar maior parte de seu dia trancada em seu quarto, a distância de Mozart a abalo muito. Queria poder dar uma assistência médica para ela, mas simplesmente não podia. De uma forma ou outra, não habia dinheiro algum em meu nome, não havia dinheiro líquido.

Os dias passavam como se fossem anos, mas na verdade, começaram a se passar meses diante de nossos olhos, e eu, ainda orava para conseguir ver Edwin novamente.

Não recebíamos mais ninguém em casa, acredito ter sido melhor assim, mas a solidão que se formou, não seria qualquer um que poderia possuir tamanha força psicológica para aguentar.

Mas acredito já estar acostumada, era tanto silêncio que quando escutava algum barulho diferente, podia sentir um certo medo. Mas isso era coisa rara de se acontecer.

Já havia rodado todas aquelas estantes de livros, já pude andar por todo esse jardim de pedras, mas era melhor ver cinza, do que a cor das rosas que eu tanto odiava.

Quando me disse que iria tirar todas as rosas que aparecessem no meu caminho, ele não estava brincando.

Fui até o quarto de Riley, queria chamá-la para ver se conseguíamos sair um pouco pela cidade, mas ela recusou, com uma voz triste.

Riley, eu tô muito preocupada com você, me deixa te ajudar- Implerei recostada sobre a porta.

Não obtive resposta, não queria mais incomodar, então saí, ela raramente saia daquele quarto, e todas as vezes, só saia a noite, a empregada já havia se acostumado com aquela mordomia em servi-la em seu quarto.

Eu nunca poderia imaginar que Mozart afetaria tanto o psicológico dela, e também não quero jogar na sua cara que a avisei, quantas vezes eu perdi o sono para poder aconselha-la.

E ela jogou todos os meus conselhos, no lixo.

Um mês, dois meses, três meses, quatro meses. Se passaram cinco meses, e eu ainda não tive oportunidade de ter visto Edwin, a preocupação me subiu, e eu comecei a ficar desesperada.

Será que ele havia morrido?

Tampei a boca andando de um lado para o outro, encarando a porta da sala, eu queria tanto que ela se abrisse e que ele entrasse bem, se isso acontecesse nesse exato momento... eu correria pros seus braços e te diria o quanto eu o amo, diria que o perdou agora, que eu não quero mais brigar, eu não quero que ele suma por mais tempo, e imploraria para que ele me levasse junto.

CONCUBINAWhere stories live. Discover now