011 - Probabilidades

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- Então, como é que ele está? – inquiriu Manon, com uma expressão bastante preocupada, enquanto pousava delicadamente a chávena branca com o seu habitual café com leite matinal.

Aquela questão, já tão esperada pela britânica, fê-la recordar por breves segundos o fim-de-semana, tão intenso, que vivenciara. Thomás havia substituído a sua raiva e revolta por um mecanismo de indiferença e ironia, camuflando os seus problemas e preocupações entre piadas e respostas sarcásticas. Contudo, Charlotte conseguia ver a realidade bastante nua e crua. As noites foram a altura mais complicada. Thomás mantinha-se acordado durante a noite, fazendo algum barulho ao ponto de despertar Charlotte que também estava com um sono leve, receosa que ele fizesse alguma coisa estupida.

- Ele não está nada bem, para ser sincera. – Admitiu, levando a sua mão de forma desesperante em direção à sua franja, puxando os seus fios de cabelo negro para trás. - Foi um fim-de-semana muito difícil, confesso.

- Acho que os pais dele vão ser julgados já no final desta semana. Como é um caso tão falado nestes últimos dias, eles estão a tentar acelerar o processo, mas também já sabemos como funcionam os tribunais... Há sempre imensas burocracias e gasta-se muito tempo também nas buscas por evidencias... - Manon parou o seu discurso para inspirar fundo, encolhendo os ombros. Ela parecia afetada, algo que incomodou um pouco Charlotte que a analisava ao pormenor. A rapariga loira baixou o seu olhar, ficando algum tempo a olhar a sua bebida quente, e finalizou. – Só espero que tudo se resolve rápido e pelo melhor.

- Achas que eles fizeram mesmo isso? – inquiriu Angèle, passado algum tempo, com uma expressão muito séria.

- Eu não sei... - murmurou Charlotte, sentindo o seu coração apertar. Thomás nunca havia dito nada realmente em relação a isso, visto que pouco contributo tinha para aquela empresa, no entanto, também nunca os havia defendido. – Eu nunca o ouvi falar da sua família, nem mesmo antes, por isso...

- É uma situação mesmo complicada... - Angèle comentou, um pouco cabisbaixo.

Ainda que os comentários continuassem, Charlotte não estava propriamente presente no momento. Os seus pensamentos estavam no passado, enquanto que o seu coração fugia para o futuro. O seu dedo indicador constantemente ativava o ecrã do seu telemóvel, apenas para se certificar de que não havia recebido nenhuma notificação de emergência ou algo do género. Thomás havia regressado ao trabalho, mas, depois do que ela vira nos dias anterior, o receio de ele ter um comportamento completamente catastrófico era muito. Charlotte só regressara à realidade quando notara que os seus amigos se começavam a levantar da mesa do habitual café.

Um olhar, repleto de preocupação, recai sobre esta que, infelizmente, só se apercebe tarde demais para disfarçar a sua impassibilidade perante o que a rodeava. Louis aproxima-se de Charlotte, que arrumava a sua roupa para tentar disfarçar o seu atraso na reação.

- Charlotte, Charlotte...

A britânica esboça um pequeno sorriso e, após vestir o seu casaco, sente o braço do rapaz mulato pousar-se sobre o seu ombro. A cabeça de Louis descai para dar um pequeno gesto carinhoso em Charlotte e, enquanto caminham em direção ao atelier, repara que a presença da Manon e da Angèle era cada vez menos sentida, notando que seria propositado.

- Está tudo bem, jolie?

Charlotte assentou com a cabeça, forçando um pequeno sorriso.

- Estou apenas com sono, dormi muito mal porque o Thomás estava com insónias e fazia um pouco de barulho. Mas está tudo bem, obrigada.

- O que é que aconteceu mesmo neste fim-de-semana?

Charlotte arregalou os olhos por breves microssegundos, revendo mentalmente a conversa que haviam acabado de ter, com o medo de ter dado a entender alguma coisa. Ela ponderou contar sobre o beijo, sobre todo aquele turbilhão de emoção que sentira, mas isso iria causar um desassossego horrível e um burburinho e, isso era algo que era não queria de todo. Expor os seus pensamentos e preocupações nunca fora algo fácil para Charlotte, uma vez que ela crescera habituada a uma certa independência e solidão. Além disso, aquilo também não havia significado nada e, por isso, não havia necessidade de debater sobre um erro de momento.

O Desassossego da AlmaWhere stories live. Discover now