Hospício

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    Cecília foi perdida por mim. Posso pensar também que seu corpo perdeu a alma, mas me recuso. Ela ainda está aqui! Ela está aqui! Mesmo sabendo que provavelmente não, sei que o correto seria dizer que sua alma perdeu um corpo.

  Após dois anos de lamento e inexpressividade... Sim, ainda me recordo da casa, me recordo dela ; embora atualmente eu não lembre de muita coisa que existe no meu mundo porque me encontro no cemitério. Fui decretado esquizofrênico. Sei disso porque escuto os enfermeiros cochicharem sobre meus quadros e prosas, sei porque contam estrelas que aqui preso, céu não vejo.

    Embolo minhas falas porque já me perdi nessa carcaça que chamam de corpo, apanho quase todos os dias nesse cemitério de corpos vivos, o que intitulam "Hospício".


  Sinto que não sinto mais. O silêncio causa dor em meus ouvidos e me arde o corpo todos os momentos que me percebo acordado e disposto a ligar A com B.


        Não vejo mais Cecília nem nada que me ligue a ela, até que um enfermeiro adentra a porta e eu grito:


- CECÍLIA!

- Quem?

- Cecília, uma garota com um rabo de cavalo. Ela apareceu por aqui?

- Ninguém veio aqui por você. Agradeça por estar acordado, "escritor".

    O encarei, com a pupila dilatada pelos efeitos da medicação e murmurei; esperei, novamente gritei. Escutei risos e a imagem embasada de uma garota que passava na frente da porta cortava a luz que vinha de frente. Gritei, mas não me ouvi, não havia mais luz, apanharam o sol pra si e esqueceram de mim. Não havia nem A, muito menos B. Não havia mais eu aqui.



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Próximo capítulo: Carta para Cecília, diga a ela que vivo!

O Portador de memórias - Para jovens idososOnde as histórias ganham vida. Descobre agora