As ondas álgidas da brisa daquela manhã de inverno beijavam o rosto e esvoaçavam os claros fios de cabelo da lufana. Quando sentiu o vento permeando sobre as suas bochechas rosadas pelo frio, a menina estremeceu e um suspiro frígido escapuliu de seus lábios.
Naquela manhã, a garota encontrava-se sentada debaixo de uma árvore em frente ao Lago Negro, vestindo os seus trajes unicamente para climas frios e estudando para os próximos testes do sexto ano. A apreensão e a ansiedade viviam consumindo os seus dias, assim como o medo de não alcançar bons resultados no fim do ano.
Em busca de afastar essas sensações, a jovem decidiu estudar para os exames finais todos os dias, sem exceção. Ela adorava ler e fazer as suas anotações ao ar livre, sentia-se mais confortável e menos sufocada como em uma biblioteca cheia de estudantes. O clima nos arredores do castelo contribuía para que ela absorvesse o conteúdo de maneira mais eficiente.
Enquanto virava mais uma página do seu livro de Feitiços, ela escutou o barulho de folhas secas sendo suavemente esmagadas sobre a grama, mas não se importou o suficiente para ser uma distração. Porém, o som se repetiu e os seus sentidos informavam que ele estava ficando cada vez mais próximo da extensa árvore.
— Juro por todas as criaturas mágicas desse mundo que se for você me perturbando, James, eu não penso duas vezes em jogar você nesse lago — sussurrou, fechando os olhos.
— Eu não sou o James, mas não me joga no lago — disse uma voz trêmula atrás da menina. Ela se virou e deparou com Peter Pettigrew carregando livros em seus braços. O garoto parecia desorientado e aflito. — Está muito frio hoje. Por favor.
— Oi, Peter — o humor da menina mudou repentinamente. — O que faz aqui?
— Oi — ele deu um sorriso fraco. — Não vai me jogar no lago? — perguntou, ainda nervoso.
— Não, você não é James me atrapalhando na hora de estudar — ela riu ao ouvir Peter suspirando de alívio.
— Ainda bem — disse o garoto. Em seguida, ele indicou com um aceno da cabeça os livros que carregava com dificuldade. — Posso me sentar aqui com você?
— Claro.
A garota moveu um pouco o próprio corpo em busca de garantir um espaço para ele se sentar ao seu lado embaixo da árvore. Quando o jovem da Grifinória se acomodou sobre a grama, ela visualizou um misto de emoções e sentimentos expressos em seu rosto. Apesar de estar nitidamente aflito e confuso, Peter também parecia um pouco cabisbaixo.
— O que aconteceu com você? — ela perguntou, a preocupação evidente no tom de suas palavras.
— Comigo? — ele gaguejou. — Como assim?
— Você parece estar triste.
— Não é nada — Peter hesitou. Diante da expressão de insistência da lufana, ele não viu uma outra opção a não ser contar sobre o que lhe afetava no momento. — Você promete não rir de mim?
— Por que eu ia rir de você? — ela ironizou.
— Acabou de rir.
— Foi sem querer — ela colocou a mão sobre a boca. — Pode ficar à vontade para me contar o que você quiser.
Ele respirou fundo em busca de coragem.
Via-se perdidamente apaixonado por uma jovem de cabelos ondulados e amarronzados da Corvinal. O amor era uma sensação nova em sua vida, nunca havia amado alguém genuinamente como estava acontecendo nos últimos tempos. O único problema era que o amor havia invadido a sua vida em conjunto com a insegurança de não ser correspondido da mesma forma pela menina.
— Você sabe bem como é a sensação de estar gostando de alguém — Peter desviou a atenção para a água escura do lago. As suas bochechas coraram com a própria frase. — Eu não sei se estou gostando mesmo de uma pessoa e tenho medo de que não seja recíproco.
— Jasmine?
— Sim — ele deu um sorriso genuíno.
— Nós somos amigas, mas não posso falar por ela — disse Ellie, travando os pés sobre as folhas ressecadas no chão. — Você deveria falar para ela sobre os seus sentimentos.
— E se ela rir de mim? — disse Peter com a voz carregada de nervosismo. — E se ela me desprezar na frente de todo mundo? Eu nunca mais iria aparecer nos corredores de tanta vergonha.
— O que é melhor? — ela encarou o amigo ao seu lado. — Remoer esses sentimentos e ficar mal ou contar a verdade para ela e se livrar dessa angústia de uma vez?
Ele mordeu o lábio inferior, pensativo e preso aos próprios devaneios.
— A primeira opção — ele arriscou, tímido.
— Claro que não! — ela exclamou, indignada.
— Desculpa! — Peter se assustou com a exclamação repentina da menina. — Eu sou novo com essas coisas. É difícil para mim.
— Eu entendo você — ela fechou o livro ainda aberto em cima de suas pernas. — Eu demorei para admitir que estava sentindo algo por James que não fosse raiva.
O jovem da Grifinória deu uma risada contagiante com as palavras da lufana.
— A melhor opção é conversar com Jasmine.
— Eu não faço a menor ideia de como chamar alguma garota para conversar — Peter colocou uma expressão desanimada no rosto. — Eu sou um fracasso.
— Você não é um fracasso — ela revirou os olhos. — Por que não chama a Jasmine para um encontro? Nós ainda temos um fim de semana no vilarejo antes do Natal e do Ano Novo.
— Eu tenho vontade de me enfiar em um buraco apenas de pensar em chamar alguém para um encontro — ele cobriu o rosto com as mãos, envergonhado.
— Sirius pode ajudar você — Ellie abriu um sorriso radiante no canto de seus lábios. — Ele é bom em arranjar encontros.
— Alguém me chamou?
A lufana cerrou instantaneamente os olhos com a exclamação.
— O que você falou? — ela perguntou, colocando a mão em cima da orelha. — Eu acabo de ficar surda.
— Eu nem falei alto — Sirius revirou os olhos.
— Apenas alto suficiente para alguém nas Masmorras ouvir — Remus esbarrou de leve em Sirius como uma provocação.
— O que vocês estão fazendo? — James surpreendeu a namorada, apoiando a sua cabeça em seu ombro.
— Hoje é dia de me deixar surda — ela empurrou levemente o garoto para o lado. — Nós estamos conversando sobre Peter e a sua vida amorosa.
O namorado da garota de cabelos áureos deitou a cabeça sobre as suas pernas. A lufana enroscou os dedos da mão direita nos fios bagunçados de James, acariciando os mesmos, e ele abriu um sorriso apaixonado no canto de seus lábios.
— Eles crescem rápido — Sirius disse, forçando uma voz trêmula de choro. — Que orgulho de você, Rabicho.
— Por que ainda não chamou a Jasmine para um encontro? — Remus questionou, cruzando os braços.
— Por medo — Peter gaguejou.
— Por que ainda não me chamou para um encontro? — Sirius encarou o garoto com os olhos semicerrados.
— Nós já tivemos um encontro e você quase colocou fogo no meu cabelo. Eu não vou chamar de novo.
— Aquilo não foi um encontro — Sirius retrucou. — Em minha defesa, o fogo no cabelo foi parte de um feitiço que você me mandou fazer enquanto a gente estudava nesse encontro falsificado.
— Quem estuda em um encontro? — James franziu as sobrancelhas.
— Uma espécie muito rara chamada lupus stranhus — Sirius caçoou. — Mais conhecido como Remus Lupin, o meu namorado.
Um choque súbito preencheu a conversa entre os cinco estudantes reunidos em frente ao Lago Negro.
— Namorado? — a menina exclamou com um tom eminente de animação. — Vocês estão namorando e não me contaram?
— Eu achei que o fofoqueiro do seu namorado já tinha contado para você — Sirius apontou para James com o dedo indicador.
O garoto de cabelos despenteados arregalou os olhos com a insinuação do melhor amigo.
— Quem disse que eu sou fofoqueiro? — James esbravejou.
— Eu — Sirius deu de ombros. — Depois de muito tempo com Remus insistindo em um namoro, eu resolvi dar uma chance e aceitar o pedido.
— Foi você quem pediu — Remus disse, interrompendo o discurso contraditório do namorado.
— Estraga-prazeres — Sirius estirou a língua. — Como você pretende chamar a menina para um encontro?
— Faça perguntas mais fáceis.
— Como você está nesse dia frio, Rabicho?
— Eu disse perguntas mais fáceis, não perguntas mais difíceis — ele ironizou. — É melhor não convidar ela para um encontro. Eu não quero passar vergonha e me lembrar disso pelo resto da minha vida.
— Rabicho — Remus apoiou a mão no ombro do menino. — Você está se subestimando. Jasmine é uma pessoa adorável, ela nunca seria rude com você por convidar ela para um encontro.
— Você já tem a negação — disse James, enquanto brincava com uma mecha do cabelo da namorada. — Agora pode ir atrás da humilhação.
— Você não está ajudando nem um pouco — a lufana encarou James com um olhar de reprovação. — Eu tenho certeza de que ela vai adorar sair com você, Peter. Conheço a Jasmine.
— Merlim ouça você.
Diante das palavras da lufana, o garoto deixou a motivação e o alívio invadirem o seu organismo. Por mais que o receio da rejeição consumisse o seu coração e fizesse o seu estômago revirar dentro de seu corpo, ele encontrava-se determinado a chamar Jasmine para um encontro no vilarejo bruxo.
— Eu tenho aula de Transfiguração em dez minutos — disse Ellie, conferindo o relógio em seu pulso. Ela tentou se desvencilhar do namorado em seu colo, mas James se negou a levantar dali. — James Fleamont Potter.
— Tudo bem — ele se levantou. Um suspiro triste escapuliu de sua boca. — O carinho estava ótimo.
— Não faça chantagem emocional — a menina se levantou da grama e apanhou todos os seus pertences, colocando-os na mochila de ombro. — Você sabe que não funciona nem um pouco comigo.
A garota se despediu do namorado com um beijo rápido, porém caloroso suficiente para causar arrepios em sua espinha. Ela acenou para os outros garotos e caminhou em direção a sala de aula de Transfiguração, a aula seria compartilhada entre os estudantes da Lufa-lufa e Corvinal.
O caminho até a sala de aula era rápido e longe de ser exaustivo. Quando virou a esquina do primeiro corredor ao entrar no saguão do castelo, a lufana estranhou a ausência de estudantes que sempre se apinhavam nos corredores. Um corredor naquela situação era descomunal.
Nada.
Ninguém.
Nem mesmo os fantasmas das casas rondavam aquele corredor.
A garota ajeitou a mochila em seus ombros e continuou a andar pelos corredores com a mínima atenção. Os seus sentidos se aguçaram ao ouvir um estalo atrás do seu corpo, fazendo a menina se virar em um súbito, ao mesmo tempo em que preparou a sua varinha.
Nada.
A velocidade de seus passos se intensificaram, assim como os seus batimentos cardíacos. A apreensão e a aflição a distraíram por um minuto e a menina se viu diante do caminho errado para a sala de aula.
Ela parou a sua caminhada e olhou para os dois lados.
Sem nem mesmo conseguir esboçar uma reação, a garota desabou ao chão, um feitiço excruciante havia atingido as costas dela em cheio e com força.
— Que droga!
Ela rastejou pelo chão de joelhos, não conseguindo se manter sobre os próprios pés, e se virou para encarar quem havia a acertado de forma covarde. A sua visão embaçou e a garota não viu nada além de uma sombra no fundo dos corredores.
Quando observou a sombra turva andando em sua direção com os passos lentos, a lufana arrastou a mão pelo chão em busca da varinha caída. Ela alcançou e preparou a varinha em suas mãos, enquanto procurava focar a sua visão e se levantar do chão frio.
— Expelliarmus! — ela exclamou, girando a varinha com pouca destreza e muita dificuldade.
A sineta tocou e o som rígido invadiu os corredores. A sombra desapareceu do campo de visão da garota da Lufa-lufa e ela sentiu o ódio inundando completamente o seu organismo, deixando-a com o rosto avermelhado e as veias saltadas no pescoço.
A jovem apoiou a mão esquerda em uma das grandes paredes no meio do corredor e esfregou a mão direita em seus olhos, recuperando a visão anteriormente turva e desfocada.
— Senhorita Lupin — ela ouviu uma voz rigorosa e reconheceu a professora de Transfiguração caminhando em passos rápidos até a sua aluna. O tom de preocupação em sua voz e o receio em seus olhos estavam nítidos. — Por Merlim. O que houve?
— Alguém me atacou.
Por mais que a dor execrável causada pelo feitiço inundasse cada canto do seu corpo, a decepção de não ter reconhecido a pessoa responsável por aquele momento de tensão conseguia o maior destaque em seu organismo. A fúria e a decepção conseguiam se sobressair diante de qualquer dor física.