Neutro

By -Tanchi

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Se meter com as pessoas erradas tem as suas consequências. Falyn Lake conheceu um rapaz. E tudo o que ela que... More

notas.
epígrafe.
um.
dois.
três.
quatro.
cinco.
seis.
sete.
oito.
nove.
dez.
onze.
doze.
treze.
catorze.
quinze.
dezasseis.
dezassete.
dezoito.
dezenove.
vinte.
vinte e um.
vinte e três.
vinte e quatro.
vinte e cinco.
vinte e seis.
vinte e sete.
vinte e oito.
vinte e nove.
trinta.
trinta e um.
trinta e dois.
trinta e três.
trinta e quatro.
trinta e cinco.
trinta e seis.
trinta e sete.
trinta e oito.
trinta e nove.
quarenta.
quarenta e um.
quarenta e dois.
quarenta e três.
quarenta e quatro.
quarenta e cinco.
quarenta e seis.
quarenta e sete.
quarenta e oito.
quarenta e nove.
cinquenta.
cinquenta e um.
cinquenta e dois.
cinquenta e três.
cinquenta e quatro.
Tem algum sobrevivente?
quarenta e cinco.

vinte e dois.

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By -Tanchi

A noite chegou mais cedo do que eu imaginava. E apesar de ter passado a tarde toda sozinha a encarar o nada não me senti cansada. Pelo contrário, os meus pensamentos faziam questão de manter-me acordada a pensar e pensar, sem nenhuma brecha para o descanso. Amanhã tentaria andar pela casa, ver se  haviam outros entretenimentos por aí enquanto Greta ia ao colégio.

E pensando nela, não sei porque desperdicei o meu tempo a tratando mal. Ela é uma boa companhia, no final das contas. E ter alguém para conversar nesse lugar é, no mínimo, reconfortante.

Amarrei os meus cachos num coque desajeitado e sai do quarto em direção ao fim das escadas. Alguns minutos atrás Jade havia tido a gentileza de ir até o meu quarto para avisar-me sobre o jantar que eu estaria presente a contragosto. Sou inteligente o suficiente para não ignorar a ameaça daquele homem — com algum problema mental — e ficar no quarto. Seguirei o conselho de Jade que é: não fazer com que ele me odeie mais do que já odeia.

No momento em que cheguei no fim das escadas e apenas vi Greta na mesa a comer franzi as sobrancelhas. Ela já havia notado a minha presença, mas permanecia com o olhar preso na comida no seu prato.

Sentei-me de frente para ela e observei os outros acentos que se encontravam vazios.

— Theron e o seu pai? — perguntei. — Não vão jantar conosco?

Ela finalmente levantou o rosto e encarou-me.

— Não — deu de ombros. — Eles preferiram ficar até tarde na empresa.

— Theron não é novo demais para trabalhar numa empresa? — a pergunta escapou da minha boca antes que eu pudesse, impedi-lá.

Um suspiro pesado saiu da sua boca. Ela não estava feliz.

— Ele é um “prodígio”. O orgulho do meu pai. O garotinho que com apenas três anos já sabia falar francês e outras línguas, que entrou na universidade com catorze anos e o empresário mais bem-sucedido da sua idade — o veneno não passou despercebido na sua voz e em cada palavra. — O homem que eu deveria usar como exemplo para seguir — revirou os olhos.

Não precisei processar mais nada para entender o motivo dela falar aquilo com tanta raiva. O seu pai provavelmente esfregava na cara dela o quanto ela deveria ser como o seu irmão mais velho e com certeza não o fazia de forma bonita.

— Ele sempre me trata como lixo quando estou ao lado dele — meteu um pedaço de carne na boca e mastigou com uma certa intensidade. — E eu não tenho culpa de não ter nascido com um QI fora do normal. Não sou obrigada a saber mais de quatro línguas.

Eu apenas a escutava em silêncio, a servir-me o que tinha na mesa e a vendo despejar toda a sua angústia.

— Eu sou só uma garota de dezasseis anos — adicionou, a levar o copo de água até a boca em seguida. — E a minha vida está longe de ser normal, entende? Ele coloca tanta carga em mim… o maldito já me levou na empresa para trabalhar a força e eu não sabia nada daquilo. Para além do meu sonho não ter a ver em gerir uma empresa jornalística. Eu quero ser uma veterinária, mas é claro que ele não irá deixar porque precisamos seguir a merda do negócio de família. E sinceramente, em que século ele pensa que estamos?

Meti uma garfada de arroz com um molho que não conhecia na boca, atenta ao drama da rapariga a minha frente. Quanto mais informações ela soltasse, melhor. Então, não a interromperia.

— Mas ele já tem o Theron que faz tudo que ele manda — continuo. — Isso deveria bastar, mas é claro que Robert Halstead sempre quer mais. Se não fosse pelo Theron ser um ótimo irmão comigo eu juro que já teria arranjado uma forma de fugir dessa casa — ela parou, de repente e então a sua feição se tornou melancólica. — Sinto tantas saudades da minha mãe. Ela sempre me ajudava a recuperar-me desses ataques de raiva súbita do meu pai e agora… ela não está mais aqui.

Parei todos os meus e uma certa nostalgia atingiu o meu corpo com força. 

Só agora havia reparado que não havia visto uma figura materna nessa casa. A mãe deles havia morrido. Tal como a minha. E eu entendia a dor que transparecia no rosto da garota a minha frente. Por isso pousei a minha mão em cima da mesa para ela segurar e a mesma ficou surpresa pelo meu gesto repentino de afeto, mas não recusou. E apertou a minha mão de volta.

— Eu amava tanto ela — a sua voz se quebrou, mas ela não chorou. — Doeu tanto a perder.

— Não fica assim — a minha voz saiu afetada também. Aquela era o tipo de dor que não se desejava para ninguém.

Ela não falou mais nada e no segundo a seguir soltou a minha mão.

— Eu vou para o meu quarto dormir. Boa noite.

Se levantou e foi embora. A deixar-me só naquela mesa e eu logo entendi que ela queria chorar sozinha. Senti-me mal por respirar de alívio quando fiquei sozinha na mesa. Não me sentia preparada o suficiente para dar algum conselho ou apoio a irmã do homem que me sequestrou, apesar dela não ter culpa e ser legal.

A verdade é que eu não sei como me comportar ao lado dela emocionalmente. Se devo deixar o meu lado bom falar mais alto ou agir de acordo com as circunstâncias que seriam: de forma fria porque não sei por quanto tempo irei ficar ali. E se, de alguma forma, conseguir fugir não quero sentir saudades de nada que me lembre esse pesadelo.

Terminei de comer tudo que havia colocado no meu prato e decidi aproveitar a ausência dos homens que viviam na casa para explorar mais o lugar. Primeiro fui para cozinha — o único lugar naquela loucura que valia a pena — fui para a lavandaria, ginásio, biblioteca e já me sentia cansada. Não imaginei que a casa fosse tão grande. Eles devem produzir dinheiro para ter tudo isso, não é possível. Eu vi coisas que só pensei que veria numa outra vida, quando reencarna-se num outro corpo.

Quando fui para o andar de cima em direção ao meu quarto vi uma porta entreaberta e a curiosidade falou mais alto.

Olhei para esquerda e direita para certificar-me de que ninguém me veria. No momento em vi que a barra estava limpa empurrei a porta e um cheiro familiar preencheu as minhas narinas. Quarto do Theron. Legal.

Ele tinha paredes brancas, armário cinzento, criado mudo, cama casal. Tudo simples. A única coisa que me chamou atenção foi o criado mudo onde havia vários porta retratos. Aproximei-me melhor e peguei num aleatório onde tinha uma mulher de cabelos ruivos e com um sorriso contagiante a segurar um buquê de flores. Ela aparentava estar na casa dos vinte anos naquela altura porque as roupas eram bastante diferentes das de agora, mas a mesma era muito bonita.

Essa mulher era muito parecida com Theron. A versão feminina dele e não precisei pensar duas vezes para perceber que Greta havia levado os traços do pai, mas ainda tinha uma característica da mãe que eram os mesmos olhos, ocre.

Peguei outra e nessa a mesma mulher abraçava os ombros de um garotinho com um sorriso do tamanho do mundo e com um dente em falta. Apesar de odiar Theron e o facto de ter-me trago para aqui, em segredo, permite-me achar o mesmo  muito fofo.

Numa outra foto estavam os dois irmãos juntos abraçados a sua mãe como se ela fosse o mundo deles. E não tenho dúvidas de que era mesmo.

Em todas as fotos eles estavam com os mesmos sorrisos. Com as mesmas expressões de felicidade. E isso porque em nenhuma delas o Sr. Robert estava presente.

Não pude ignorar o sentimento súbito de inveja que senti. Eles tiveram a sorte de deixar marcado com ela todos os momentos que viveram juntos. Sempre que eles sentissem saudade podiam olhar para as fotos e sorrir. Coisa que eu nunca poderia fazer porque a medida que vou crescendo, por mais que não queira, o esquecimento é inevitável. Os traços da minha mãe irão desaparecer ao longo dos anos.

Suspirei e deixei o quarto antes que alguém entrasse e visse-me lá bisbilhotando.

Fui para o meu quarto de modo a tentar dormir e esquecer dos meus problemas por algumas horas e mais tarde, naquele mesmo dia acordei no meio da noite porque me sentia apertada. Tirei as cobertas de cima de mim e fui para a casa de banho. Após deixar-me aliviada lavei o rosto com água fria e voltei para o quarto para tentar recuperar o sono perdido, mas um grito alto escapou da minha garganta no momento em que vi uma silhueta na cama onde eu dormia. A pessoa se levantou no mesmo instante da cama e andou na minha direção. Não tive tempo de gritar mais nada porque as suas mãos estavam na minha boca. A impedir a saída de qualquer som.

— Fica calma — reconheci a voz de Haden que se encontrava baixa e controlada.

Estreitei os olhos na sua direção, a tentar o observar com a pouca iluminação da lua que tinha no quarto.

— Falyn? — congelei no mesmo lugar quando escutei a voz de Theron do outro lado da porta porque pelo olhar que Haden me lançou deixou claro que o mesmo não podia entrar ali agora ou nós dois estaríamos ferrados, de alguma forma. — Está tudo bem? Ouvi o seu grito… posso entrar?

Era a primeira vez que ele tinha a gentileza de perguntar-me isso sendo que o mesmo só abria a porta e entrava. Afastei a mão do homem a minha frente para poder responder.

— Sim. Está tudo bem — falei alto o suficiente para ele ouvir. — Foi só um pesadelo. Não precisa entrar.

Ouvi alguns segundos de silêncio.

— Tudo bem — suspirou. — Se precisar de mim, é só gritar pelo, o meu nome. Tenha uma boa noite.

— Ok— respondi, apática.

Haden e eu ficamos mais alguns minutos em silêncio para ter certeza de que ele já foi embora e quando não se escutou mais nada o mesmo foi se sentar na beira da cama.

— Se precisar de mim, é só gritar pelo meu nome — escutei ele murmurar de forma baixa e debochada, mas ignorei.

— O que está a fazer aqui? — perguntei depois de alguns momentos.

— A pergunta certa é o que você está a fazer aqui. Porque a nova hospedeira é você.

Fechei a cara no mesmo instante. Não estava no clima para as suas brincadeiras ácidas e cheias de deboche.

— Tenho certeza de que você já tem resposta para essa pergunta — cruzei os braços. — Como entrou aqui? — perguntei, me referindo a casa em geral.

— Sou da família — deu de ombros. — Tenho liberdade para andar e entrar onde quiser, e hoje decidi ver como você estava.

— Você disse que não tinha nenhuma ligação com eles — o relembrei, num tom acusatório.

— Apenas com o Theron — devolveu, no mesmo instante. — Nunca generalizei nada.

O encarei em silêncio. Incomodada com o facto de nesse aspecto, ele ter razão.

— Porque veio aqui a essa hora da noite? — interroguei-o.

— É só nessa hora da noite que tenho tempo para fazer algo que quero — ele encarou-me. — Estão te tratando bem? — mudou de assunto.

— Te importa?

Ele levantou-se da cama e parou bem na minha frente. Mantive a minha posição firme e não dei nenhum passo para trás.

— Se não me importasse, não estaria aqui.

—  Haden, os meus sinceros vá se foder — revirei os olhos. — Se você se importasse comigo, teria me ajudado e impedido com que eu viesse para esse lugar porque tenho certeza de que você sabe o motivo de eu estar aqui.

Os seus ombros caíram. Ele parecia incomodado com o que havia saído da minha boca.

— Eu não gostava de você, lembra?

Soltei um riso sem humor.

— E agora gosta? — rebati, incapaz de acreditar nas suas palavras.

— Percebi tarde demais que você não merecia estar aqui — tentou se justificar. — Tentei falar com o filho da mãe do Theron várias vezes para ele desistir de você e procurar outra, mas não deu. Sinto muito, Falyn.

— Procurar outra para o quê?

— Ele ainda não lhe contou? — fez a mesma pergunta que o Sr. Robert e apenas balancei a cabeça em negação. — Desculpa, mas eu não posso.

— Porquê? — perguntei, com a voz agastada.

Porque diabos ninguém quer me contar?!

— Você vai odiar-me mais — deu de ombros, como se a sua explicação fizesse sentido. — Darei toda essa responsabilidade para ele.

— Isso é tão covarde — quase raspei os dentes uns nos outros de tanta raiva e ele riu, sem humor.

— É, eu sei. Ninguém é perfeito.

— Mas você vai além da imperfeição — murmurei e se ele escutou preferiu deixar de lado. Percebi logo que, por mais que eu tentasse ele não iria mesmo me contar o porquê de estar aqui então fiz outra pergunta — Você trabalha para eles?

— Sim — suspirou. — Sou apenas um simples motorista.

— Motorista deles ou das garotas que sequestram? — a minha pergunta pareceu o pegar de surpresa.

— Como sabe disso?

Abri um sorriso sádico no rosto.

— Só irei responder se você também responder as minhas perguntas.

Ele avaliou o meu rosto de forma minuciosa, como se estivesse a procura de algo, como se eu fosse rir e dizer que era apenas uma teoria minha sem sentido. Quando ele não encontrou nenhum sinal de brincadeira falou:

— Só não fale isso na frente do Sr. Robert. Penso que você percebeu que o estado mental dele não é dos melhores — se virou para ir em direção a porta, mas eu segurei no seu braço o impedindo de ir embora.

— Isso eu já percebi, mas…

— Sendo assim. Adeus, já está tarde — me interrompeu, num tom apressado. — Vejo-lhe amanhã a mesma hora que hoje — e antes que eu pudesse o fazer mais perguntas ele abriu a porta e foi embora. A fugir de todas as minhas perguntas.


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