Notas iniciais do capítulo
Alguém quer mais de um Ômega impulsivo e afrontoso? Eu dou!!
— Se acalmem aí, caralho — ele exigiu num tom que Aburame Shino nunca o ouviu falando antes, que foi como um golpe de chibata em seu peito — O jeito do Shino eu até entendo, porque ele é meu companheiro. Mas vocês dois aí se impondo assim eu não aceito. Passei a minha vida inteira tentando fugir de Gin-Io e ser livre para decidir o meu destino. Se eu ficar em Suna, será por uma escolha minha! Não por uma lei estupida dessas. E se acha que pode me obrigar, só tenta. Porque eu vou fugir, quantas vezes for preciso. Ou vou morrer tentando. Nunca mais... nunca mais vou deixar um Alpha me dizer o que tenho que fazer!
O mais surpreendente do ato ousado não foi a falta de reação de Sakabu no Gaara. Afinal, ele cresceu a vida toda sob o regime social de que Ômegas são intocáveis. E já teve que lidar com crises histéricas muito piores do que aquela. Ele era o representante máximo da Vila. Se não soubesse controlar uma conjuntura, não mereceria estar no alto posto.
O inesperado do fato, pelo menos para alguns shifters presenciando a cena, foi o fato das quatro palavras iniciais surtirem efeito. A ordem de um Ômega funcionou como energia de polaridade reversa e anulou a agressividade dos três Alphas. O ambiente se desanuviou, a parte Alpha daqueles homens se recolheu e o racional dominou seus pensamentos novamente.
Enquanto os insetos voltavam para o abrigo sob sua pele, Shino deu-se conta do quase descontrole. Por muito pouco não abriu mão de vez de sua racionalidade e agiu como o shifter que era. Algo que nunca poderia se orgulhar.
Hana forçou saliva pela garganta, tentando engolir algo. Mas a boca estava seca, só conseguiu um movimento incompleto, com um som que soou muito alto aos seus ouvidos. Inverso ao que pareceu o som abafado de algo caindo do lado de fora, muito provavelmente Ino, incapaz de continuar de pé depois do que testemunhou.
— Ótimo — Kiba resmungou, tentando parecer tranquilo. Visivelmente se dando conta de que afrontar o Kazekage foi uma das piores ideias que teve na vida. Mas... ele não era muito de pensar, já estava conformado com isso — Acho que a gente tem que conversar como pessoas civilizadas e resolver isso no diálogo. Sem brigas, sem agressão física, sem retaliação contra Ômegas precipitados... não concordam?
Shino sentiu uma onda de ternura envolver seu coração e aquecer seu peito. Okay, estava irremediavelmente apaixonado por aquele garoto. Não podia mais se fingir de cego ou jogar a culpa toda sobre o reconhecimento feito por sua parte Alpha.
— E-eles realmente se acalmaram — Hana sussurrou — Pensei que nada acalmasse Alphas nessa situação.
— Nada é mais forte do um Ômega em uma situação de desequilíbrio — Gaara explicou enquanto juntava alguns pedaços que papel que caíram sobre sua escrivaninha — Ômegas são o contra ponto perfeito dos Alphas, quanto pior estiver o ambiente, mais efetiva é sua harmonização.
— Mas... em Gin-Io os Alphas me faziam de saco de pancadas! Mesmo que eu mandasse eles pararem!
— Não confunda com a voz de comando — Kankuro soou neutro — A voz de comando é absoluta, quando um shifter reconhece o outro como figura de comando. E também intimidação, Alphas podem usar a presença para intimidar Betas e Ômegas. O que aconteceu aqui foi diferente. Por isso a intervenção do garoto ali amansou a gente — ao final o tom estava mais descontraído. Kankuro sabia disso na teoria, mas era a primeira vez se sentia na pele. Estava maravilhado. As palavras do Ômega foram rudes, grosseiras. Porém sua essência venceu a barreira do acônito e o envolveu como um manto de calmaria, que lhe cativou. Pareceu impossível que o Alpha em si não obedecesse ao pedido.
— Do que você está falando? — Gaara retomou a palavra — O que é Gin-Io? E... saco de pancadas de Alphas? Um Ômega? Espera usar esse argumento para barganhar nossas leis?
Kiba sorriu cheio de dentes, subitamente estufando o peito todo arrogante.
— E não é que você não sabe de tudo? Caralho, parece que eu venho de outro mundo, não de outro país! Ninguém nunca ouviu falar sobre o meu país, mas ele existe e é um lugar horrível. Lá tem muitos Ômegas, ao contrário dos outros países. E lá a gente é tratado como um fardo pra sociedade! É tudo ao contrário.
— Claro — Gaara não acreditou em nem uma palavra.
— Ele fala a verdade — Shino ajeitou os óculos no rosto. Talvez fosse hora de acabar com as meias palavras. Tudo atingiu proporções dantescas, envolvendo mais do que sequer imaginou no começo, ao ouvir o primeiro relato de maus tratos sofrido por Kiba, o Ômega que tentou viver secretamente em seu feudo.
Gaara saiu de trás da escrivaninha e fez um gesto para eles indicando uma segunda porta. Primeira ação mais afável desde que a reunião começou.
Eles foram para o cômodo em anexo, uma sala de reuniões na qual puderam se sentar numa das pontas da longa mesa para discutir o assunto. De um lado Kankuro e Gaara, a frente deles Shino, Kiba e Hana.
O Kazekage não quis mais exibir sua autoridade como meio de dar mais verossimidade a lei que pretendia clamar. Agora estava interessado em ouvir a história toda por trás daquele Ômega.
— Podemos conversar melhor aqui.
Shino lançou um breve olhar na direção de Kiba, querendo saber até que ponto seria recomendado revelar. Captou confiança vindo da direção dele. E incentivo. Ele não fazia segredo de tudo o que passou. Não se preocupava em esconder. O único perigo ali, era saber se Sabaku no Gaara participava do que quer que estivesse acontecendo secretamente ou não.
Voltou os olhos para o Alpha, que aguardava explicações. Concentrou-se nos insetos dentro de seu corpo, no animal que dividia sua alma. Agora calmos, porque não havia ameaça ao companheiro. Não porque desconfiassem do outro Alpha. Resolveu acreditar nos instintos e contar a verdade.
— Kiba veio de um pequeno país chamado Soragakure. Um lugar que eu desconhecia, e do qual nada consta em registros oficiais além do nome. Esse país tem a tradição de manter distritos e aprisionar Ômegas lá, onde ficam a disposição de caprichos dos Alphas.
— Um lugar com muitos Ômegas? — Kankuro não acreditou.
— Enviei ninjas para investigar melhor. E o Hokage escolheu um time para ir verificar também. O ponto interessante aconteceu bem aqui, no hospital de Suna — Shino ganhou a atenção de Gaara e Kankuro com a insinuação — Quando Kiba nasceu, sua irmã foi informada de que ele não resistiu a complicações no parto, nem sua mãe. E Inuzuka-san pranteou uma criança que não era seu irmão.
— O hospital errou e trocou a gente — Kiba esclareceu, traduzindo as palavras rebuscadas de Shino pela verdade nua e simples.
— Não acredito em erros — Shino foi bem claro — Não em erros que raptam um Ômega e o levam para tão longe, para aprisionar em um distrito.
— Está insinuando que foi proposital? — Gaara incomodou-se com a acusação. Algo assim em seu país seria tenebroso.
— Não estou insinuando nada. Estou afirmando que não acredito em erros assim. Ou coincidências. Venho me perguntando desde que ouvi a história de Inuzuka-san: Kiba foi o primeiro "erro"? Ou o último "erro"? Quantos bebês mortos foram trocados sem que os pais soubessem?
— Nossa taxa de mortalidade infantil está na média — Kankuro afirmou com mau humor.
— Os filhotes não precisariam nascer mortos — Gaara falou pensativo, a face lívida — Basta que a troca seja rápida, seria imperceptível. Os pais acolheriam e criariam a criança errada.
— E o vínculo? Quando me encontrei com Kiba, nosso vinculo se reestabeleceu, mesmo depois de tantos anos! — Hana ousou participar da conversa.
Gaara virou-se para ela:
— O vínculo não é absoluto, ao menos não durante algumas situações. Entre elas, o nascimento. O filhote usa os cinco sentidos por si só pela primeira vez e pode sucumbir ao vínculo primário com outro shifter facilmente. O mesmo para quem deu a luz: o vinculo reconhece o recém-nascido, porque o corpo sente a ausência do filhote. Por isso os partos ocorrem em salas isoladas. Já houve caso em que bebês e genitores se vincularam de forma equivocada. Com vocês dois se encontrando na idade adulta, a instabilidade pós-parto não impediu o que o vinculo criado na gestação e não preenchido por outro filhote, se reestabelecesse.
— Que cruel! — ela não conseguiu segurar o comentário — É tão fácil assim genitores e filhos se vincularem a alguém diferente?
— Não é crueldade. É questão de sobrevivência, é o lado animal lutando pela vida. Se um bebê não mantem vínculos depois do nascimento, ele se torna mais frágil, é natural aceitar o vínculo com um shifter que esteja perto. O mesmo vale no contrário: se a pessoa que gestou sente um filhote precisando se vincular, vai aceitar isso para garantir a sobrevivência. É premissa de qualquer espécie. Médicos e enfermeiros são treinados e controlam o próprio chakra.
Kiba, que esteve calado nos últimos minutos, segurou na pontinha da blusa de Shino e deu um puxão.
— Você acha que a morte da minha mãe não foi um erro também? Acha que ela morreu por minha culpa, porque eu nasci Ômega?
Shino levou a mão à bochecha do garoto e deu um beliscão carinhoso, evitando a marca do clã. Um gesto tão terno que surpreendeu a todos, principalmente a ele próprio.
— Não sei — respondeu fingindo não se sentir constrangido por agir com tamanha intimidade em público — Vamos tentar descobrir isso, com a ajuda do Kazekage.
Gaara trincou os dentes. Desde que assumiu o posto no governo, concentrou-se em acabar com a violência e os roubos que faziam de Suna um dos piores lugares para se viver. Agora vinham esses desconhecidos dizer que talvez algo infinitamente pior estivesse acontecendo no hospital da Vila, bem debaixo do seu nariz?
— Claro — garantiu — Iremos investigar muito a fundo. Enquanto isso, espero que fique aqui em nossa Vila, junto a sua irmã. Ou pensa abandoná-la para voltar a Konoha?
A pergunta impiedosa atingiu Kiba. Shino sentiu a raiva começar a voltar, mas dessa vez quem salvou do pior não foi o Ômega. Foi sua irmã, a única Beta entre eles:
— Kiba vai voltar para Konoha, junto com o companheiro a quem reconheceu — ela falou com suavidade e segurança impressionantes. Olhou fundo nos olhos do caçula, sentado ao seu lado — E não vai me abandonar aqui. Você saiu do leste em minha procura, abriu mão de tudo para tentar me encontrar. Agora é a minha vez. Eu vou deixar Suna e partir para Konoha. É a minha vez de seguir você, irmãozinho.
Shino&Kiba
Notas finais do capítulo
Pronto, gente. Pareceu que tudo tava bem feio, mas as coisas se ajeitam ♥