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By hellenptrclliw

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➛ A segunda queda: livro 02 da série "The Four Falls". Apaixonar-se não era sequer a última das coisas que Et... More

OWH. #2 Série TFF
sinopse
dedicatória
epígrafe
prólogo
01. quem está julgando?
02. caos com íris cor de avelã.
03. dever e honra.
04. até onde você é capaz...?
05. ethan.jyoung.
06. se você diz.
07. calum young é um menino sábio.
08. quem é gwen evans?
09.1. eu não sei como você consegue.
09.2
09.3
10. movidos pelo instinto de sobrevivência.
11. precisamos parar de nos encontrar assim.
12. por que se explicar tanto para si mesmo?
13. temos tudo sob controle.
14. a verdade que há e suas promessas.
15. um dia, talvez?
16. até o sol nascer.
17. nada é como se apaixonar pela primeira vez.
18. a reputação que me precede.
19. quando o amor cai em mãos erradas.
20. no meu sangue.
21.1. a garota que me encara de volta.
21.2
22.1. os parágrafos escondidos e descobertos.
22.2
23. a sentença das nossas vidas.
24. misericórdia nunca foi o seu forte.
26. as estrelas que testemunham nossa queda.
27. isso é sobre quem eu sou.
28.1. a liberdade do meu verdadeiro eu.
28.2
29. isso muda tudo.
30. e quem a protege de mim?
31. "juntos e essa coisa toda".
32. capítulos em branco.
33. é sempre assim?
34. como viemos parar aqui?
35. o narrador que conta a história.
36. neste momento, ele é o mundo inteiro.
37. aquela filha daquela família.
38. me diga que não é tarde demais.
39. me perdoe, eu me apaixonei.
40. boa fé da mulher que me amou primeiro.
41.1. é como deveria ser.
41.2
42. o monstro debaixo das nossas camas.
43. genuína.
44. o sangue puro e o sangue ruim.
45. julgamento
46. com um coração cheio.
47. rainbow
48.1. as constantes.
48.2
extra: pressentimentos.
49. você vem para o café da manhã?
50. a traição.
51. negação.
52. não esquecer o quanto você o ama.
53. é o único jeito, querida.
54. honra e morte.
55. se apaixonar.
56. este é o meu dever.
57. memórias: nós as construímos e elas nos constroem.
58. sem mais sentir muito.
59. era você que sempre estava lá.
60. o caminho de volta para casa.
epílogo.
nota final.

25. a vida acontecendo através desses sentimentos.

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By hellenptrclliw

Porque no meu coração e na minha cabeça
Eu nunca vou retirar as coisas que eu disse
Lá do alto, eu sinto deslizar o que
Ela disse no meu coração e na minha cabeça
Me diga por que teve que acabar
Oh não, oh não

Eu não posso nos salvar, minha Atlantis, nós caímos
Nós construímos esta cidade em terreno movediço
Eu não posso nos salvar, minha Atlantis, oh não
Nós a construímos para derrubá-la

Agora, todos os pássaros fugiram, a dor só me deixa assustado
Perder tudo o que eu já conheci
Tudo se tornou demais, talvez eu não fui feito para amar
Se eu soubesse que eu poderia chegar até você, eu iria

ATLANTIS | Seafret.





MEU HUMOR NÃO ERA dos melhores na manhã seguinte, mas Gwen não se deixou intimidar. Se possível, ela sequer reparava agora. Com exceção de ontem somado às oscilações de sua confiança, minha expressão distante e palavras bruscas conseguiam arrancar dela coisas que nunca me vi precisando em outra pessoa.

Quando ela sorriu ao me ver esperando por ela no estacionamento, eu a prendi com um olhar e espalmei sua nuca para pressionar um breve beijo em seus lábios. Afastando-me, seu sorriso era ainda maior.

Era bom pra caramba não ter que ser algo que eu não era para agradá-la.

Eu estendi minha mão no ar e parei quando não a senti segurá-la. Eu não iria perder meu tempo com besteiras: Gwen entraria comigo e deixaríamos que todos soubessem ― indiretamente ― que tanto ela como eu não estávamos disponíveis. Eu achava que não. Pelo menos pareceu um acordo mútuo estabelecido ontem, mas não queria me equivocar.

― Todo mundo vai ficar olhando se nos vir assim ― ela disse, toda tensa e de olhos arregalados. ― Você sabe como as pessoas são.

Não sabia o que dizer. Eu não dava a mínima para o que eles pensavam, mas ela se importava e eu não queria ser insensível. Seria pior, no entanto, quando ela estivesse me contando algo que a fizesse rir e uma garota chegasse passando a mão em mim ou me fazendo um convite desconfortavelmente explícito. Eu sabia que seria um banho de água fria na frágil estrutura que estávamos construindo.

― Por que você se importa? ― perguntei, nos afastando para o canto das escadarias largas. ― As pessoas são intrometidas. É assim que é.

Gwen balançou a cabeça, encarando meu peito.

― Eles vão olhar para mim ― ela esclareceu. ― Todo mundo vai ficar olhando.

― Eu sei que você não gosta disso ― falei, usando meu corpo para escondê-la dos olhares curiosos. Segurando sua mão na minha, notei que estava fria. ― Correndo o risco de parecer um idiota, tenho que te dizer que algumas garotas podem ser desagradáveis porque...

Gwen revirou os olhos e eu sabiamente decidi não completar a frase.

Algo não estava certo. Eu sabia que ela não gostava, mas nunca me ocorreu perguntar suas razões. Há mais de um mês, St. John assumira ter bisbilhotado suas redes sociais e afirmado que ela não parecia em nada com a mulher tímida e assustada que eu tinha em minha frente agora.

O que aconteceu?

Não querendo ser aquele que começaria arruinando seu dia, eu trouxe sua mão aos meus lábios e beijei seus dedos antes de soltá-la. Gwen ergueu o rosto para nivelar nossos olhares. Mesmo a cor cinzenta e fria do dia não apagava aquele brilho em seu olhar que tanto me fascinava, porque eu não tinha certeza se ainda havia algo assim no meu. Treinando meu olhar para permanecer conectado com o dela e não descer para o decote de sua camiseta rosa clara, eu cruzei meus braços na altura dos pulsos em minhas costas.

― Então, se você vir alguma garota em cima de mim, saiba que eu provavelmente vou entrar em pânico por ficar pensando que você está vendo tudo e correndo para as colinas outra vez.

Ela reprimiu os lábios para conter uma risada.

― Nós temos um acordo, lembra? ― frisou, arqueando as sobrancelhas. ― Se eu te largar agora, não terei mais quatro bonitões, uma Alyssa mal humorada e alguém que entende de Shrek para assistir comigo.

Tinha isso. Os dois haviam passado o resto do dia maratonando os filmes do Shrek e me forçando a assistir com eles. Não foi o maior sacrifício que já fiz ter um momento de paz com duas pessoas... Importantes. Ou observá-los rindo um com o outro, discutindo e procurando minha opinião sempre que tinham um impasse. Como se o mundo fosse realmente bom para merecê-los.

― Que romântico ― eu fingi estar emocionado. ― Você sabe mesmo me lisonjear.

Aquele sorriso lento que evidenciava uma pequena covinha acima da curva de seus lábios apareceu, e foi o suficiente para me fazer sorrir também. Esse era o que eu mais gostava. Era como se ela me permitisse ver cada movimento e memorizar cada mudança nas linhas de seu rosto.

― Apenas... ― ela inspirou profundamente, tornando sua voz uma carícia suave ao terminar: ― Ainda não, ok? Eu sei que você está fazendo isso mais por mim do que por você, e eu te adoro por isso. Não vou dar um ataque se alguma garota for até você.

Eu arqueei uma sobrancelha sob o pretexto de zombaria para mascarar o quanto queria ouvir uma resposta diferente quando falei:

― Cuidado. Quase soou como se você estivesse começando a confiar em mim.

Ela corou. ― Estou tentando. De verdade.

Meu coração não deveria se expandir tanto em meu peito com essa admissão, mas fez. Eu fiquei um pouco sem jeito por alguns segundos, sem ter antecipado o quanto realmente queria ouvir isso. Com seus óbvios problemas e confiança, soava um maldito privilégio receber a chance de me provar. Talvez eu devesse ser tão cauteloso quanto ela nessa questão, mas para mim tudo era novo. Entender cada novo detalhe já era complicado o suficiente, e eu nem era tão interessante para fazer tanto mistério.

― Não pareça tão chocado ― ela se inquietou. ― Eu não estaria aqui se não confiasse em você pelo menos um pouco.

Gwen franziu a testa ao ouvir suas próprias palavras.

― Não que você seja o problema ― apressou-se em remendar. ― Porque você não é. Quero dizer, pelo menos não fez nada para ser o problema. Né? Você está indo muito bem e deve ser por isso que eu estou tão cética, já que vocês homens são tão previsíveis. ― Ela assentiu para si mesma. ― E eu vou parar de falar agora.

Porém, ela estendeu as mãos como se aplacasse um animal feroz, quase tocando minha barriga.

― Mas você não é problema, ok? Não estou dizendo que você não merece confiança, porque merece, e é por isso que eu estou dizendo todas essas coisas. Tenho certeza de que você será muito eficiente ao afastar as garotas com essa sua expressão de eterno tédio com relação ao mundo, então eu estou bem com isso.

Balancei a cabeça. Essa garota.

― Terminou?

Ela aprumou os ombros e fez uma careta.

― Terminei.

― Ótimo. Agora chegue mais perto.

Seu olhar correu em várias direções, avaliando os alunos que ainda pairavam por perto e ela sacudiu a cabeça.

― Eu tenho que te dizer uma coisa que não posso dizer em voz alta ― eu soava muito sério, o que chamou sua atenção.

― Quê? Eu tenho alface presa nos dentes? Porque eu comi um sanduíche antes de sair, mas me escovei.

Era difícil não rir.

― Não, não é isso. É sobre algo que eu estou pensando e você sabe que eu não sou bom em me expressar, Gwen.

Ainda suspeitosa, ela deu um pequeno passo para perto até que quase não havia espaço entre nós dois. Precisando inclinar a cabeça para trás por causa da nossa diferença de altura, ela franziu as sobrancelhas escuras em uma pergunta silenciosa e eu mordi o interior da bochecha para suprimir um sorriso.

Tão bobinha.

Segurando seu queixo com a minha mão, eu baixei o rosto e bati meus lábios nos dela, engolindo seu suspiro surpreso. Ela não pôde protestar, porque minha língua invadiu sua boca quando ela tentou falar e seu corpo imediatamente derreteu no meu como se eu tivesse fritado algum tipo de controle dentro dela. A maciez coberta de seus seios pressionando contra minha camisa preta e lotando meu peito de calor me fez mergulhar em sua boca com mais vontade.

Soltei sua mandíbula e deslizei minha mão por sua garganta, sentindo o pulso acelerado contra meu polegar. Ela estava quente, suave e condenada.

Por causa minha.

Rompi o beijo e um fio de saliva permaneceu entre nossas bocas até que eu desse a ela um sorriso travesso e saísse correndo escada acima.

Ethan!

Segurando o corrimão de ferro da porta, me virei com um último aceno.

― Tenha um bom dia, G!

Eu sabia que teria.

* * *

― Você não quer entrar aí ― Hunter avisou, encostado contra a parede e com as mãos enfiadas nos bolsos frontais de sua calça de moletom cinza. ― Caden está comendo uma diretora de cinema que veio dar uma palestra para o pessoal do primeiro ano.

Eu fiz uma careta. ― Quantos anos ela deve ter?

Hunter ponderou, encarando o teto. ― Quando eu entrei esperando poder ajudá-lo com algo como dizia sua mensagem ele estava indo por trás, mas eu diria que ela está na casa dos quarenta.

Eu encarei a porta da sala como se ela estivesse podre.

― Será que vai demorar?

― Estou aqui há dez minutos.

― Isso não é errado? ― eu divaguei. ― Isso é errado, Hunt.

― Bem, Deus vai julgar todo mundo quando chegar a hora. Enquanto isso, podemos muito bem aproveitar ― Hunter murmurou.

Cinco minutos depois, uma mulher na faixa dos quarenta anos com quadris largos e roupas de bibliotecária abriu a porta, brevemente entrando em pânico ao nos ver parados ali. Para seu crédito, ela passou a mão pela saia e saiu de cabeça erguida como se estivesse apenas dando uma bronca em um estudante universitário com metade de sua idade. Hunter moveu os lábios dizendo “mal educada” e eu ri, aproveitando a deixa para entrar na sala.

Caden estava parado com o cinto preto na mão direita, encarando a mesa em que provavelmente a curvou com um olhar sombrio no rosto. Sua expressão não parecia em nada com alguém que acabara de gozar ou com a habitual arrogância inofensiva que exibia constantemente.

Ele parecia só vazio.

― Procurando por uma sugar mommy? ― Hunter quebrou o silêncio com humor, trocando um olhar aguçado comigo.

Caden piscou e olhou para nós, aquele brilho desamparado apertando meu peito. Então, como sempre, levou apenas um segundo para que a máscara voltasse ao seu lugar. Ele desviou o olhar e começou a arrumar o cinto em sua calça, cruzando a ponta pelos passadores até prendê-lo na frente. Quando olhou para cima novamente, um sorriso malicioso nos cumprimentou de volta.

― Ela falava como se estivesse fazendo um sacrifício vir aqui dar uma luz aos calouros. Eu a curvei e estapeei sua bunda até ela engasgar com a superioridade dela ― Caden levantou as sobrancelhas sugestivamente. ― Eu acho que foi uma atitude muito nobre.

― Nobre, hein?

Ele deu de ombros.

― Ela usava aliança ― Hunter apontou. ― Você percebeu isso?

― Eu não a forcei a fazer nada ― ele disse, jogando a alça da mochila no ombro. ― De colocar meu pau na garganta até tirar a calcinha, ela fez tudo conscientemente. Daquele jeito, o marido provavelmente come a secretária dele, e além do mais, se ele desse conta a boceta dela não ficaria molhada por um pau universitário.

Jesus Cristo. Às vezes até mesmo eu estremecia com o linguajar desse cara.

― Por que você nos chamou? ― perguntei, mudando de assunto.

Caden puxou os óculos escuros do bolso da mochila e o colocou, escondendo os olhos atrás da lente. Pegando o corredor que dava para a área externa do prédio, Hunter e ele ainda "cumprimentaram" algumas garotas com sorrisos sugestivos e até alguns tapas na bunda. Eu sacudi a cabeça, retirando-me para o lado quando era pego entre uma interação.

― St. John está agindo estranho ― Caden explicou. ― Todo reservado e merda. E o joelho dele voltou a incomodar, algo que ele está omitindo do treinador.

Leon tinha o joelho fodido por causa de uma das tantas surras que seu pai lhe dera quando criança, mas o problema só se apresentou na fase adulta e conforme ele ascendia no basquete. Nós o avisamos milhares de vezes que ignorar isso não levaria o dano embora, mas ele era teimoso. Basquete era sua vida e seu sonho de um dia poder ser visto como um jogador do New York Knicks perseverava desde quando ele era uma criança.

Acabaria com ele se isso fosse destruído.

― E o pai dele...

― Eu sinto que... ― Hunter fez uma pausa, encarando os pés enquanto atravessávamos o extenso gramado até o banco mais próximo sob a sombra de uma árvore. ― Eu sinto que ele não pretende parar desta vez.

― Joseph? ― Caden indagou.

― Ele está atrás dele ― eu disse. ― Antes, quando ele apareceu no apartamento dele. Esses dias que ele passou trancado em casa por causa do “assalto”. Não teve nenhuma porra de assalto. Isso tudo é ele e St. John realmente pensa que compramos as mentiras dele.

E ir atrás da minha irmã. Isso era um grande problema e St. John sabia, tanto era que estava me evitando toda vez que nossas conversas leves ameaçavam ir para o lado sombrio. Ele acreditava que eu não tinha conhecimento sobre seu envolvimento com ela e eu os deixava ter essa pequena liberdade até que tomassem alguma decisão. Não poderia dizer que não senti uma pontada de alívio quando Alyssa me disse que ele havia voltado com Jessica.

Era algo horrível de se pensar, mas se ele se afastasse da minha irmã, eu poderia me acalmar. Não a eliminaria do perigo uma vez que Joseph sabia quem eu era e usava todas as artimanhas possíveis para chamar a atenção do filho, mas estar ligada diretamente a St. John? Da próxima vez que Joseph quisesse enviar uma mensagem, ele poderia não ser tão gentil quanto um velhinho oferecendo uma pulseira a uma jovem simpática na rua.

O que diabos deu nela para aceitar, aliás? Às vezes era como se ela desligasse a parte inteligente do cérebro. Porém, eu me perguntava se isso também não tinha um dedo de Malorie. Minha irmã poderia muito bem ter sido chutada naquele dia, o que justificaria seu estado vulnerável para não perceber os sinais óbvios de ameaça.

A única razão pela qual eu não estava profundamente furioso com seu estágio era essa: significaria que ela teria menos tempo na rua. Era errado? Provavelmente. Mas ela teria mais chances de ficar a salvo até que encontrássemos uma saída ou até que St. John finalmente fizesse algo contra seu pai biológico.

Caden, Hunter e eu jamais iríamos pelas suas costas com isso. Confiávamos que ele também não iria pelas nossas, mas... Algo não parecia certo desta vez.

Caden sentou na guarda do banco, as botas de motoqueiro sujando a superfície de concreto. Eu passei a mão ali antes de sentar usando a altura de suas pernas para descansar meu braço enquanto Hunter sentou do outro lado, esticando as longas pernas e as cruzando na altura dos tornozelos.

― Vocês sabiam que ele está vendo a minha irmã?

― Vendo, não. Fodendo, sim ― Caden respondeu.

Hunter assobiou. ― Sutil, irmão.

Caden encolheu os ombros e um “o quê?” inocente saiu de sua boca. Eu nem me importava com a ausência de um filtro entre seu cérebro e língua a essa altura. Mas me irritava que todos soubessem ― porque St. John os deixou saber ― e eu estivesse tecnicamente no escuro. St. John pensava que eu faria o quê? Socaria ele? E Alyssa? Que eu a obrigaria a escolher entre nós dois? Quantos anos eles têm, quinze?

― Não fique bravo ― Hunter pediu, inclinando a cabeça para encontrar meu olhar. ― Eu sei que não contar para você está incomodando demais ele.

― Isso pode ser facilmente resolvido ― eu zombei.

― Talvez sua irmã não esteja facilitando ― Caden presumiu. ― Soa mais familiar que ela esteja com as rédeas disso do que St. John fazendo qualquer coisa para arriscar a amizade de vocês dois.

― Sabe, não me importa realmente que eles estejam se vendo...

Fodendo ― Caden me interrompeu, corrigindo.

Ele respirou fundo, com dor, quando Hunter deu um soco em suas costelas.

― Obrigado. Enfim, eu não ligo. Não como eles pensam, pelo menos ― balancei a cabeça. ― Mas agora Joseph sabe quem ela é. O que ela pode ser para ele. Isso é outra coisa.

Os dois ficaram quietos, absorvendo minhas palavras.

― É estranho como tudo muda. Quando eu vivia sozinho, era como se eu não tivesse nada a perder – podendo arriscar qualquer coisa por ele, mesmo que meus irmãos estivessem contando comigo.

― Mas agora eles estão aqui, ― Caden assentiu.

― É. Eu ainda faria qualquer coisa por ele sem hesitar, mas também faria qualquer coisa pelos dois. Como isso se encaixa?

― Amar é difícil ― Hunter dizia. ― E eu acho que amar poucas pessoas é muito mais difícil, porque quando há um conflito, todos se envolvem. A merda acontece e nem sempre dá pra consertar.

― Ele nunca colocaria Alyssa em risco ― Caden falou com convicção. ― Saindo com ela ou não. Ele sabe que você perderia a cabeça se algo acontecesse a ela.

― Eu sei disso ― olhei para cada um deles por um momento. ― E esse é o problema.

― Por quê?

― Eu sei o que ele faria e o que não faria. A questão é que nem sempre temos a sorte de poder controlar as circunstâncias.

― É... ― Caden suspirou, girando o anel prateado que ele usava no mindinho. ― Sei bem como é isso.

Eu apertei seu joelho em um gesto de conforto, porque dada sua história, me imaginar passando o que ele passou fazia meu interior se apertar dolorosamente. Ninguém deveria passar pelo que Caden passou, ou mesmo Hunter. Às vezes parecia que a nossa ligação havia surgido da morte e talvez por isso fosse tão forte. Porque sabíamos ― vivenciamos na pele ― o poder dela. Não conosco, obviamente. Mas a única coisa pior do que morrer era ser quem continuava no mundo.

Ninguém nunca estava preparado para dizer adeus. Ninguém nunca estava realmente pronto para “morrer”. Quem ficava, porém, só tinha a opção de aprender a viver novamente após perder uma parte de si.

― Concluímos então que a vida é uma vadia cruel e louca ― Hunter falou, enfim.

― Sem dúvidas ― Caden e eu dizemos em uníssono.

― Infelizmente para ela, nós estamos juntos ― Caden prosseguiu. ― Ela nos fode pensando que vamos nos curvar e nós respondemos pedindo mais forte, certo?

Hunter e eu nos encolhemos.

― Cara, que bom que você não faz psicologia, ― murmurei.

Como se eu tivesse o sexto sentido de uma mãe, no instante em que recebi a ligação de St. John me convidando para ficar bêbado ― o que eu não podia porque estava cuidando do resfriado de Calum ―, soube o que estava para acontecer. Não perdia a graça conhecer alguém tanto a ponto de poder antecipar algo que sequer ela tem total certeza.

Como previsto, ele não queria largar o basquete, por mais que fosse um meio temporário para um fim permanente; tanto é que o próprio treinador Ross que o idolatrava havia pedido para ele dar um tempo se achasse necessário. O que era, mas ele era teimoso demais para admitir. Cheguei a pensar que minha irmã pudesse convencê-lo, mas temia que não fosse possível.

Ele podia ser bem burro para um homem tão inteligente.

Quando estávamos na sala comendo a sopa que preparei para Callie, ele praticamente tinha “culpado” escrito na testa, mas não tinha coragem de falar. Portanto, reconhecendo que era baixo, puxei uma carta envolvendo o nome de Jessica. Na verdade, dizer que ela estava inventando fofocas por aí para criar conflitos era bem a cara dela, portanto não me senti culpado por mencionar que ela poderia estar me induzindo a “abrir o olho para um amigo que estava agindo pelas minhas costas”.

Como Hunter disse... Podemos muito bem aproveitar.

― Eu não dou a mínima ― disse bruscamente, virando-se com uma promessa assassina no olhar. ― Ou você acreditou?

― Cara? Você me ofende.

Pergunto-me qual é mais sonso.

St. John ficou tenso e esfregou o braço tatuado ― o braço da cicatriz ― como se estivesse sentindo frio. Toda vez que ele estava nervoso ou muito apreensivo, ele tinha o costume de procurar as memórias marcadas em sua pele como se fosse uma forma de voltar a se “centrar” no presente. Como pressionar a digital do polegar no início dela em seu pulso ou apenas movimentar o ombro em movimentos circulares como se precisasse da sensação da pele ligeiramente deformada.

Eu odiava isso. Odiava Joseph Reed com um ódio que jamais sentiria por outra pessoa enquanto vivesse. Odiava que a missão de sua vida fosse destruir a mais merecedora que já conheci.

E Leon deve sentir que estou o observando, porque de repente, levanta-se como se eu estivesse prestes a colocar fogo no sofá. Ele tentou agir casualmente ao abrir a porta da frente e sair para a varanda, mas eu conhecia esse garoto. Conhecia cada uma de suas versões. O adolescente tagarela e bobão; o amigo; o parceiro; o viciado; o reabilitado; o filho; o homem desesperado por uma chance para poder provar que merecia estar vivo; o irmão por escolha que jamais me arrependeria de ter escolhido.

A escuridão por trás das vibrantes íris âmbar.

Balançando minha cabeça, beijei o topo da cabeça loira de Callie.

― Fique aqui, ok? Preciso falar com o Leon.

― Posso pegar um pedaço do chocolate que Allie comprou pra mim?

Eu sabia que não seria só um pedaço, mas deixei de qualquer forma.

Seguindo meu amigo para fora, respirei o ar frio e inspirei profundamente o cheiro de terra e verde das árvores e do gramado. A única luz que me permitia distinguir seus traços na penumbra da noite vinha das janelas da sala e cozinha e das duas arandelas na parede em nossas costas. Eu podia dizer que pela maneira que ele arrastava os dedos pelas mechas de cabelo dourado liso e como sua boca estava contraída que ou ele estava com dor de barriga, ou com um grande problema.

― O que é que você não está me contando, St. John?

Recostei meu ombro na coluna no pé da escada larga de quatro degraus que ligava o piso da varanda ao solo. Meu amigo desviou o olhar e o músculo em sua mandíbula saltou conforme ele discutia consigo sobre o que fazer. Ele iria me contar sobre Allie ou era algo relacionado ao pai? Ele finalmente buscaria a justiça que ele lhe devia? Nós finalmente poderíamos ficar em paz sabendo que não corríamos o risco de acordar e descobrir que ele estava morto?

Abrindo um passo para o lado, o listão da tábua sob nossos pés rangeu quando Leon virou o corpo na minha direção. Ele engoliu em seco uma, duas vezes, o conflito claro em seus olhos. Inseguro, começou a falar.

― Eu meio que quebrei nossos códigos com as garotas.

Ah. Então vai ser isso.

― Bem vindo ao clube ― dei de ombros.

Todo mundo pensava que eu estava fora de mim e havia ficado com a “namorada” do meu melhor amigo e eu não tinha razão para contar a verdade. Ele estava livre dela, não é?

E com a sua irmã agora. Fale sobre uma reviravolta na minha bunda.

Preparei-me para ouvi-lo e enquanto debatia comigo mesmo se deveria demonstrar surpresa, raiva ou apenas indiferença, sua voz reverberou no silêncio da noite e suas palavras, delicadas como o pé de um elefante na minha cabeça.

― Eu comi a sua irmã ― declarou, olhando diretamente nos meus olhos. ― E na verdade ainda estou.

Deus.

Deus.

Deus.

Esse cara.

Meu Deus! O que a minha irmã estava fazendo com o cérebro dele?

Eu não esbocei nenhuma reação. Apesar da grosseria de suas palavras, eu sabia que minha irmã não dormia em sua casa para tricotar e assistir novela. Mas puta que pariu, isso era jeito de falar?

O sopro suave do vento em meus cabelos me despertou e eu pisquei, levando a mão ao rosto e apertando a ponte do nariz entre dois dedos.

― Cara, ― minha voz era áspera ― apesar de não ser uma surpresa, existem formas melhores de dizer algo assim. Sério. É a minha irmãzinha, St. John. ― Uma careta surgiu em meu rosto. ― Eu não quero pensar que...

E é isso.

Matei Leon St. John do coração.

Seus braços penderam frouxos ao lado do corpo e ele ficou lá, embasbacado, petrificado me encarando como se fosse acordar do pesadelo a qualquer momento. Eu suguei as bochechas para conter a necessidade de rir e ele apontou o dedo acusatório no meu rosto.

― Você está me dizendo ― até mesmo sua voz era irregular ― que já sabia?

Curvei meus ombros, blasé. ― Não tem que ser um gênio e eu sou algo perto disso, como você sabe.

O loiro passou a mão no rosto, cético.

― Se eu não estivesse tão chocado, enforcaria você com seu próprio ego.

Eu ri, mas secretamente vibrava com o súbito desejo de correr para dentro e ligar para Gwen. Ela deveria estar aqui agora vendo a expressão no rosto dele, afinal de contas, ela esteve bancando a burra e cega tanto quanto eu. Para ser honesto, não sei como eles pensaram que estavam enganando alguém. Não sei como Alyssa James Young realmente pensou que eu não perceberia.

Será que ela acha que eu me importo tão pouco?

Mesmo priorizando apenas o que realmente importava e deixando os detalhes casuais de lado, era impossível não compreender o olhar em seu rosto quando St. John estava ao seu redor. Mesmo para mim, um completo asno nessa coisa de “gostar de alguém” era capaz de ver o quanto meu amigo havia chegado nela. O jeito com que ela se empertigava quando ele aparecia em um cômodo, mesmo que disfarçasse bem.

Aquele brilho nas íris coloridas direcionado apenas a ele, e não me diga que aquilo era tesão. Vivi somente com isso por anos e tenho certeza de que nunca olhei para uma mulher daquela forma.

― Eu sou irmão dela, Leon ― um sorriso resignado se espalhou em meu rosto. ― É impossível não entender aquele olhar no rosto dela quando você está por perto, mesmo que eu tenha a avisado. De duas, para mim, ou vocês estavam realmente saindo ou ela tinha uma queda por você. Só que, se fosse o segundo, ela iria ter você.

Eu sabia disso porque eu sempre consegui o que quis. Era assim que éramos sem nem tentar.

Leon torceu o nariz. ― Você não pode ter tanta certeza, ― alegou inutilmente.

― E você ― eu joguei a cabeça para trás com uma risada abafada ―, puta merda, eu nunca te vi tão bocetinha perto de alguma mulher.

― Aham ― revirou os olhos, tornando a encarar o horizonte escuro ―, é porque eu não sou, nem com ela.

Se isso te faz dormir melhor à noite.

― Rá, continue negando. Eu juro que precisava usar todo meu autocontrole para não rir e, bom, um dia eu fui dar a volta na mesa do refeitório e sua mão estava na coxa dela. Aí eu pensei: ou eles são bons lindos e puros amigos ou eles realmente estão juntos. E aquele dia que você quase a chamou de amor? Eu pareço burro ou o quê?

Leon finalmente relaxou um pouco e sua risada encheu o ar.

― Por que você não falou nada? ― perguntou, encarando-me intensamente. ― Quero dizer, você é o protetor dela. No dia da sua viagem para Portugal você disse que confiava em mim porque eu não olharia para ela dessa maneira.

Assenti e fui para seu lado.

― Eu ainda acreditava que você e Jessica... ― deixei a frase no ar. ― E além do mais, até aquele momento, ela não parecia gostar tanto da sua presença.

― E depois?

― Depois... Acho que eu comecei a perceber que, mesmo querendo, eu não podia ficar protegendo-a como se ela ainda fosse uma garotinha indefesa. Eu não fiz quando deveria, então...

James, ― começou ele, mas o calei com um sorriso.

― Vamos lá, eu aceitei isso. Nós sempre vamos tomar uma decisão que vai mudar todo o curso da nossa vida. Eu a deixei. Eu segui em frente e a deixei sozinha e eu nunca vou me perdoar por isso, mas não posso mudar o que já está feito.

― Você não deveria se martirizar tanto. Concentre-se no que você tem agora, James. E tudo o que podemos fazer.

― Eu sei, e estou tentando. ― Suspirei, meneando a cabeça em um aceno. ― De qualquer maneira, eu esperava que você viesse até mim em algum momento, e eu confesso que esperava que você viesse mais cedo.

― Eu queria ― ele diz apressadamente ―, mas porra, sua irmã é difícil pra caramba. O que você tem de assanhado, ela tem de impossível.

Eu precisei rir para suprimir a vontade de dizer a ele que estava errado. Ficar aleatoriamente com mulheres não precisava de nenhum requisito especial a não ser dizer as palavras certas e prestar um bom serviço na cama, ou na parede, atrás de uma moita... Você entendeu o raciocínio. E agora isso não me servia de absolutamente nada, porque nunca aprendi a coexistir com alguém e colocar meu coração em jogo.

Até ela, havia me convencido de que eu simplesmente estava quebrado demais para isso.

Leon me empurra de leve com o ombro.

― E ela estava na minha casa ontem, não com a Gwen.

Eu já sabia. Minha garota e eu havíamos rido muito à custa dos dois.

― Me conte algo que eu não sei, St. John.

Imediatamente me arrependi das palavras. Conhecendo-o, ele provavelmente começaria a listar as posições que eles “faziam”, e isso era algo que eu poderia morrer sem saber. Sinceramente, a única maneira de encontrar paz após a morte seria não saber disso.

Mas ele silencia qualquer protesto prestes a sair da minha boca com sua admissão.

Ela ecoa na noite e ameaça me puxar dias atrás até que eu me perca entre todos os anos que o conheci.

― Eu me apaixonei por ela aos dezoito anos.

Hã.

Hã.

Hã?

Hã?!

Eu – o quê?

Meu sorriso morreu e eu dei um passo para trás, no entanto, permaneci fitando seus olhos. A insegurança de antes havia se despedido e dado lugar a uma confiança que eu via poucas vezes em seu rosto. Via quando ele estava com uma bola de basquete em mãos, quando ele prometia a mim ou os caras, até seus pais, que resolveria qualquer problema que tivéssemos.

Via quando ele falava sobre o futuro; sobre todas as coisas que queria fazer, todos os lugares que queria visitar.

Mas nunca vi por uma mulher.

Nem mesmo Jessica Taylor.

Ele espalmou a nuca, soando como se estivesse tão incrédulo quanto eu.

Alyssa tinha quase dezessete anos quando ele tinha quase dezenove. Eles não se conheciam.

Ela nem se lembrava do nome dele quando eu falava sobre meus amigos.

― E eu não posso esquecer. Porque agora, com ela aqui, eu estou apaixonado por cada pequena coisa dela.

O. Que. No. Inferno.

Eu pisquei. Pisquei de novo. Balancei-me em meus calcanhares, desviei o olhar e voltei a encará-lo.

Será que Alyssa estava guardando maconha nos potes de tempero?

Perdão ― apertei as pálpebras e sacudi a cabeça ―, mas o quê?

St. John parecia resignado quando tocou meu ombro.

― Preciso confessar algo que você não vai gostar, James.

Guiei um Calum sonolento para cama e o aninhei nos cobertores. Ele sorriu, murmurando um “te amo” antes de se virar e cair morto. Meu garotinho estava começando a dizer estas extraordinárias palavras com mais facilidade para mim, e eu sentia como se meu peito fosse pequeno demais para meu coração sempre que acontecia. Havia um longo tempo ― talvez anos ― que eu não ouvia um eu te amo de Alyssa.

Alyssa.

St. John.

Dezoito anos.

Ele estava apaixonado há quatro anos? Enquanto ainda namorava Jessica? Sem nem conhecê-la.

Eu não tinha ideia do que iria ouvir quando descesse as escadas. As pessoas tinham que estar se unindo para testar minha resistência cardíaca e arterial, porque não era possível.

A coisa mais surpreendente de todas aconteceu assim que Leon ouviu meus passos e virou seu rosto na minha direção. Era como se eu apertasse um botão e nos revolvesse há quase cinco anos atrás, colocando o garoto de dezessete anos que me encontrou naquela lanchonete depois que salvei sua vida.

Leon Reed St. John tinha dezessete anos outra vez e era um adolescente no começo de sua vida que quase foi morto vítima de um ódio que não merecia, e meu coração ficou apertado.

Eu não queria ser aquele que o faria se ressentir de estar apaixonado ― se o que ele sentia era realmente isso.

― Comece a falar ― digo, sentando-me na poltrona mais distante.

Seus olhos se apertaram e ele assentiu, sentado na beira do sofá e com os cotovelos contra as coxas, os dedos entrelaçados. Eu respirei fundo, meio que desejando que Gwen estivesse aqui para me acalmar com um olhar, pelo menos me fazendo pensar duas vezes antes de dizer algo do qual eu iria me arrepender.

― Não tem um jeito simples de dizer isso, então vou direto ao ponto.

― Você está apaixonado pela minha irmã desde que me conheceu e minha irmã só te conheceu há uns dois meses. A conta não fecha. Com certeza não há um jeito simples ― zombei.

Ele assentiu. Assentiu outra vez e mais uma.

― Certo. Certo ― pigarreando, o loiro segurou meu olhar como o homem que ele era. ― Eu fiz uma coisa errada. Muito errada. E eu nem sinto muito, porque se eu não tivesse feito isso, as coisas estariam muito fodidas agora.

Franzi a testa.

― Você se lembra de quando ainda usava o telefone residencial?

― Sim. Era uma merda porque eu sempre perdia recados.

Culpa brilhou em seus olhos e ele pigarreou novamente, como se houvesse um cavalo enfiado em sua garganta.

― Ah. Bem. ― Pigarreando de novo. ― Os recados. É sobre isso que eu vou falar.

Se ele pigarreasse mais uma vez, chutaria o pescoço dele.

― Eu costumava esperar você aqui quando você trabalhava meio período alguns dias da semana, lembra?

A expressão em meu rosto ficou cautelosa quando concordei.

― Hã. Ok. ― Leon se remexeu, arrastando-se até a ponta do sofá parecendo se preparar para correr. ― Eu ficava aqui e... Às vezes alguém ligava.

Senti meus olhos se arregalarem. ― Você falava com ela? Ela te conhecia desde essa época?

Aquela salafrária.

Mas Leon balançou a cabeça apenas uma vez. Não, ele disse sem usar a palavra.

― Às vezes alguém ligava e deixava recado, justamente quando sabia que você não estava em casa.

Não.

Não.

Ele não faria isso.

Só que talvez ele tenha feito.

― Você ouviu ― concluí. ― Minha irmã ligava e você ouvia? Você enlouqueceu, porra?

Eu pulei da poltrona e ele fez o mesmo, cada um de nós de um lado da sala.

― Eu sei ― afirmou ele, a expressão lívida com o peso de sua confissão. ― Eu sei que foi errado. Ethan, eu...

― Você nunca me contou. ― Falei, calmo. ― Você sequer mencionou uma única vez em... ― olhei para ele em busca de uma estimativa de tempo.

― Três anos.

Uma risada louca ecoou pela sala e eu percebi que era minha.

― Ah, mas isso é bom demais ― levantei três dedos no ar. ― Três anos, filho da puta?

― Ei! Minha mãe biológica é uma prostituta! ― ele exclamou, ofendido. ― Não me chame assim!

Eu dei a ele um olhar homicida. ― Você quer realmente, realmente fazer piadas agora?

Para seu crédito, ele ficou pálido.

― Ok. Mais tarde, talvez.

Deus! O que há de errado com você!

Comecei a caminhar de um lado para o outro na sala, da mesma forma que havia feito um dia atrás. Ainda era melhor agora do que estar com Malorie dizendo todas aquelas coisas que não me permitiram dormir mais do que uma hora durante a noite.

― Por favor, Ethan. Deixa eu explicar.

― E você está esperando que eu te dê bênção? Explica isso!

Porém, antes que ele pudesse falar, eu parei de andar abruptamente e o segurei no lugar com um único olhar.

― Por três anos, o que ela dizia que te fez se apaixonar sem nem conhecê-la?

― Não era sempre que ela ligava. Para ser honesto, no meio do segundo ano, eu tinha sorte de pegar algum.

― O que ela dizia?

St. John respirou fundo, seu rosto tão sério quanto era humanamente possível.

― Não vou te dizer todos os detalhes. Sei que deveria, sei que sou o único errado nessa história e sei que jamais deveria ter ficado entre vocês dois com isso. Mas agora é tarde para desculpas e eu não vou te contar tudo porque aquela garota não é mais a mulher que temos aqui e agora.

Então a garota que ele ouviu era a minha irmãzinha; aquela que menina, garota ou mulher precisava do irmão mais velho. Não essa. Não essa que me fazia sentir como se minha existência fosse apenas... Parte da coisa toda.

E ele tirou isso de mim.

― Embora eu tenha violado a privacidade dela e roubado o que era seu, não é direito meu contar. Ela não é mais aquela garota, mas não muda o fato de que aquilo ainda é parte dela, e se um dia ela quiser, vai mostrar a você.

― Isso é uma desculpa? ― sondei.

Ele negou com veemência.

― De forma alguma. Eu errei. Eu assumo. Pode me bater se você quiser ― ele baixou o tom para algo mais suave. ― Qualquer coisa. Mas não me peça para abrir mão dela. Por favor, irmão, não me peça isso.

Travei a mandíbula para conter a série de maldições que eu queria jogar nele. Ou talvez não fosse nele. Em mim? Na vida? Nas “circunstâncias”? O silêncio tinha um peso insustentável e eu senti como se estivesse me sufocando.

― Teria sido melhor se eu tivesse ouvido? Teria feito alguma diferença boa em nossas vidas?

St. John retraiu as sobrancelhas com um olhar triste e balançou a cabeça, desamparado.

― Não, não teria. Não para vocês, porque você teria voltado para lá se a ouvisse. E não há mais nada para nenhum de vocês naquele lugar.

É como levar um soco.

Sua voz era trêmula quando continuou:

― E eu não teria você ― seus olhos correram de um lado para o outro na sala. ― E caralho, Ethan, eu não sei o que faria sem você na minha vida.

Merda, eu sabia o que ele queria dizer ― não sei se teria sobrevivido sem ele. A amizade dele foi meu porto seguro por mais tempo do que posso pensar. Perder meus pais foi como se eu tivesse morrido também e fosse apenas uma casca vagando em uma existência solitária enquanto enchia minhas escolhas de significados que no fim do dia, não importavam. Não importavam porque eu não tinha ninguém ― absolutamente ninguém ― para sentar comigo e me ouvir falar.

Ele foi o primeiro a me estender a mão, a me oferecer ajuda sem que eu sacrificasse meu orgulho: porque ele era assim, sempre disposto a tirar de si para dar ao outro se fosse preciso. Tê-lo como amigo foi uma das poucas coisas que aconteceram que me lembraram de como era me sentir verdadeiramente vivo.

Eu morreria por ele e ele morreria por mim.

Aqui estava a coisa, no entanto. Nós todos estávamos cercados por morte, desolação e dor. Estávamos sempre esperando por algo ruim mesmo enquanto presenciávamos algo bom e bonito. E de todas as coisas ruins que eu já vi, desenvolvendo um sentido especial para avaliar os meus arredores, as pessoas que eu mantinha por perto, simplesmente não conseguia ver maldade no homem diante de mim. Não sei se deveria ficar bravo ou magoado por causa desse segredo. Não sei como me sentir, mas sei que não estou com raiva. Não lamento. Não quero pensar sobre o que não posso mudar.

Eu só queria poder ser livre.

Queria que todos nós pudéssemos ser.

Se meu irmão encontrava algo próximo a isso em Allie, eu não me perdoaria por tirar isso dele. Ou dela.

― Eu não posso ― sibilei. ― Cristo, eu não consigo ficar bravo. Essa foi a maior merda que você já fez comigo e eu não consigo ficar bravo!

― Não conta pra ela ― pediu, repentinamente desesperado. ― Você não pode contar pra ela, cara. Alyssa não vai me perdoar por ter feito isso com vocês quando você significa o mundo para ela.

― Você vai? ― joguei os braços no ar, exasperado. ― Vai contar a ela um dia?

― Se eu conseguir fazer com que ela se apaixone por mim, sim ― ele diz, sincero. ― Minhas chances de perdê-la são menores assim. Prometa para mim que não irá contar, irmão. Você tem que prometer que não vai.

Ele havia feito isso e ainda tinha a audácia de implorar.

Não sabia como diabos minha irmã não percebia que o tinha de joelhos.

― Eu não vou. Mas você tem que contar algum dia.

― Isso. Algum dia.

― Promete?

Ele assentiu. ― Juro pela minha vida, Ethan.

A casa ficou quieta. Meu pulso desacelerou lentamente ― mais lentamente do que eu gostaria ― e eu dei a volta no sofá e afundei na almofada do meio. Depois de um momento, Leon ocupou o lugar ao meu lado e soltou um suspiro audível, claramente aliviado por ter feito suas confissões. Não saberia dizer o quanto isso deveria estar corroendo seu interior. Desde que eu o conheci, ele era o cara que compartilhava tudo e quando seus momentos mais sombrios o alcançaram, já éramos próximos demais para que ele tentasse se esconder de mim.

Chamam isso de destino?

Eu, ele, minha irmã. Segredos que escolhemos manter uns dos outros. O preço que pagamos por eles no fim. Mas os pequenos detalhes pelo caminho que fazem tudo valer a pena.

― Você gosta dela desde sempre ― eu murmurei, só agora me permitindo considerar o que isso significava para ele. ― Como isso é possível? Se apaixonar por alguém somente por... palavras?

Seus ombros se curvaram. ― Eu não sei como explicar. Eu só... é como se eu nunca tivesse conhecido uma pessoa como ela. Como se... eu me encontrasse na mente e no coração dela. O jeito que ela vê o mundo, como ela sente as coisas.

Eu olhei para ele porque sim, minha irmã era diferente. Especial. Ela era o maior orgulho do meu pai e era só uma criança. Mal podia esperar para ver todas as coisas que ela ainda poderia fazer se aprendesse a lutar por si mesma, porque eu não poderia vencer as batalhas dela por muito tempo. Chegaria um momento que ela precisaria se levantar por si mesma, embora eu fosse sempre ― sempre ― estar por perto.

Mesmo quando ódio fosse tudo o que ela sentisse por mim.

― O jeito que ela ama ― ele continuou, a voz baixa. ― E agora ela está aqui e eu só consigo pensar em como deve ser bom ter o amor dela.

Uma risada envergonhada vibrou em seu peito.

― Você deve me achar um idiota.

Balancei minha cabeça e descansei minha mão atrás de seu pescoço, apertando-o para que ele olhasse para mim e me ouvisse.

Nunca. ― Puxei minha mão de volta e prossegui: ― Por ter feito isso? Sim. Por se apaixonar? Inferno, não. É só que uau, coitado de você.

Sua boca se contraiu com um sorriso. ― Acredite, eu sei. Se te faz feliz, saiba que estou pagando pelo que fiz.

No entanto, eu fiquei ali: meu olhar no seu, mas minha mente vagando. Ele era bom nessa coisa de se apaixonar. Leon se apaixonava por tudo, tinha uma habilidade incrível de ver o lado bom da vida não importa o quão forte ela fodesse com ele ― a analogia de Caden até que faz sentido ―, e eu mal conseguia começar a compreender meus sentimentos por Gwen Evans.

Minha voz era tão baixa que pensei que ele não ouviria quando murmurei:

― Como é isso?

― Como é o quê?

― Se apaixonar.

Gwen havia usado bem as palavras na noite em que quase nos beijamos pela primeira vez, mas eu ainda estava tendo um tempo difícil com tudo isso; sempre pensando que estava fazendo algo de errado, achando que estou prestes a foder tudo com uma palavra, um gesto, um detalhe ao qual eu não me atento. É difícil ordenar meus pensamentos quando ela está por perto. Eu só penso em como ela é linda. O que ela está fazendo com alguém como eu. Por que ela voltou. Que bom que ela voltou.

Há sempre tanto que quero dizer a ela. Enchê-la de histórias que talvez facilitassem na hora em que ela precisasse me compreender. Sobre como eu nem sempre fui assim tão fechado, tão inalcançável e tão intimidante. Sobre os dias em que eu sorria com tanta facilidade quanto meus amigos e poderia passar horas rindo e trocando memórias. Sobre como eu sentia cada ondulação ao meu redor, mas apenas guardava para mim.

St. John estava sempre tão certo sobre tudo. Mesmo quando ele esteve com Jessica. E agora, com o fim que sua história teve, ele sabia exatamente onde o amor estava e onde a toxicidade começara. Ele não sabia por que havia se submetido a isso, mas ouvi dizer uma vez que o amor é um jogo para tolos. Talvez fosse. Ou talvez apenas não soubéssemos amar de maneira genuína.

― Quando eu olho para você ― começou ele ―, ou quando olho para meus pais, para Caden ou Hunter, é como se o mundo fosse um lugar melhor porque vocês existem; ou só não é tão ruim quanto parece às vezes.

Curvando-se para frente, ele voltou à posição de cotovelos nas coxas, mas suas mãos gesticulavam no espaço silencioso a nossa frente.

― Mas se apaixonar é algo ainda mais forte do que isso. Aquele frio na barriga, os pensamentos a mil e as mãos trêmulas, joelhos moles... ― ele ri baixinho. ― E ver o rosto dela após um longo dia, relembrar todos os detalhes que você aprende a memorizar apenas pelo prazer de olhar para ela. É... É de outro mundo, irmão. E nem faz tanto sentido quanto essa sua mente lógica acha que faz.

Eu sentia todas essas coisas que ele dizia. Poderia eu estar apaixonado? Assim? Como se desde o primeiro momento que coloquei meus olhos nela fosse minha única opção? Continuamos nos esbarrando até que tornasse impossível não notá-la? Eu sempre estive condenado a estar com ela?

Apaixonar-me em pouco mais de dois meses quando nunca precisei desse sentimento em anos?

Eu não entendo.

― E há um momento que você só consegue parar e pensar: “Por que você demorou? Eu estive aqui por tempo demais”. Eu disse que vocês fazem parecer que o mundo é um lugar melhor, mas sobre se apaixonar? Amar romanticamente alguém real, alguém que vale a pena?

Ele meneou a cabeça.

― É descobrir seu próprio mundo dentro de você e querer torná-lo o mais bonito possível para mantê-la. Porque você nunca quer parar de sentir a vida acontecendo através desses sentimentos bem ali, tudo dentro de você.

Porque você nunca quer parar de sentir a vida acontecendo através desses sentimentos.

― Eu acho que todo o tipo de amor é válido. Os breves, os memoráveis, os impossíveis. Nós sempre aprendemos algo. Perdemos, mas também ganhamos de algum modo. ― Ele olhou para mim, os orbes suaves de uma maneira que poucas vezes acontecia. ― Mas quando você sabe, você sabe. Pode demorar em ver isso aqui ― ele apontou para sua cabeça e, em seguida, pressionou o indicador em seu peito ―, mas essa porra aqui sempre sabe.

― Então ― foi a minha vez de pigarrear nervosamente ―, acho que estou me apaixonando.

― Já era hora, irmão. Já era hora.

Eu precisava admitir que aceitar isso ― se estivesse correto, porque eu não estava convencido ainda ― tinha certo charme. “Estar apaixonado”. Eu tinha certeza que mamãe teria o momento de sua vida se pudesse ter essa conversa comigo.

Pena que nunca aconteceria.

― Por favor, não a machuque ― eu me vi pedindo. ― Alyssa precisa de alguém que esteja lá para ela enquanto ela se reergue. Não a destrua. Eu não poderia te perdoar por uma coisa assim.

― E você não se destrua ― ele me nivela com um olhar duro. ― Eu não te perdoaria por isso.

Tarde demais.

esse capítulo é um dos meus favoritos. pela interação do ethan e da gwen (ele roubando beijo que nem um gurizinho), o momento dos três e LÓGICO, o que muita gente esperou em amnésia: a continuação da revelação dos 18 anos.

vocês esperavam essa reação do ethan? tão vendo como ele não é tão ruim como vocês condenavam? toda a história tem dois lados, né?

eu AMO AMO AMO a amizade johnethan. pena que... bom, vocês sabem como termina.

obs: a música do capítulo tem um significado especial. fala sobre a perda da inocência e como a gente acaba mudando, sendo obrigado a deixar nosso “mundinho” pra enfrentar o mundo real, onde as coisas boas parecem tão raras enquanto as ruins sempre tão por aí, esperando a gente dar um passo em falso. é uma música que quando ouvi na hora pensei nos personagens de TFF. cada um deles, e cada um de nós. :)

até o próximo (eu sei, tô atualizando rápido né!!!!!!?!!?!!!??)

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