Te ver partir

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Esse dia foi quando eu senti o gosto da injustiça.

O gosto amargo desse sentimento que te reprime.

Não se pode fazer nada contra ele.

E eu calei.

Porque agora não havia mais nada a ser dito.

E, nós?

E nós como futuro? 

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Ele saiu fechando a porta sem olhar pra trás. Sem ao menos dizer adeus. Suas costas escondiam o que eu não suportaria ver, mas que decifrei pelo som da sua voz atordoada. Seu tom de raiva, sua boca que antes de ele se virar revelava aquele tremor que antecedia o seu choro. Eu era tão culpada, sentia-me como se estivesse quebrando uma promessa, como se meus pés não estivessem mais no chão. Eu podia sentir as paredes desmoronando a minha volta a partir do momento em que ele bateu a porta. E eu, novamente só, num pesadelo cinza. Em um país estrangeiro, não sabia onde ele poderia ir, não sabia por onde percorrer para encontrá-lo, para estar ao seu lado. A única coisa que estava ao meu alcance agora era me deitar e esperar pela sua volta, esperar pela sua voz. Não vim até aqui para desistir agora, mas sinto que não há nada que possa fazer nada. Já falei com a verdade, encarei os seus olhos, chorei as minhas angústias. Abri meu coração.

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Saí daquele quarto sem olhar pra trás.

Meu coração batia forte e eu ainda podia ouvir o seu choro intercalado pela sua voz de desespero. Depois de tanto tempo eu aprendi que o nosso amor não era feito de intervalos. Ele nasceu para ser inteiro, ele nasceu para ser verdadeiro. Por isso, eu estava tão magoado. Não podia lidar com isso agora. Perdido no tempo e também no espaço procurei não voltar. Precisava de um lugar que me oferecesse respostas para tantas coisas. Diferente do que pensavam, eu não era mais o mesmo menino, aquele que recebia ordens e as cumpria imediatamente, sem reclamações. Pelo meu tempo de carreira, pelo meu histórico como artista, eu sabia que tinha discernimento para opinar, para escolher o que era bom e o que era ruim para mim. Cansei de fazer tudo que me mandavam, de cantar as músicas que ordenavam, de fazer aquilo que era "melhor para todos".

Estava na hora de pensar no que era bom para mim... e para ela. Sim, apesar de todas as dúvidas eu a incluía como parte de mim. O melhor para nós agora era ficarmos longe um do outro? Porque para mim essa foi a escolha dela!

Peço uma bebida e procuro por alguém conhecido. Avisto um grupo de garotas que não me eram estranhas. Aproximo-me sem medo, afinal, sempre fui bom nisso. Converso um pouco, danço, sem segundas intenções.

Mas... que eu estou fazendo?

Me afasto e procuro um refúgio, apesar de saber que naquele lugar não ia encontrar moradia necessária. Jogo um pouco de água fria em meu rosto e sinto-me invadido por um sentimento de perda.

Eu não sei bem o que era isso, mas parecia ser...

Deixa pra lá...

Chega de me enganar.

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Desiludida e invadida por um sentimento inigualável de dor, visto-me para dormir. Estava na hora de seguir. Seguir além de ti, seguir sozinha, porém acompanhada de alguém que era mais forte que tudo e que por experiência própria você já sabia quem era. Esse alguém era você mesma. A única que sabe de tudo que se passa, a única que sabe da história verdadeira de vocês. A única que pode chorar, rir, gritar, implorar, ir e voltar. A pessoa por quem você esteve todo esse tempo esperando. A única que completa a ti mesma.

Essa pessoa sou eu.

Eu sei bem o que estou fazendo aqui. Estou aqui para mostrar a mim mesma que independente das minhas decisões, eu posso seguir. Estou aqui porque eu sei que sou capaz de aguentar a sua ida e a sua volta. E que o meu coração, apesar de não pensar em bater somente por amor é acompanhado pela minha mente que me diz a todo momento: você pode seguir...

Ou até mesmo: você ainda é capaz de seguir. Sem ele?

Eu consigo me convencer de que não sou tão insegura.

Consigo facilmente me livrar das dores de amor.

Por meio da música, pela arte que mora no meu sangue, por meio de amigos, pela minha família...

Eu sigo, demora um pouco, mas eu sou capaz;

Eu sempre fui!

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Gostaria de ter a certeza de que eu consigo viver sem ela. Ou de que eu consigo seguir sem ela. Mas eu não tenho. Posso parecer seguro, posso ser o galã, o príncipe encantado de milhares de mulheres, mas eu não sou quem eu quero ser sem ela. Talvez por isso, eu tenha demorado algum tempo para entender tudo isso. Talvez por isso eu ainda não entendo. Como alguém pode abrir mão dos seus sonhos por isso? O que eu não sabia é que talvez esses eram seus sonhos também. Ser, finalmente, idealizadora, compositora, cantora, atriz e protagonista de uma novela. Talvez, Dulce Maria, eu tenha te subestimado. Não te diminuído. Talvez, eu tenha pensado que você se contentaria com algumas composições para o RBD...

E nesse momento, foi quando eu compreendi que você era muito mais.

Muito mais do que uma menina sensível que escrevia poemas.

Você tinha se tornado uma mulher, capaz de assumir seus atos e de aceitar coisas que muitas artistas não aceitariam por falta de coragem.

Com isso, você me mostrou o quanto era a pessoa com quem eu queria viver junto. Eu que sempre falei de coragem, de assumir as coisas, de bater de frente com o mundo, me vi confrontado com a tua coragem de levar um projeto nas costas, um projeto todo sozinha, isso mesmo, porque essa novela só é possível por tua causa. E eu poderia ter sido uma base para você nessa empreitada e por falta de companheirismo que na hora, não fui capaz de ver, te deixei sozinha.

Comecei a entender que o amor não é apenas aquilo que você quer que as pessoas façam por ti, mas é muito mais aquilo que você quer que as pessoas façam por si mesmas.

E foi nessa hora que eu voltei.

Foi nessa hora que eu comecei a lutar por nós dois.

Antes, pouco eu tinha feito.

Agora, eu sabia, abandonar o meu egoísmo e estar ao teu lado.

Eu te amo, eu te amo...

Agora eu sei.

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Disfraces y Antifaces (Português)Where stories live. Discover now