39. Todo o mundo precisa saber

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 - Calma. - sussurra Léo.

Hugo olha para o rosto do mecânico, enquanto ele o carrega no colo pelos corredores. Entram numa Enfermaria iluminada apenas por uma fraca lanterna e Léo o senta numa cadeira. Sara, que estava sentada na maca, se levanta e vai até eles.

 - Hugo? Você está bem? - pergunta ela.

Hugo tenta responder mas a sua garganta dói terrivelmente para que ele o faça. Seu rosto treme, triste, e ele olha para Léo.

 - Tomas quase o enforcou. - diz Léo. - Ele vai precisar de um tempo.

Ele se vira para se afastar, mas Hugo segura sua mão. Léo olha para ele, as marcas roxas em volta do pescoço, os olhos avermelhados e lacrimejantes.

 - Oh. - faz Léo, se abaixando e o beijando, devagar. Hugo retribui o beijo, a mão que o segurava entrelaçando os dedos. O calor conhecido de Léo, seu cheiro... Léo se afasta, devagar, e passa a mão em seu rosto. - Eu vou cuidar de você. Daqui a pouco.

Ele se levanta e vai para a maca, onde Sara se deita minutos depois. Sentado em sua cadeira, Hugo observa enquanto Léo faz o mesmo procedimento que haviam feito com ele, mas ele percebe que Sara reclama bem menos da dor. Léo faz todo o procedimento sem olhar diretamente nos olhos de Sara, mas ela o encara durante todo o tempo, até ele terminar o curativo.

 - Obrigado. - ela sussurra.

Depois disso, e de cuidarem do pescoço de Hugo, os três andam pela nave, recolhendo os corpos dos amigos e de Tomas. O rosto estraçalhado de Laura, as feições azuladas de Onyx. Léo sente cada parte do seu ser tremer enquanto eles carregam os corpos para a Geladeira, pousando-os no chão e cobrindo-os com os lençóis dos dormitórios. Quando cobrem o último, ficam parados lá, observando as silhuetas escuras e frias que a luz das lanternas criam. E então Sara cai de joelhos no chão.

Ela não chora e não treme e não esboça nenhuma reação. Mas é como se toda a força do seu corpo tivesse se esvaído.

Hugo olha para ela. Ao seu lado, Léo se abaixa também, se ajoelhando próximo à capitã.

 - Não foi sua culpa, Sara.

As palavras dele ecoam na sala, mas não parecem surtir efeito nela. Seu olhar continua apático.

 - Você tomou as atitudes que achou certas para proteger a todos. Nunca deixou de ser profissional ou de seguir o regulamento.

 - Talvez esse seja o problema.

 - Não foi um problema, foi o certo a fazer.

Ela levanta os olhos. Léo sorri e estende a mão para ela.

 - Estamos vivos. - diz. - É o que importa.

Ela segura a mão dele e se olham, em respeito e apoio mútuos. Hugo se abaixa também, com dificuldade, e se aproxima deles. Coloca a mão sobre as mãos dos dois e sua cabeça pousa sobre o ombro de Léo. Ficam um tempo assim, depois soltam as mãos, mas continuam em silêncio. É como se a paz fosse uma espécie de torpor que os envolve.

Sara tamborila os dedos no chão, pensativa. Hugo está com os olhos fechados, enquanto o rosto de Léo está em seus cabelos.

 - E então? - diz Léo. - O que a gente vai fazer quando chegar em Marte?

Hugo levanta a cabeça, olhando para ele e depois para Sara. A capitã balança a cabeça.

 - Todo o mundo precisa saber. - diz. - Todo mundo.

Hugo assente. Abaixa os olhos ao sentir a mão de Léo apertando a sua. Léo dá um sorriso leve para ele.

Fora da Geladeira, a nave está banhada na escuridão, corredores com manchas de sangue vermelho vivo em meio as paredes frias. Na Comunicação pode-se ouvir um chiado nos fones, enquanto a nave da NewSpace se aproxima da M09-2140.



FIM

AMONG US - A tramaWhere stories live. Discover now