Yousef (2a parte) Cap. 3

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O vento soprava na face de Yousef, singularmente indelével e carinhoso como o faz quando pela frente se apresenta apenas a idílica estrada do destino. Quando assim é, o asfalto parece que desaparece por magia sob o nosso olhar. Os carros não têm mais rodas, antes voam como pássaros velozes acelerando em direcção ao novo mundo que se ergue diante da vista. Yousef atravessava o imponente e agreste desfiladeiro de Khyber. Para trás ficava o Paquistão e o destino era agora, finalmente, o Afeganistão e a efectiva participação na guerra ao lado do povo afegão. Mais do que isso, a defesa de todos os muçulmanos, de todos os oprimidos. Quando uma fé assim tão forte invade a alma e se consegue finalmente galgar o derradeiro obstáculo em direcção ao tão almejado objectivo, o universo inteiro dá a impressão de ter conspirado anos a fio para nos conduzir até ali, exactamente naquele dia, exactamente naquele momento. De tal modo tudo parece tão perfeito que até as cores e as formas parecem mais nítidas e vivas. É a êxtase da alma esculpindo um cenário de sublime perfeição, a sensação de tudo estar no lugar certo. Momentos como este, para Yousef, sempre foram também encarados como marcos capitais da sua história de vida e levados muito a sério espiritualmente, sendo acompanhados sempre de profunda introspecção. Tinham o condão de lhe provar que estava a seguir o destino tal como Deus o ordenava. Constituíam, em si próprios, uma prova suprema e insofismável da existência e grandeza de Deus.

No dia em que atravessou pela primeira vez o desfiladeiro de Khyber para se tornar um verdadeiro mujaedine na jihad afegã, Yousef sentiu-se em total comunhão com Deus. O Sol brilhava forte e radioso em todo o seu esplendor, cobrindo toda a paisagem agreste e montanhosa com uma luz muito branca e espalhando o seu intenso calor. Yousef cerrou as pálpebras e procurou concentrar-se, apesar dos constantes solavancos do seu transporte. Procurou a união com Deus, procurou o coração e sentiu-se verdadeiramente livre. Nem nas maiores vitórias da campanha que se avizinhava sentiu algum dia aquela mesma sensação de plenitude, tão livre e solto. Neste contexto a morte tornava-se menos importante do que o destino ou do que a suprema glória de saber-se nas mãos de Deus. A morte chegaria se Deus assim o quisesse, mas Yousef tinha agora toda a fé do mundo de que chegaria até ela cumprindo a Sua vontade. Isto livrava-o de toda e qualquer preocupação, fazendo-o flutuar no limbo dos heróis. Avançava de olhos fechados, sem medo e sem hesitação.

O Milagre de YousefDonde viven las historias. Descúbrelo ahora