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— Ae, por que você não falou que ia matar o treino?!

Próximo das oito horas da noite, a porta do quarto abriu e um garoto infantil adentrou em meio a uma sequência de reclamações. Uma mão estava carregando a própria mochila, a outra puxava as meias dos pés, e sua boca disparava coisas sem sentido pelo ambiente estreito. Era sempre tão irritante ter que dividir o quarto com ele! O outro rapaz presente no cômodo faria de tudo para impedir aquela voz de continuar falando sem parar.

— Você consegue imaginar quão péssimo esse dia foi para mim? Depois que a gente se separou, eu fui tentar encontrar algo para comer. Eu não ia conseguir aguentar aquela aula chata de hoje à tarde, então corri para comprar alguns salgadinhos e só depois fui para a sala. Porra! Quando eu estava comendo, quietinho no meu canto, a professora conseguiu cheirar a minha comida, cara! Ela ficou gritando comigo por, sei lá, uns trinta minutos, falando sobre como era um absurdo eu não conhecer as diretrizes da faculdade. Como se isso não bastasse, a gente estava tendo uma aula com a turma do Departamento de Artes, e adivinha só? Eu fui forçado a fazer um trabalho com um grupo de estudantes que eu nem conhecia! Puta que pariu! A garota escolhida para ser minha dupla podia até ser fofinha, mas era tão insuportável! Toda atrevida, falando comigo sem respeito algum e me enchendo de ofensas! Sério, eu quase não consegui aguentar!

— O quê? — resmungou Ae, sem ter real interesse no assunto, enquanto jogava alguma coisa no computador equilibrado sobre o colo. — Ela te xingou?

Pond desabou o corpo em sua própria cama, alinhada de forma paralela à do colega.

— Sim! — exclamou, a indignação genuína. — E o pior de tudo é que o meu primeiro pensamento realmente foi sobre o quanto ela era bonitinha. Depois disso, fui tentar puxar um papo, porque, com esse rosto lindo que eu tenho, seria impossível não querer falar com ela, né? Só que eu ainda nem tinha aberto a boca quando a garota chegou toda irritadinha e falou: "Foi mal, mas você não consegue ver que eu estou tentando ouvir a aula? Tudo bem que você chegou atrasado, mas não deveria ficar comendo tão alto aqui do meu lado. A professora já desperdiçou um tempão para te dar uma bronca desnecessária, então, se a aula passar do horário, vai ser por sua culpa". Puta merda, o que eu fiz de errado?! Ae, por tudo que há de mais sagrado, me diga o que eu fiz de errado?!

Tudo o que Ae conseguiu pensar foi que Pond não deveria ser metade italiano, mas metade animal. Era inacreditável que um universitário como ele estivesse batendo as pernas no colchão de sua cama apenas por causa de uma briga com uma garota do Departamento de Artes, exatamente como um moleque de três anos faria.

— Como uma simples garota foi capaz de escolher palavras tão perfeitas para dizer a você? — Ae, imune às besteiras incessantes de seu amigo, acabou dizendo isso com os olhos ainda vidrados na tela do computador.

Sentia-se preguiçoso demais para dar tanta atenção assim a Pond, mas não perderia a oportunidade de provocá-lo. E a provocação, de fato, funcionou.

— Por que você não está ficando do meu lado, huh? Ela praticamente me chamou de surtado!

Finalmente, Ae ergueu os olhos pequenos para o outro lado do quarto, fechando a tela do computador portátil.

— Eu concordo com absolutamente tudo o que ela disse — declarou, levantando-se para pegar uma toalha de banho e ir até o banheiro.

— Você é um péssimo amigo! — gritou Pond. — Você nunca toma as minhas dores! Eu espero que você seja acertado bem no meio da bunda!

Batidas fortes na parede interromperam os gritos do garoto exageradamente dramático, obrigando-o a morder os lábios.

Porra, Pond! — Pôde ser ouvido do quarto vizinho, a voz abafada pela camada fina que separava os quartos. — Cala a boca! Eu estou tentando ler!

Love by Chance (pt-br)Onde histórias criam vida. Descubra agora