16 - What if I told you a story?

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- Ruel?

Ele abre os olhos vagarosamente.

- Clary? - Ruel sussurra.

Ela congela ao ouvir o apelido. Aquele velho apelido. Não o escutava há tanto tempo.

- O que foi? - ele continua.

- Você desmaiou e o trouxeram para o seu quarto.

- Sei o que aconteceu, estava me referindo a senhorita. O que faz aqui?

Clarissa fica sem jeito.

- Eu-hãm-estava apenas verificando se o senhor estava bem, já estou de saída, chamarei o médico.

- Não! Por favor, não. Estou bem.

- Ruel...você literalmente desmaiou. Alguns dias a mais e poderia ter morrido. - Clarissa estremece com a ideia.

- Já estou acostumado, nada que o tempo não cure.

- Já está acostumado?

- Sim, como acha que ganhei isso? - ele aponta ironicamente para o lugar do ferimento.

- Então quer dizer que conseguiu uma segunda chance e irá jogá-la fora por puro orgulho?

- Orgulho? Claro que não, quero apenas voltar para casa logo.

Mas você está em casa, Clarissa pensa.

- Não irei lhe atrasar novamente então, tenha uma boa viagem de retorno. Se quer se matar, prefiro não estar por perto.

Ruel olha rapidamente de relance para a outra porta de seu quarto que levava a um outro corredor da casa e vê Anthony na porta, observando, com um olhar ameaçador o lembrando da conversa que tiveram há alguns dias. Meu Deus! Aquele homem sim era insistente. Porém, a aparição repentina do mordomo o fez refletir. Talvez ele estivesse certo, talvez ainda tivesse alguma chance com ela se ficasse. Não. Pare de pensar isso. Ruel não planejava tomar a futura esposa de ninguém, muito menos de seu melhor amigo. Por mais que no momento em que descobriu sobre o noivado ele tenha quase matado Joshua, o cavalheiro não tinha culpa, eles realmente achavam que Ruel estava morto, não dava para julgá-los por seguirem em frente. E seria exatamente isso o que Ruel tentaria fazer, estava decidido - em apenas alguns milésimos de segundos ele finalmente chegou à uma conclusão em sua cabeça - ele ficaria. Era melhor tê-la por perto do que passar o resto de sua vida tentando esquecê-la a centenas de quilometros de distância. Não tentaria reconquistá-la, iria apenas desfrutar de sua presença.

- Lady Williams, espere! Por favor.

Clarissa para e se vira para ele, com uma cara nada feliz.

- Desculpe pela forma que venho lhe tratando e me comportando. A senhorita tem razão, eu não estava sendo nada elegante. Eu só...não estou em um bom momento, - ele mente - a guerra está me deixando louco.

Clarissa sente um aperto no coração. A guerra. A mesma guerra que os separou definitivamente, que a levou a pensar que ele estava morto. Que a levou a tentar seguir em frente.

Ela força um sorriso de compreensão, mas não diz nada, ainda visivelmente irritada.

Um silêncio constrangedor se instaura entre os dois por alguns segundos até que Ruel o quebrasse.

- Então...quando soube?

- O que?

- Quando soube que Joshua era a pessoa certa para você.

Clarissa estranha a pergunta e deixa isso totalmente explícito em seu rosto.

- Quero dizer... - ele tenta arrumar alguma desculpa em sua cabeça - deixei uma pessoa para trás em Amsterdã. Estava pensando em...a senhorita sabe...pedir sua mão. Talvez tenha alguns conselhos.

Clarissa tentava negar, enterrar e esconder aqueles sentimentos de si mesma, mas nunca conseguiria enganar seu coração, que quebrou ao ouvir tais palavras.

- Oh...sim...claro. — ela suspira ao lembrar do noivo — Quando percebi que ele sempre estava lá por mim.

Ruel nunca mais conseguiu estar lá por ela.

— Ele me abraçava quando tudo parecia estar desmoronando.

Ruel estava a centenas de quilômetros de distância de seus braços.

— Ele me trata como uma dama deve ser tratada, e me respeita. Acredito que seja o suficiente para ter certeza.

Seu conceito de amor é o básico de como se deve tratar uma mulher? Ele pensa. Eu poderia lhe dar o mundo, o mais profundo dos sentimentos, a maior das alegrias, poderia te dar muito mais do que imagina, muito mais do que espera. E mesmo assim, não seria o suficiente para expressar o quanto ainda a amava.

Pare com isso, Ruel. Ele diz para si mesmo em sua cabeça. Você ouviu a mãe dela, não acabe com sua reputação ou seu futuro. Você não pode fazer isso, não pode tê-la.

— Entendo.

Outro silêncio.

— Se quiser saber o porquê do meu desaparecimento... — ele resolve selar o relacionamento dos dois somente à amizade. Seria melhor assim. — Durante a guerra encontrei uma dama e...bem, nós acabamos tendo algo. Nada mais aconteceu depois disso, estava em um momento delicado. Após o ocorrido senti como se tivesse lhe traído, não conseguia mentir para você, então decidi que seria menos doloroso para a senhorita se eu apenas me afastasse. Entende?

Clarissa não acreditava no que ouvia. Sim, queria uma explicação do que havia realmente acontecido, mas esperava tudo, menos aquilo. Cada palavra parecia mentira. Ela sofreu anos de sua vida esperando por ele para que no final ele simplesmente a ignorasse propositalmente por ser um completo covarde?

Clarissa não diz nada.

— Seguimos em frente, certo? — ele pergunta — Quero dizer...agora a senhorita está com Joshua.

— C-claro. — ela se força a dizer — Seguimos em frente.

— Seguimos em frente...

Poderiam fazer uma coleção de silêncios constrangedores, acrescentariam esse à lista.

— Bem, — Clarissa diz — espero que faça a escolha correta com a dama. Se serve de conselho, uma vez alguém me disse que as vezes o que queremos está bem à nossa frente, só não conseguimos ver.

— Essa pessoa foi muito sábia no que disse.

Ela abre um pequeno sorriso.

— Obrigado. Pelos conselhos. — Ruel acrescenta.

— Não foi nada. Espero ter ajudado, de verdade.

Agora era Ruel quem sorria. Pela primeira vez em anos, Clarissa o vira sorrir.

— Tenho que ir, está ficando um pouco tarde. Mamãe me matará se eu forçá-la em sua casa por mais tempo do que o necessário para uma visita.

— Tudo bem. Foi bom vê-la novamente.

— Digo o mesmo para o senhor. — ela se abaixa em um cumprimento — Com licença.

— Toda.

Clarissa se vira para sair do quarto até que subitamente volta em direção à ele.

— Ah, e Ruel, já ia esquecendo...

— O que?

— Bem vindo de volta.

Ele sorri, mas dessa vez era um sorriso genuíno. Talvez o maior que tenha dado desde que retornou à Londres.

— Obrigado.

E então ela se retira do cômodo.

Ruel fica sozinho, deitado em sua cama, olhando para o local no lençol em que Clarissa estava sentada.

Um barulho desperta sua atenção para o lado esquerdo do quarto.

Era Anthony olhando para ele, em pé na porta feito um fantasma. O mordomo então abre um sorriso e faz um sinal de...positivo?

Estava deixando claro que aprovou suas últimas escolhas.

— Anthony! Saia daqui!

O homem mais velho agora estava rindo.

Through the time • RuelOnde as histórias ganham vida. Descobre agora