Capítulo I. Véu negro

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Youra

"Está rolando um boato de que você gosta de meninas"

"— So Ah"

Eu olhei de soslaio para minha amiga. Os olhos pequenos e cansados, o corpo magro, porém esbelto, e o cabelo tingido de castanho claro amarrado no alto de sua cabeça somente eram evidências de que apresentava uma beleza heteróclita. Fiz um esgar e dei a ela um sorriso de escárnio.

Não me surpreendia com o boato. Desde o momento que eu entrei naquela escola, há um ano, houve poucos momentos em que eu estava conversando com alguma garota, e, de certa forma, agia sem naturalidade perto delas, a única que se aproximou definitivamente de mim foi So Ah, infiltrando-se em meio aos grupos do colégio com sua personalidade magnânima.

"Youra, é verdade", So Ah murmurou entre os lábios quase fechados ao meu lado. Impávida, ela apontou para um garoto mais ao fundo da sala dormindo, que entre os livros, fingia lê-los. Foi ele que começou com os rumores., pensei rapidamente. "Ele é um idiota", sussurrei de volta.

"Mas é verdade esse boato? Você é?"

Antes de poder respondê-la. Vi-me no centro das atenções da sala, o professor de biologia me olhava longamente, impassível. Ele se inclinou na minha direção e retirou de forma cuidadosa o papel entre meus dedos, escrutinando por um longo momento antes de amassá-lo.

Com o olhar sobre o livro, ele me devolveu um sorriso inescrutável.

— Senhorita Park — o professor disse pausadamente. —, poderia me dizer por que os cientistas têm tanta dificuldade em dizer se um vírus é um ser vivo ou não?

A luz do sol da manhã se infiltrou pelas cortinas transparentes da sala e se desenharam como pernas de aranha pelo lugar. Um vento silencioso adentrou e o frêmito de medo reverberou no meu âmago mais profundo. Suspirei e mordi o lábio inferior, procurando por entre minhas anotações alguma resposta.

Mas era claro.

Eu não anotava absolutamente nada.

Eles não conseguem se reproduzir sem um hospedeiro e não tem metabolismo próprio. — Uma voz baixa sussurrou atrás de mim.

Olhei de soslaio e reconheci a garota, Mi Hee Kim. Ela se encolheu na cadeira quando o professor passou por mim e arqueou uma das sobrancelhas, satisfeito com a resposta.

— Obrigada pela resposta, senhorita Kim. — Namjoon, o professor, disse apoiando sua mão no encosto da minha carteira. — No entanto, a pergunta foi para a senhorita Park. — Ele virou-se para mim e disse em um tom quase inaudível. — Gostaria de conversar com você após a aula.

Assenti para ele e voltei meu olhar para a lousa quase completa, aprumando minhas costas sobre a carteira.

— Os vírus são divididos em retrovírus, os quais possuem RNA como material genético... — Em voz diáfana, Namjoon voltou ao seu posto como professor e deu continuidade à matéria.

Não era fácil começar em uma escola de uma forma tão repentina, com pais ausentes quase cem por cento do tempo e mudanças constantes, já havia me acostumado a perder as pessoas antes mesmo de poder conhecê-las. Era uma vida tonitruante, porém, aos poucos, eu consegui me adaptar a ela.

A cidade litorânea atual em que eu estava, oferecia um ambiente inóspito e destoante de seu clima, quase sempre apresentando um céu de porcelana. Em minha chegada há um ano e poucos meses, apenas duas pessoas se mostraram cheias de amabilidade ao me receber e insistir em ficar ao meu lado: So Ah e Hoseok, este se distanciou parcialmente quando um interesse curioso surgiu em nossa colega de classe, Mi Hee Kim.

Fotografia DesbotadaWhere stories live. Discover now