Dantálion [COMPLETO]

56.

Mesmo assim, não consegue se livrar do peso em seus ombros.

Ele agora odeia cada um dos Auxiliadores. Odeia o pai. Odeia a si mesmo. Odeia aquela cidade e tudo que existe nela. Odeia a Voz.

Quando as portas do Templo se fecham atrás de si, ele recosta numa das paredes, aproveitando o tempo de solidão para planejar seus próximos movimentos.

É preciso novamente apertar o povo, criar algum outro tipo de lei estúpida e insignificante, apenas para deixá-los a ponto de explodirem contra ele. Isso seria fácil, bastava obrigá-los a trabalhar mais ou a pagar mais impostos.

O que o preocupa não é a Audição, mas sim o que fará depois dela.

Em suas mãos ele aperta o frasco que havia aparecido em seu quarto na noite passada.

O líquido transparente parece ser apenas água. A única diferença, porém, é que quem o tomasse não teria mais do que cinco minutos de vida restantes.

A ideia de ter em suas mãos um líquido tão poderoso o enche de pavor. Ele suspira, fechando os olhos, por um momento pensando em como seria mais fácil retirar a tampa do frasco e bebê-lo ele mesmo. Em cinco minutos, todos os seus problemas estariam resolvidos, e todo seu sofrimento teria fim. Não seria responsável pela morte ou dor de mais ninguém. Morrer seria uma boa solução.

Mas não pode.

Dantálion estava certo quando lhe disse que iria querer morrer e não poderia. Não poderia abandonar o jogo antes do fim. Não poderia destruir os planos dos Surdos e de Dantálion. Jogar sua vida fora seria jogar a de todos eles.

A imagem do garoto aparece em sua mente, lançando pontas de gelo em seu estômago.

Como poderia pensar em se suicidar quando seu único amigo precisava tanto dele? Como poderia partir, deixando o garoto com seu coração ainda mais partido, ainda mais aniquilado pelo sofrimento?

Ele teria de ser forte. Teria que viver e vencer. Por Dantálion.

Mas, para viver, precisa matar o próprio pai naquela noite.

Sente vontade de chorar com a pressão que aperta seu peito, mas seus olhos estão secos. A represa de sentimentos dentro de si havia secado completamente. Ele era agora um solo duro e vazio, trincado por enormes gretas. Era um resto de si mesmo, algo inferior a um ser humano, e ainda era tão jovem...

E ainda nem tinha feito o que estava prestes a fazer.

Havia se tornado duro, mas não havia se tornado forte. Prova disso era que seu tempo estava acabando, e ainda não tinha pensado em nada.

Suspirando mais uma vez, ele se levanta, guardando o frasco novamente no bolso.

O que tinha de fazer não poderia ser planejado por uma mente fraca como a sua. Teria que ser planejado por outro. E sabia muito bem quem era esse outro.

Lúcio caminha na direção das portas, abrindo-as.

O céu está mais escuro que antes, um vento sinistro entortando as copas das árvores.

O Sacerdote se aproxima do Púlpito, transfigurando-se em uma pessoa simpática e magnética, abrindo um sorriso e as mãos, e falando com uma voz serena e firme, totalmente destoante de seus pensamentos:

- Irmãos, mais uma vez a Voz falou comigo, trazendo uma mensagem muito importante para todos nós! A Voz nos alerta sobre os tempos difíceis que estamos passando, e sobre uma praga que se aproxima para destruir nossas colheitas! Para afastar esse mal, a Voz nos orienta a dobrarmos a colheita do próximo mês. Portanto, os agricultores deverão aumentar as horas de trabalho e dedicar ao trabalho também o seu dia de descanso. Sei que isso é um grande sacrifício, mas tenham em mente sempre o bem-estar de todos nós! A Voz e o Palácio agradecem seus esforços, e prometemos recompensar a todos vocês!

Ele se afasta, ouvindo os murmúrios de desgosto.

Um calafrio sobe por seu pescoço, alertando-o do perigo que corre ao virar as costas para uma multidão que sussurra palavras de ódio contra ele.     

Fala, galera! Estão gostando do rumo que estamos tomando?? Então apertem os cintos, porque lá vem bomba...

Não deixem de votar em todos os capítulos, ok?? Ajudem Dantálion a subir.

Mais do que nunca, ele é necessário.

Não deixem que o fascismo vença.