- Será que vou receber alguma explicação sobre isso? – pergunta o garoto, deixando os galhos caírem sobre o chão.

O Sacerdote não responde, milhares de pensamentos surgindo e desaparecendo de sua mente numa velocidade impossível de acompanhar. Notando suas emoções alteradas, Dantálion se aproxima.

- Diga o que aconteceu, Moloque. De quem está se escondendo?

Ele não tira as mãos do rosto para responder:

- Alguém no Palácio sabe.

O outro fixa os olhos atentos sobre ele.

- Quem?

- Meu Auxiliador pessoal.

- Vero?

- Sim.

Dantálion suspira, relaxando o corpo, e volta a pegar os galhos que tinha derrubado para montar a fogueira.

- Não me assuste desse jeito.

- Você não tem nada a dizer?!

- Vero é um dos nossos. – responde, sem olhar em sua direção – Pensei que você já soubesse.

- Vero é da Ordem dos Surdos?!

A imagem do Auxiliador, fraco e idoso, vestido em um manto preto e descendo pelo poço, não lhe parece muito plausível.

- Não exatamente. Ele costumava ser, antes da Limpeza. Mas depois fez um acordo comigo.

- Que acordo?

- Um acordo simples. Ele não fala nada, e nós também não.

Dantálion para o que está fazendo por alguns segundos, refletindo sobre algo com um sorriso malicioso.

- Na verdade, o acordo tinha mais uma condição...

- Qual?

Ele vira as costas para a fogueira que estava armando, batendo as mãos uma na outra para se livrar do pó.

- Você. Você é o termo principal de nosso contrato.

- Como?

- Não é difícil imaginar. Você é o Sacerdote.

Dantálion o observa com expectativa.

- O acordo era você não me matar?

- Desnecessário. – vira-se o outro – Eu não ganharia nada matando você.

- Mas fez o acordo mesmo assim?

- Vero não queria ceder de jeito nenhum. Eu precisava do apoio dele.

- Então você ameaçou me matar para conseguir que ele te apoiasse?

- Sim. - sorri - E ele acreditou até a última palavra.

- E por que ele cederia por minha causa?

- Não sei. – ri, um brilho maldoso no olhar – Provavelmente não foi por causa desse seu rostinho imundo. Vá se lavar logo, está me deixando com nojo. O que você estava fazendo, afinal?

- Nada.

- Nada?! Você viu o estado de seu rosto? – brinca, divertindo-se ao inverter a fala de Lúcio no dia anterior.

Seus olhares se encontram e permanecem fixos numa intensidade desconfortável por alguns instantes.

O Sacerdote desvia os olhos para um ponto invisível à frente, tentando encontrar alguma coerência naquilo tudo. Vero era diferente, sem dúvidas, mas ainda assim era um Auxiliador. Por que motivo um Auxiliador entraria para a Ordem dos Surdos? E por que ele teria que fazer um acordo com eles? Qual era a real ligação entre os Surdos e ele próprio, para que Vero tivesse que jurar protegê-lo? Para que Vero estivesse disposto a arriscar a própria vida para proteger a sua?

Dantálion [COMPLETO]Where stories live. Discover now