Capítulo 27 - Produção de afetos

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Já estávamos no primeiro fim de semana de Setembro e o clima ainda era de chuva e vento. Alguém como Cássio não se esquece da noite para o dia. Não por quem ele era, mas por quem eu fui quando estive com ele naqueles quase três meses de 2016. Eu não fui eu. Fugi totalmente de mim, dos meus valores, fui insana e mentirosa comigo mesmo. Pensei que era fácil enganar-me, mas não tem como. A gente não foge de si.

- Por onde anda Maria Clara? – Perguntou-me Letícia, enquanto digitava no computador. Era sábado e já havia virado rotina a sua presença em meu quarto, para pesquisarmos e discutirmos a respeito do seu livro, cujo nome ainda não havia decidido. Talvez Nascidos no Coração ou Gerados no Amor... Algo do tipo.

- Sei não, amiga. Ela sumiu. Nunca mais ligou, nem enviou mensagem. Não faço a menor ideia do que está acontecendo. É minha amiga, mas vou te contar... É sonsa viu?! Tenho sempre a sensação de que ela esconde algo. – respondi enquanto anotava em meu caderno diversas citações interessantes que poderiam servir para o livro. – E acho que eu também me ausentei demais. Não liguei, não fui lá...

- Ah, mas deve ser a mesma sensação de 98% das pessoas que convivem contigo. – ela virou a cadeira de rodinhas de frente para mim. – Não tem nem o que falar dela. Cada um tem seus mistérios, Jess.

- Tá querendo me dizer que tem segredo a me contar?

- Não. Justamente o contrário. – rimos. – Estou querendo dizer que tenho meus segredos e que são segredos. Se-gre-dos! E que não vou contar.

- Valei-me! Fiquei curiosa. – baixei a cabeça e continuei minhas anotações. – Mas me diz, o que vai fazer no feriado? Tem que agitar mais sua vida. Viver só de trabalhar, estudar e igreja não faz muito sentido.

- Não vou discordar. Israel tem uma casa de praia em Porto de Galinhas. Tem tudo! Não precisamos nos preocupar com nada. Estou pensando em irmos na noite da terça e voltarmos na noite da quarta. Quer ir?

- Se eu quero?! Com certeza! Só preciso resolver uma coisa, e finalmente poderei dizer que conheço o mar.

- O quê? Que não é da minha conta...

- Tenho provas a partir de quinta e combinei de estudar com Kauê na quarta, aqui em casa.

- Leva ele.

- À praia? Não, mulher. Precisa não. Ele nem conhece ninguém além de mim.

- Leva ele. Não aceito um não como resposta. Só precisa ver como ele ir, porque como Jonas não vai poder, só vai um carro. – ouvir falar de seu irmão me partia o coração e ao mesmo tempo colava os pedacinhos que o Cretino deixou. – E já tá cheio. Eu, Israel, você e meus pais.

- A família dele não vai não?

- Já foram ontem pra passar esse fim de semana e ficam até quarta. Aí tem vaga pra Kauê na volta.

- Hm.

- Ah eu nunca imaginei ter um namorado com uma família tão maravilhosa. – Letícia devaneou. – Eles são presente de Deus na minha vida!

- Também... Tu és uma santa. Devia ser canonizada. Você e Teresinha. Aquela ali já tem um passe direto para o céu.

- E como é que ela está? Foi para a casa dos filhos?

- Mulher, ela tá bem, viu. Mas essa semana me deixou meio preocupada. Baixou hospital. Hoje ela quis ir para um encontro de mulheres na igreja e fiquei meio temerosa, mas tá cheio de gente lá, né?! Então melhor eu não me aperrear com isso. Ficou de chegar umas 20hs.

Sexta às OitoWhere stories live. Discover now