O convite para o desfile. E lembrou de uma cena que havia acontecido naquele local a alguns meses atrás.

- Antes de irmos... - Disse enquanto se levantavam, fazendo Vitória voltar sua atenção à ela.

- Sim?

- Não quero fazer você me prometer nada, ok?

- Ok...

- Quero que esteja aqui no ano que vem.

- Eu prometo estar aqui no ano que vem. - O sorriso que deu, refletiu em Ana.

Não havia se esquecido de sua promessa um dia sequer e aparentemente nem Ana. Não esperava que ainda estivesse convidada, embora houvesse acabado de um modo em que não teve estranhamento de qualquer parte, não imaginava que Ana ainda a queria em seu desfile. Seu coração se encheu e moldou um sorriso aberto em seu rosto. Acompanhou de perto toda a expectativa que Ana tinha para o primeiro desfile única e exclusivamente seu, seus cuidados e preocupação para que tudo saísse como o planejado e até fez favores em relação a isso em São Paulo quando Ana já estava em Milão. Ainda era importante para Ana que estivesse lá e continuava sendo importante para si também estar lá. Não negaria esse convite. Havia prometido e não costumava não cumprir suas promessas.

Soube que Ana estaria voltando à São Paulo nessa semana através de Flávia, a amiga mantinha mais contato com Ana do que ela mesma. As poucas vezes em que falara com Ana nos últimos quatro meses fora apenas a mesma conversa que tinham antes, somente para saber como a outra estava. Nenhuma ousou tocar no assunto que ainda as assombrava e talvez fosse melhor assim, cutucar a ferida que custava sarar só faria sangrar mais.

Sempre acreditou que o tempo curava tudo. Era cheia de cicatrizes e Ana ainda seria mais uma, talvez a maior e a que ficaria mais evidente, porém não estava nem perto de a ferida ser fechada. Suas noites de sono eram sempre interrompidas quando acordava assustada depois de um sonho com Ana. Ecoavam em sua cabeça as palavras ditas uma vez a ela após esse ocorrido que se tornara frequente.

- Eu posso comparar você a um sonho. Um sonho bom. Talvez o melhor sonho da minha vida, do qual eu jamais quero acordar. - Trouxe Ana sobre seu peito, lhe dando um selinho e um beijo em sua testa após colocar seu cabelo atrás da orelha. Seus sonhos sempre traziam de volta uma nova versão de momentos que já vivenciaram juntas e servia como combustível que fazia funcionar a ilusão de que um dia poderia voltar a se tornar real. Ana havia colocado um sol em seus dias nublados e apesar de ter partido, deixara aquele sol ainda brilhando, embora os dias nublados ainda acontecessem, tinha a certeza de que o arco-íris voltaria e logo em seguida as nuvens escuras iriam embora.

Tinha a consciência limpa por ter sido um relacionamento tão bonito, por terem se encaixando de modo tão harmonioso e de terem eternizado como algo bom. Como Ana havia dito na última vez em que se viram na chamada de vídeo: se continuassem, iriam estragar o que havia sido ótimo e seria injusto demais para ambas que manchassem a tela em que desenharam aqueles meses juntas de modo tão caprichoso. Ainda usava o colar que Ana lhe presenteara numa madrugada que guardara em sua memória e em seu coração como uma das mais importantes durante o namoro.

- É para ter um pouquinho de mim com você.

- Já tem muito de você comigo, em mim.

E, de fato, ainda tinha.

Poderia tirar o colar.

Poderia jogar fora algumas coisas que Ana esquecera em seu apartamento, como a blusa que ainda usava também. Mas era impossível tirar Ana de si e mesmo se fosse possível, não queria. Sentia seu coração descompassado quando a melhor amiga surgia com algumas mensagens ou fotos enviadas pela ex namorada. Ana não havia perdido o brilho em seu olhar, sua vida parecia tomar o rumo certo mesmo que não estivesse junto nessa e a admirava tanto por isso. Ana, ao seu ver, tinha um espírito tão livre e era satisfatório vê-la honrar o que estava predestinada a ser. Ver sua liberdade fazia seu coração bater no ritmo que o seu amor por ela ditava.

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