Capítulo Quatorze

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Genevieve se viu a frente de algo que não pensou ser possível. Metros abaixo da terra, e ainda sim abaixo dela, uma cidade inteira parecia se estender até onde seus olhos podiam alcançar. Torres de vidro se erguiam ao longe, adornadas por casas, e pessoas. Centenas, milhares de pessoas transitavam por aquele lugar, em sua maioria homens, mas também haviam mulheres e até crianças.
- Venha - disse a voz do Rei atrás de si, tomando sua mão gentilmente.
Genevieve se perguntou como eles desceriam até lá, do que parecia ser um penhasco mas sua pergunta logo foi respondida quando o Rei a puxou para junto de si e eles saltaram, aterrisando suavemente sob o solo. Afastando se a uma distância segura de perguntas, Genevieve andou ao lado do Rei com os olhos atentos pelo lugar, bem iluminado com tochas de fogo no teto, além de lâmpadas a gás por cada lugar que passavam, ruas e esquinas. Haviam até mesmo árvores secas, sem folhas espalhadas por entre as ruas. Muitas pessoas reconheceram o rei, soldados que curvaram a cabeça ligeiramente, enquanto passavam por ele, em demonstração de respeito.
O Rei acatou os acenos, e apontou para Genevieve:
- Esse lugar começou a ser construído antes do reinado do meu pai, e foi finalizado no meu - disse ele, com uma ponta de orgulho - Fizemos de tudo para conseguir o aspecto de uma cidade, um lugar aberto onde os soldados podem ser livres, longes da luz do sol.
- É fascinante - Genevieve respondeu, e suas palavras nunca foram tão verdadeiras
- Temos de tudo por aqui. Salas e mais salas de armamento, suprimentos, e controle de guerra, mais ao centro da cidade, naquelas duas torres que são vistas daqui. É nelas que eu passo a maior parte do meu tempo, com o Conselho.
Genevieve concentrou sua audição ouvindo um tintilar pesado e constante.
- Aonde você está me levando? - Perguntou ela forçando um sorriso
- Numa parte bonita que me orgulho de ter construído - disse ele, direcionando até um ponto onde as árvores secas se concentravam, abrindo se num círculo. Genevieve se viu diante de um espaço amplo, repleto de flores, bancos e tochas a gás. O tintilar vinha de soldados, ao longe que brandiam espadas tão finas quanto agulhas, um contra o outro, pares espalhados lutando entre si.
- Temos o arsenal para treinamento específico, mas muitos soldados gostam de treinar ao ar livre e... - disse ele acompanhando o olhar de Genevieve, até se concentrar em um ponto que o fez congelar. Genevieve olhou para seu rosto repenrimente endurecido e novamente para onde ele olhava. Uma fonte em espiral jorrava água no centro da praça de árvores secas, e uma figura solitária estava sentada na ponte encarando o própio reflexo. Genevieve reconheceu os cabelos loiros presos delicadamente, os olhos distantes, o vestido palido e a coroa intrincada. A Rainha.
Por um momento ela teve esperança de que ela não os notasse, mas a sorte pregava peças em Genevieve. Seus olhos divagaram exatamente para o lugar onde estava ao lado do Rei, e logo os dois se viram interpretando um papel de mentiras.
O Rei abriu seu melhor sorriso e se encaminhou até a esposa.
- Ainda por aqui, minha querida? Pensei que você tivesse dito que ia descansar um pouco - ele tomou seu rosto em uma carícia e a beijou suavemente nos lábios
Genevieve observou tudo à distância torcendo para que seu olhar a queimasse a ponto de ela sentir dor e se afastar.
- Eu já estava de saída, só pensei em ficar por uns minutinhos - respondeu a voz de sinos da Rainha, olhando para alguém atrás do Rei, diretamente para ela.
- Não vai me apresentar a nova criada? - percebeu ela, olhando o com inocência
- Oh, essa é a senhorita Genevieve - começou o Rei com tom de desculpas - O Conselho surtou novamente, e fizeram tanta bagunça quanto um furacão. Acho que precisaremos de mais do que uma criada, para manter as coisas em ordem por lá.
- Eu faço o possível para fazer um bom trabalho - Genevieve cortou as palavras do Rei, afastando as pontas de seu vestido e curvando se para a Rainha - É um enorme prazer conhece lá, Vossa Majestade.
A Rainha sorriu com a reverência de Genevieve e Acenou para que se levantasse.
- Ela tem pontos garantidos comigo, só pela reverência - disse ela, olhando para o amado com um sorriso - Leve a até aquele seu maldito, Conselho e vá para a cama está bem? Vou estar esperando - despediu se ela com um beijo longo, antes de se colocar de pé. A Rainha tinha uma estrutura frágil e esbelta mais baixa do que Genevieve e ainda menor que o Rei. Quando ela passou por ele com os olhos brilhando em direção a Genevieve, logo tratou de lhe fazer uma ultima reverência. Ambos esperaram até a Rainha estivesse longe para voltarem a relaxar.
- Isso me pegou desprevenido - sussurrou o Rei quando se aproximou dela o bastante
- Imagine como deve ter sido para mim - disse Genevieve - Tive medo de que ela suspeitasse, e nos colocasse em risco.
Algo na expressão do Rei continha um desespero cheio de desejo, algo que lhe dizia que deveria toma lá no braços ali mesmo em público mas que ele resistiu brevemente.
- A Rainha é influenciável - disse ele num sussurro quase sem som - Mas não permitirei que encontros surpresa aconteçam outra vez.
Genevieve apenas assentiu, satisfeita, enquanto os sons de espadas preenchiam o ar.
- Vamos - sinalizou o Rei, por fim.
Genevieve avaliou o local uma ultima vez percorrendo o com os olhos, a fonte de água em que o menino protegido da Rainha fora assassinado, as árvores secas, os rostos dos soldados combatentes lutando com espadas ao longe.
Um par de rosto lhe chamou a atenção arrancando lhe de seu torpor, cabelos louros escorrendo pelo rosto e postura regia ao empunhar a espada, contra cabelos castanhos mais baixos, e ágeis movimentos de bloqueio, vindo de Hayden e Lancel respectivamente.
Ambos estavam bem vestidos, embalados por uma dança de espadas, defesa e ataque. Hayden parecia melhor do que Lancel, e atacava com destreza, enquanto Genevieve encarava dois dos homens que haviam mentido para ela.
Um golpe em falso fez com que Lancel perdesse o equilíbrio e fosse acertado pela espada agulha de Hayden atravessando seu peito. Lancel gruniu de dor, mas estava dormindo quando Hayden puxou a espada de volta, então eles se cumprimentaram com algo e uma nova figura entrou em cena, alta, musculosa e imponente. Travis, com sua espada de agulha. Hayden lhe lançou um sorriso de desafio e antes mesmo que ele tivesse que bloquear o primeiro golpe de Travis, Genevieve soube que ele iria perder. Travis era o melhor dos três.
- Senhorita Genevieve - a voz do Rei as suas costas lhe trouxe de volta a seu papel - O que está observando?
- Seus soldados - respondeu ela com uma dúvida - Eles estão sendo treinados para que?
- O quadro de soldados por aqui e bastante evolutivo. Trata se de quão bom a pessoa, é. Alguns do que estão treinando ali, são jovens e novos na corporação mas ja alcançaram um cargo de respeito.
Genevieve acompanhou os movimentos de Travis e Hayden enquanto Lancel observava ao longe, já recuperado e com um olhar de aprovação. Eles estavam se saindo muito bem, conquistando postos altos na guarda do Rei enquanto Genevieve ainda trabalhava nas cozinhas servindo como distração do Rei, momentaneamente. O ódio distorceu sua face num sorriso cruel, antes que ela se virasse.
- Vamos voltar para cima - anunciou ela
O Rei franziu o cenho delicadamente, mas ambos deram as costas para os soldados na direção da escada que leva a superfície. No meio do caminho, Genevieve quase pulou ao som de gritos raivosos e exigentes, ao longe. Ela virou seus olhos para o príncipe com uma pergunta no rosto enquanto ele pareceu repentinamente cansado.
- Esse prisioneiro está me fazendo perder a paciência a dias, um dos mais difíceis que eu já tive de lidar, em todo o meu reinado - ele apontou para um lado mal iluminado da cidade, adornado por tochas de gás e grades de aço, que se assemelhava a entradas para masmorras, protegidas por diversos soldados a frente - Sua revolta já lhe garantiu castigos severos de tantos oficiais, mas ele nunca se cansa. Eu ficaria grato em passar mais tempo na superfície longe o suficiente para não escutar seus escândalos. Genevieve lançou um último olhar severo para as Masmorras enquanto os sons estridentes de ódio ao prisioneiro continuaram, sem cessar. Aquele prisioneiro deveria odiar a prisão e consequentemente a coroa mais do que tudo.
Após fazer todo o caminho inverso, de volta a Catedral, o Rei fez questão de deixa lá no corredor a meio caminho de seu quarto.
- Ela com certeza está esperando por você - murmurou Genevieve pesando suas palavras e o envolvimento do Rei e da Rainha depois do que eles haviam tido
O Rei se curvou e parecia tentado a beija lá, mas acabou mudando de idéia.
- Não deixarei de pensar em você por um segundo sequer, senhorita Genevieve.
Ela assentiu com um sorriso.
- Lembre se da promessa que você me fez. Não me deixe pensar que perdi você.
Os olhos do Rei brilhavam com a intensidade da superfície cristalina de um lago, quando respondeu em sua voz rouca:
- Nunca. Tenha bons sonhos, ma chérie - sussurrou ele, fazendo Genevieve prendeu a respiração.
Então ele partiu sem olhar para trás.
O Rei nunca havia lhe chamado de ma chérie antes, e apenas essas duas palavras já lhe indicavam um novo sucesso, uma nova conquista, um pequeno novo passo ao que ela mais desejava, o amor e confiança do Rei.
Não implorava que ele fizesse amor com a Rainha naquela noite.
A Rainha jamais lhe daria o amor, a compreensão e o prazer o suficiente. A Rainha jamais seria Genevieve.
Mas Genevieve seria a Rainha.

Anjos de Sangue: OrigensWhere stories live. Discover now